BOLSA DE VALORES

Após arcabouço, Ibovespa firma leve alta de 0,14%,

Dólar fechou sessão a R$ 4,9759, em alta de 0,78%
Por Estadão Conteúdo 19/04/2023 - 04:30
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Divulgação
Dólar e Real, relação de altos e baixos
Dólar e Real, relação de altos e baixos

O Ibovespa operou em torno da linha dos 106 mil pontos ao longo da tarde, à espera do encaminhamento do texto do arcabouço fiscal, adiado do início para o fim da tarde, com algumas trocas de horário no meio do caminho, o que contribuiu para cautela dos investidores na B3 em dia de desempenho misto em Nova York, sem força compradora para ativos de risco.

Por volta das 15h40, o Ministério da Fazenda comunicou que divulgaria o texto do arcabouço antes do horário final que havia sido indicado (16h30), e o conhecimento do teor da proposta acabou firmando o índice da B3 em leve alta na reta de chegada da sessão, apesar de piora pontual no câmbio e nos juros futuros

Assim, a referência da B3 encerrou o dia com ganho de 0,14%, aos 106.163,23 pontos, entre mínima de 105.121,74 e máxima de 106 474,75 na sessão, em que saiu de abertura aos 106.022,52 pontos. O giro ficou em R$ 21,1 bilhões. Na semana, o Ibovespa limita perda (-0,11%), mantendo ganho no mês a 4,20% - no ano, cede 3,25%.

Quando a Fazenda iniciou a divulgação do texto, depois das 15h40, o Ibovespa mostrou desempenho distinto do câmbio e dos juros futuros: enquanto o dólar se aproximava dos R$ 5, na máxima da sessão, e os juros futuros também subiam, o índice da B3 zerou as perdas do dia e sustentou leve alta até o fechamento, na ausência de surpresas negativas em relação ao que se conhecia mais cedo.

"O índice operou com volatilidade, sem conseguir firmar direção única ao longo do dia. A volatilidade tinha se acentuado com relatos de que o governo pretendia excluir uma série de itens do limite do teto de gastos na nova regra fiscal, o que não foi bem recebido pelo mercado, especialmente nos ativos mais sensíveis a juros", diz Lucas Martins, especialista em renda variável da Blue3 Investimentos.

Contudo, até o início da tarde, na contramão de Nova York, o Ibovespa, vindo de perdas nas três sessões anteriores, já buscava sustentar a linha dos 106 mil pontos pela sexta sessão consecutiva, marca reconquistada em fechamento, havia uma semana, pela primeira vez desde 8 de março. Mais cedo, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, disse que o governo espera tramitação rápida do arcabouço, e confirmou que a capitalização de bancos públicos ficará dentro do limite de gastos, conforme havia sido apurado pelo Estadão/Broadcast.

"Uma surpresa positiva para o mercado, no novo arcabouço, foi a exclusão dos dividendos na contabilização das receitas do governo. O dividendo acaba sendo um fator que, de um ano para outro, pode ser mais esporádico, menos recorrente. No ano passado, por exemplo, teve uma distribuição muito forte de dividendos da Petrobras que ajudou, e muito, o resultado fiscal do governo em termos de receita", diz Paulo Luives, especialista da Valor Investimentos, acrescentando que este dispositivo torna a regra menos suscetível a itens não recorrentes, que atrapalham o planejamento do governo quanto a gastos e receitas.

A S&P Global Ratings monitora os desdobramentos da proposta de uma nova regra fiscal no Brasil, mas não vê fácil aprovação no Congresso. O resultado final da futura âncora de gastos será determinante para o rating brasileiro, mas, por ora, gera mais questionamentos do que respostas, de acordo com o diretor sênior de ratings soberanos da S&P Global Ratings para a América Latina, Sebastian Briozzo, reporta Aline Bronzati, correspondente do Broadcast em Nova York.

Na B3, em dia negativo para as ações de grandes bancos à exceção de BB (ON +0,18%), com perdas entre 0,08% (Itaú PN) e 1,49% (Unit do Santander), o avanço de Petrobras (ON +2,57%, PN +2,55%) e de Vale (ON +0,86%) contribuiu para dar suporte ao Ibovespa, ambas favorecidas por dados positivos sobre a demanda chinesa. O PIB do primeiro trimestre veio acima do esperado, a 4,5% em base anual, com forte desempenho das vendas do varejo em março, o que compensou a decepção quanto à produção industrial chinesa, que avançou menos do que se antecipava para o mês.

Por outro lado, avalia o ING, o crescimento do PIB da China acima das projeções sugere não haver necessidade imediata de "estímulos maciços" à economia ou de estímulos fiscais para consumidores - em momento no qual os investidores globais vinham tomando nota da redução de juros e do corte de depósitos compulsórios definidos pela autoridade monetária do país.

De qualquer forma, refletindo a leitura positiva sobre os dados chineses do dia, tanto o minério de ferro como o petróleo encerraram as respectivas sessões em alta, dando apoio ao avanço das ações de commodities na B3. Assim, o índice de materiais básicos, exposto à demanda externa, fechou em alta de 0,68%, enquanto o índice de consumo, com exposição ao ciclo doméstico, cedeu 1,12% na sessão.

Na ponta ganhadora do Ibovespa, além das ações de Petrobras e de Eletrobras (ON +2,38%), destaque também para Rede D'Or (+3,50%), Petz (+3,18%) e Cielo (+2,74%). No lado oposto, CVC (-7,55%), Hapvida (-5,51%), Dexco (-4,43%) e Locaweb (-4,43%).

"Os dados chineses, que se refletiram positivamente no desempenho das ações de Petrobras e Vale, foram o contraponto à expectativa para o arcabouço. O adiamento do anúncio acabou segurando o Ibovespa, na medida em que, até que se conhecesse o texto, sempre pode aparecer algum ruído sobre eventual mudança de última hora", diz Gustavo Harada, chefe da mesa de renda variável da Blackbird Investimentos.

Dólar


O mercado doméstico de câmbio trabalhou na defensiva ao longo da sessão desta terça-feira, 18, em meio à cautela dos investidores diante de rumores em torno do tamanho de brechas para mais gastos na proposta de novo arcabouço fiscal. Sucessivos adiamentos na divulgação do texto durante o dia provocavam apreensão nas mesas de operação, impedindo que o real acompanhasse o sinal predominante de baixa na moeda americana lá fora.

Afora um recuo pontual nos primeiros negócios, quando registrou mínima a R$ 4,9130, sob impacto do resultado acima do esperado do PIB chinês no primeiro trimestre, a moeda operou com sinal positivo durante o restante da sessão. A máxima, a R$ 4,9970, veio logo após o ministério da Fazenda divulgar o texto com as novas regras fiscais, por volta das 15h40.

A onda compradora, contudo, arrefeceu em seguida, quando se observou que o documento não trouxe surpresas negativas além das já especuladas na imprensa pela manhã. Assim, a divisa fechou cotada a R$ 4,9759, em alta de 0,78%. Principal termômetro do apetite por negócios, o dólar futuro para maio teve giro forte, superior a US$ 15 bilhões.

Operadores observam que, dada a forte rodada de apreciação do real iniciada em fins de março e acentuada na semana passada, havia espaço para ajustes e recomposição parcial de posições defensivas. Em abril, a moeda ainda perde 1,83%, o que leva a desvalorização no ano a 5,76%.

Lá fora, o dólar perdeu força em relação a moedas fortes, como euro e iene, e à maioria das divisas emergentes e de países exportadores de commodities. As raras exceções foram o peso mexicano, o real e, sobretudo, o peso colombiano, que amargou baixa superior a 1%.

"O movimento de hoje do dólar é bem localizado. O mercado estava com receio de o governo tirar limitadores de gastos do arcabouço fiscal, o que aumentaria a necessidade de incremento de impostos lá na frente", afirma o head de câmbio da EQI Investimentos, Alexandre Viotto.

Como especulado pela manhã, ficaram de fora do limite de despesas transferências constitucionais, créditos extraordinários, piso de enfermagem, universidades públicas federais e as chamadas estatais não financeiras. Quer dizer, eventuais capitalização de bancos públicos obedecem a limites do novo arcabouço - o que diminui os riscos de expansão parafiscal. Segundo o texto, pelo lado da receita, será considerada a receita primária total menos concessões, dividendos, royalties e transferências legais.

Embora ressalte que o novo arcabouço "não é a regra dos sonhos", o estrategista da RB Investimentos, Gustavo Cruz, afirma que o documento mostra, sim, uma preocupação do governo com o equilíbrio fiscal, ao estabelecer limite aos gastos e não buscar o ajuste apenas via aumento de receitas. "É interessante que os dividendos e as concessões não vão ser considerados para o governo gastar mais. Temos até que ver se isso não vai ser modificado no Congresso", afirma Cruz

Viotto, da EQI Investimentos, alerta que tramitação do texto no Congresso pode provocar novas marolas na taxa de câmbio - que, em sua visão, não deve se manter por muito tempo abaixo da linha de R$ 5,00. Para o especialista, a onda recente de apreciação do real se deve a três fatores: alta dos preços das commodities, boa receptividade ao esboço inicial do arcabouço fiscal, que veio melhor do que o imaginado, e o apetite por operações de "carry trade", que exploram diferencial de juros interno e externo.

Para Viotto, o movimento de alta das commodities não tende a perdurar. Além disso, o dólar não deve se enfraquecer mais no exterior, uma vez que o Federal Reserve dificilmente reduzirá os juros ao longo do segundos semestre na magnitude esperada pelo mercado. "Já os juros devem cair aqui, diminuindo o diferencial de taxas, o que pode afetar o real", diz Viotto, para quem há riscos de modificações da proposta original do arcabouço no Congresso.

Juros


Os juros futuros fecharam a terça-feira em forte alta. Os diversos adiamentos na entrega do arcabouço fiscal ao Congresso ao longo do dia testaram a paciência do investidor, fomentando ruídos sobre mudanças de última hora que resultariam em uma proposta mais frouxa, e que acabaram se confirmando no texto divulgado pelo Ministério da Fazenda no meio da tarde. As taxas abriram em baixa, passaram à estabilidade ainda pela manhã e se firmaram em alta do começo da tarde até o fechamento, na medida em que o governo foi empurrando o envio do texto para o fim da tarde. Pesou ainda para a abertura da curva a determinação do presidente Lula de voltar atrás na taxação de compras de itens importados entre pessoas físicas até o limite de US$ 50.

A taxa do contrato de Depósito Interfinanceiro (DI) para janeiro de 2024 fechou a 13,25%, de 13,21% ontem no ajuste, e a do DI para janeiro de 2025 subiu de 11,89% para 12,01%. O DI para janeiro de 2027 encerrou com taxa de 11,91%, de 11,73%, e a do DI para janeiro de 2029 terminou em 12,25%, de 12,05%.

A expectativa de que finalmente o texto seria entregue hoje ao Legislativo favoreceu um recuo das taxas no começo da sessão, somado à repercussão inicialmente positiva aos dados da China que saíram ontem à noite. Ainda assim, num segundo momento, alguns analistas ponderaram que enquanto o PIB do primeiro trimestre surpreendeu, os dados da indústria em março ficaram abaixo do esperado, configurando uma percepção de crescimento pouco confiável.

Sobre o arcabouço, a expectativa inicial era de entrega ainda pela manhã, por volta das 11h30, mas que foi sendo ajustada durante a sessão, com o governo postergando primeiramente para as 12h30, depois para 16h30, 15h e na sequência, novamente para as 16h30.

Em meio aos sucessivos adiamentos, os profissionais citavam matéria apurada pela Folha de S.Paulo segundo a qual o governo listou mais de dez itens que ficariam de fora do novo limite de gastos, incluindo repasses a empresas estatais, excluindo Caixa, BNDES e instituições dependentes do Tesouro. O texto da Fazenda confirmou posteriormente a lista.

Pelo lado da receita, será considerada na regra a receita primária total do Governo Central, deduzida de concessões e permissões; dividendos e participações; de valores relativos à exploração de recursos naturais; e de transferências legais e constitucionais por repartição de receitas primárias.

Para a economista-chefe da B.Side Investimentos, Helena Veronese, não houve novidades em relação ao cenário ao qual o mercado vinha trabalhando desde manhã. "O que não fica na regra já não entrava na contabilidade do teto dos gastos mesmo, mas confirmou as exceções. Vamos ver como vai passar no Congresso", afirmou. "Por ora, encerra um pouco esse burburinho de o que o governo vai mudar", complementou.

Embora não seja exatamente novidade, não deixou de trazer desconforto na proposta a ausência de sanções para o descumprimento das metas de primário, que não vai configurar infração à lei. Na prática, a proposta afasta um eventual risco de impeachment por crime de responsabilidade. Em caso de descumprimento, o presidente da República enviará uma mensagem ao Congresso com as razões e medidas de correção.

O economista-chefe da Oriz Partners, Marcos de Marchi, considerou o arcabouço frágil se o objetivo for mesmo estabilizar a dívida pública no longo prazo. Ao comentar o projeto, chama a atenção para a falta de "enforcement" no documento, ou seja, um dispositivo que force a sua execução. "Não temos uma regra fiscal, temos uma regra de gasto. Pensando num período mais dilatado de tempo, a proposta da regra é fraca para garantir a estabilização da dívida pública", escreveu.

Num texto considerado excessivamente dependente de arrecadação para cumprir os objetivos de melhorar as contas públicas, a decisão do governo de retroceder na cobrança de imposto a importados entre pessoas físicas até US$ 50 não pegou bem. "Além da questão da imagem, o governo está abrindo mão de R$ 8 bilhões em receitas. É muita coisa", observa Veronese.

(com Eduardo Laguna)

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