Conteúdo do impresso Edição 1277

CNMP

Procurador da República é denunciado por interferir em investigação

Gino Sérvio teria ‘blindado’ esposa do primo, dona de instituto favorecido por prefeitura
Por JOSÉ FERNANDO MARTINS 03/08/2024 - 06:00

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MPF
Gino Sérvio foi denunciado em representação junto ao Conselho Nacional do MP
Gino Sérvio foi denunciado em representação junto ao Conselho Nacional do MP

O empresário Luciano Inojosa protocolou uma denúncia na Corregedoria do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) contra o procurador da República em Alagoas, Gino Sérvio Malta Lôbo, solicitando, inclusive, o afastamento dele do MPF. A ação de Inojosa foi motivada por um dossiê elaborado pelo vereador de Penedo, Alcides de Andrade Neto, conhecido como Cidoca, que apontou possíveis infrações criminais e administrativas na contratação do Instituto de Gestão de Políticas Públicas Sociais (IGPS) pela Prefeitura de Penedo, envolvendo a quantia de R$ 36.691.851,36 em recursos públicos.

Todo o material coletado por Cidoca e encaminhado ao Ministério Público Federal (MPF) em outubro do ano passado detalha supostas irregularidades na contratação do IGPS, que teria sido favorecido em um chamamento público considerado fraudulento. Segundo o empresário, as provas apresentadas pelo vereador são robustas e incluem fraudes que resultaram na celebração da parceria entre o Município de Penedo e o instituto.

As irregularidades denunciadas teriam implicações graves no uso de recursos públicos federais destinados à saúde, assistência social e educação. No entanto, apesar da gravidade das acusações, Gino Sérvio Malta Lôbo, ao dar seguimento ao caso após meses de inércia, declinou da competência do MPF e encaminhou a denúncia ao Ministério Público Estadual (MPAL). O procurador alegou que as verbas envolvidas eram de origem estadual, apesar de reconhecer ilegalidades no processo.

Inojosa, entretanto, contesta essa decisão, argumentando que os recursos em questão incluem dinheiro do Sistema Único de Saúde (SUS), do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb) e do Fundo Nacional de Assistência Social (FNAS), todos de natureza federal. A suspeição do procurador também é levantada pelo denunciante, que aponta um possível conflito de interesse, já que Gino Sérvio Malta Lôbo é primo do vereador de Maceió, Samyr Malta, marido da suposta dona do IGPS, Aucilene Maria.

Embora nos documentos oficiais do instituto conste José Lamartine Viana de Mesquita Junior como diretor-presidente, Aucilene Maria seria publicamente reconhecida como fundadora e proprietária do IGPS, tendo até participado de reportagens sobre os projetos sociais da organização, que atua em diversos municípios, incluindo Penedo, Boca da Mata e Piranhas. Na representação junto ao CNMP, Inojosa anexou, inclusive, prints de extratos de convênios firmados pelo IGPS com as prefeituras de Boca da Mata e Piranhas, onde Aucilene Maria assina como representante do instituto.

Diante dessas suspeitas, Inojosa solicita ao Conselho Nacional do Ministério Público que investigue o procurador, que ele seja afastado cautelarmente para evitar influência nas investigações, e que seja instaurado um processo administrativo para apuração de possíveis infrações disciplinares.

Contratação de um ano no valor de R$ 36 milhões

Segundo a denúncia do vereador Cidoca, a contratação, no valor de R$ 36.691.851,36 para apenas um ano de vigência, envolve supostas ilicitudes que resultaram no emprego inadequado de milhões de reais de recursos públicos federais. O parlamentar observa que o processo de Chamada Pública nº 01/2022, por meio do qual foi firmado o Termo de Colaboração entre o Município de Penedo e o IGPS, esconderia um plano de terceirização de mão de obra, afetando até mesmo cargos públicos que não poderiam ser terceirizados, apenas preenchidos mediante concurso público.

De acordo com Cidoca, a contratação do IGPS não teve prévia e adequada indicação de dotação orçamentária, configurando grave ofensa à legislação. Ele aponta a falta de clareza na resposta do setor contábil, sem detalhar os demais componentes necessários para esclarecer a previsão orçamentária.

A denúncia enfatiza ainda que, após a finalização do chamamento público, houve tentativas de registrar dotações orçamentárias para corrigir o equívoco, evidenciando possíveis fraudes no procedimento. Além disso, destaca a confissão de ilicitude por parte do prefeito ao enviar um projeto de lei para criar créditos especiais no orçamento em março de 2022, para dar suporte ao contrato com o IGPS.

As denúncias do vereador foram publicadas pelo EXTRA em fevereiro deste ano. Sobre elas, a Prefeitura de Penedo se defendeu afirmando “seu compromisso com a legalidade e a transparência em todas as suas ações”. “A contratação do IGPS segue rigorosamente a legislação vigente, incluindo a observância do marco regulatório mencionado, e visa unicamente o interesse público”, destacou na ocasião.

O caso voltou a ser analisado pelo MPF depois que Inojosa recorreu da decisão de Gino Sérvio de declínio de atribuições, estando à espera de parecer da 5ª Câmara de Coordenação e Revisão (Combate à Corrupção) da Procuradoria da República.

OUTRO LADO

O EXTRA manteve contato com o IGPS, que se posicionou por meio de nota de esclarecimento ao semanário, enquanto o Ministério Público Federal emitiu nota em defesa do procurador Gino Sérvio, sem contudo citar seu nome.

Confira as notas na íntegra 

MPF
A Assessoria de Comunicação Social do MPF esclarece que o declínio de atribuição é um mecanismo jurídico próprio para evitar que haja invalidade da prova produzida na fase extrajudicial (pré-processual). Tal declínio passa pela respectiva Câmara de Coordenação e Revisão do MPF, que concordou com a inexistência de elementos que justifiquem a atribuição federal do Ministério Público, homologando o envio da notícia de fato para o Ministério Público Estadual.
Ademais, não prosperam alegações de que tal mecanismo tenha sido usado em benefício de qualquer pessoa. Primeiro, porque o procurador natural nem sequer tem conhecimento de quem seja a pessoa imputada; segundo, porque a lógica das pessoas más intencionadas é no sentido de manter sob sua condução aquilo que pode beneficiar ou prejudicar alguém.
Os mesmos fatos foram objeto de outra notícia de fato, que também foi declinada para o MP estadual por outro procurador da República. Restando claro que não são relações pessoais que determinam a atribuição federal ou estadual, mas os elementos apresentados na representação.
Nota de esclarecimento do IGPS
O Instituto de Gestão de Políticas Públicas Sociais (IGPS) vem prestar seus esclarecimentos ao veículo de comunicação Extra referente à denúncia de supostas irregularidades em sua contratação firmada com o município de Penedo, em Alagoas. É manifestamente improcedente e sem fundamentação alguma a denúncia que chega ao conhecimento deste Instituto, que afirma que um vereador do município de Penedo estaria questionando a legalidade da contratação do IGPS por aquele município no valor de R$ 36.691.851,36 para apenas um ano de vigência do contrato.
Segundo o Extra, o parlamentar estaria alegando que a Chamada Pública nº 01/2022, por meio da qual foi firmado o Termo de Colaboração entre o município de Penedo e o IGPS, esconderia um plano de terceirização de mão de obra, afetando até mesmo cargos públicos que não poderiam ser terceirizados. A denúncia é totalmente descabida e sem amparo na legislação de regência, causando espanto até mesmo pelo lapso temporal decorrido desde o início da contratação e a aproximação do período de eleições municipais em todo o país. Inexiste qualquer suposto plano de terceirização de mão de obra.
Todas as contratações públicas firmadas pelo IGPS atendem aos preceitos legais e procedimentais previstos na legislação de regência, tendo sido realizadas por meio de Chamamento Público, conforme o art. 23 e seguintes, e o art. 42, todos da Lei nº 13.019/2001. O Instituto sempre pautou sua atuação no estrito cumprimento não apenas da legislação, mas também às orientações e recomendações dos órgãos de controle, como o Ministério Público do Estado de Alagoas (Recomendação nº 01/2022) e o Tribunal de Contas do Estado de Alagoas (Recomendação nº 12/2022), as quais são rigorosamente atendidas.
A Constituição Federal, em seu art. 199, § 1º, prevê a possibilidade de entidades privadas auxiliarem entes públicos na prestação dos serviços, inclusive de saúde e assistência social. O Supremo Tribunal Federal já reconheceu, de maneira pacífica e sem qualquer dissensão, principalmente na ADI 1923/DF, que a contratação desta natureza é legal e plenamente possível e que “os empregados das Organizações Sociais não são servidores públicos, mas sim empregados privados, por isso que sua remuneração não deve ter base em lei (CF, art. 37, X), mas nos contratos de trabalho firmados consensualmente”.
Por identidade de razões, também não se aplica às Organizações Sociais a exigência de concurso público (CF, art. 37, II). A contratação dos seus colaboradores dá-se por meio de seleção pública, de modo a se tentar, ao máximo, fomentar a participação de todos que preencham os requisitos e desejem auxiliar na parceria empreendida, com grandes e profundos reflexos positivos para a população em geral.
Com todas as vênias, deve ser afastada qualquer interpretação que restrinja a plena aplicação da Lei nº 13.019/201 e da parceria levada a efeito. A mesma é legal e atendeu a todas as prescrições determinadas. A mencionada contratação visa atender a uma atividade complementar do município e, sob qualquer ótica ou enfoque, não visa ferir ou macular a exigência de concurso público, disposto no art. 37, II da Constituição Federal.
O IGPS sempre preza pela transparência nas contas públicas, cumprindo também o que consta nos termos de colaboração firmados, apresentando contas de todos os recursos recebidos, ficando, ainda e sempre, à disposição de todos os órgãos de controle e fiscalização para prestar qualquer esclarecimento.
Para além do cumprimento da legislação, o IGPS atua há mais de 20 anos no mercado, pautado na ética, transparência e decência do trato com os recursos públicos, desenvolvendo suas atividades com excelência, tendo forte atuação nas contrapartidas sociais, contribuindo com os órgãos de controle e fiscalização, tendo as suas prestações de contas sempre aprovadas.
O IGPS, nas execuções contratuais firmadas, realiza diversas contrapartidas sociais para os entes públicos, beneficiando a população mais carente e prestando serviço de relevância social.
O fato é que a aproximação do período das eleições municipais tem sido combustível para a disseminação de notícias e denúncias infundadas, algumas veiculando o nome do Instituto, atingindo sua honra e imagem para satisfação de interesses políticos. A divulgação, por quem quer que seja, sem qualquer elemento de prova, de informações irreais atribuindo ao IGPS práticas que não cometeu, atenta contra a legislação e submete seus autores às consequências do rigor da lei.
Sem mais no momento, o Instituto de Gestão de Políticas Públicas Sociais repudia o conteúdo da denúncia veiculada e continua à disposição para esclarecimentos que se fizerem necessários.
Maceió, 01 de agosto de 2024.
Instituto de Gestão de Políticas Públicas Sociais (IGPS)
Assessoria Jurídica

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