CASO MARCOS ANDRÉ
Julgamento de Janadaris Sfredo pode ser transferido para Maceió
MP pede o desaforamento 10 anos após crime ocorrido na Praia do Francês; júri está previsto para dia 7O julgamento de Janadaris Sfredo, a advogada gaúcha acusada pelo Ministério Público Estadual de haver encomendado, em 2014, a morte do advogado alagoano Marcos André de Deus Félix, pode ter o julgamento transferido para Maceió, após o MP solicitar o desaforamento do júri. O pedido foi feito pela promotora Maria Luísa Maia Santos, da 1ª Promotoria de Justiça de Marechal Deodoro, e foi endossado pela defesa da ré, embora por razões diferentes. Por ora, o julgamento está previsto para acontecer no Fórum de Marechal, sob a presidência do juiz Bruno Acioli Araújo, na próxima quinta-feira, 7, mas o andamento do processo pode ser novamente alterado.
O Ministério Público argumenta que a mudança de comarca é necessária para garantir a imparcialidade dos jurados, evitando que sejam influenciados pela comoção e pelas conexões sociais envolvidas no caso. No pedido, o MP afirma que o homicídio de Marcos André, ocorrido na Praia do Francês, em Marechal Deodoro, gerou grande repercussão na comunidade devido à posição da vítima como advogado conhecido na região e ao envolvimento de um casal de advogados como suspeitos. Essa proximidade, segundo a promotoria, cria um ambiente de pressão que pode comprometer um julgamento justo.
Outro fator citado pelo Ministério Público envolve supostas ameaças e intimidações dirigidas a testemunhas-chave, no caso o empresário José Aroldo Casado Gama, que, segundo o MP, mantinha estreita ligação com a vítima e relatou temer por sua segurança, dizendo sentir “pânico” em certas situações, como ao avistar motocicletas e desconhecidos próximos a ele. Essa alegação de medo constante levou o MP a solicitar medidas de proteção para Aroldo, que chegou a pedir “garantia de vida” ao juiz responsável pelo processo, alegando que o clima de coação prejudica seu testemunho.
Testemunho de Traficante e Afastamento de Juiz
O MP também apresentou como justificativa o depoimento de Márcio Fernandes Araújo, outra testemunha essencial no processo. Araújo relatou que, em uma ocasião, Janadaris teria oferecido a posse de uma pousada como pagamento para que ele contratasse alguém para matar José Aroldo. Essa acusação, de acordo com a Promotoria, foi tomada como evidência do clima de intimidação e corrupção em torno do caso, apontando a necessidade de transferir o julgamento para um local onde as testemunhas possam depor sem influências externas.
Márcio Fernandes Araújo, no entanto, carrega um histórico controverso. Visto com frequência em Marechal Deodoro, ele permaneceu foragido da Justiça do Rio de Janeiro, onde era condenado por tráfico de drogas, por mais de 18 anos, o que resultou na prescrição de sua pena. Ele passou a colaborar com as investigações sobre o assassinato de Marcos André, inclusive fornecendo testemunhos que ganharam credibilidade junto ao Ministério Público. Mesmo assim, sua longa fuga e problemas judiciais levantam dúvidas sobre a veracidade de seu depoimento, com a defesa de Janadaris questionando se Araújo teria motivações pessoais para depor contra a ré.
A situação com José Aroldo também gera questionamentos. Em uma audiência de instrução inicial, ele afirmou não ter receio de represálias por seu testemunho. No entanto, após problemas técnicos deixarem os registros dessa audiência inaudíveis, ao ser novamente convocado a depor, ele apresentou uma nova versão, afirmando temer represálias e reforçando a acusação contra Janadaris.
A defesa da advogada gaúcha, que concorda com o desaforamento, mas por motivos diversos dos do MP, sugere que essa mudança de postura pode ter sido influenciada pela pressão midiática e pelo contexto de rivalidade entre as partes.
Segundo o advogado Anderson Taveiros, que integra a defesa da advogada gaúcha, o julgamento em Marechal Deodoro representa um risco para a segurança de Janadaris devido à repercussão do caso na mídia e à imagem negativa criada sobre ela na comunidade local. “Essa exposição pré-julgamento gera um ambiente de hostilidade que pode comprometer a imparcialidade dos jurados”, destaca Taveiros.
Outro ponto levantado pela defesa envolve a influência política e social na Comarca de Marechal Deodoro. Um dos advogados que representou um dos réus, Augusto Granjeiro, é ex-procurador da Prefeitura de Marechal e vereador na cidade. Granjeiro foi preso em flagrante em 2015 pela Polícia Federal por suspeita de extorsão no contexto do caso, acusado de tentativa de “comprar a liberdade” do marido de Janadaris, o também advogado Sérgio Sfredo, que fora igualmente acusado pela Polícia de haver encomendado o crime.
Granjeiro, de acordo com a PF, teria participado junto com o também advogado Júlio Cesar da Silva de Castro – na época responsável pela defesa do casal gaúcho –, de um esquema envolvendo o então juiz de Marechal, Léo Dennisson, que conduzia o processo judicial e estaria cobrando R$ 200 mil para soltar Sérgio.
A operação da PF acabou resultando inicialmente no afastamento do magistrado do caso e posterior abertura de processo contra ele pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que o afastou do exercício da magistratura por sete anos – a partir de 2016 e até agosto de 2023, quando o colegiado o inocentou por falta de provas.
A defesa também destaca que Márcio Fernandes Araújo, além de seu histórico de fuga da justiça por quase duas décadas, é associado a José Aroldo, o que poderia influenciar seu depoimento contra Janadaris. A defesa ressalta que as alegações de Araújo sobre uma suposta oferta de uma pousada como pagamento para eliminar Aroldo são baseadas em rumores e que nunca foram confirmadas por provas materiais.
Desentendimento em 2010
O Ministério Público afirma que o caso envolve uma longa disputa judicial e desentendimentos entre Janadaris e Marcos André que remonta a 2010, quando ele representou os proprietários da Pousada Lua Cheia em uma ação de despejo contra inquilinos do local, à época defendidos pela advogada gaúcha.
Posteriormente, Janadaris e o marido assumiram a administração da Pousada Ecos do Mar, passando a residir próximo à vítima. Testemunhas de acusação afirmam que o advogado se tornou alvo de provocações e perseguições, o que, segundo a promotoria, culminou no assassinato de Marcos André em 14 de março de 2014.
O pedido de mudança de local do julgamento será agora avaliado pelo desembargador Celyrio Adamastor, que deve considerar os argumentos mútuos para definir o próximo passo.
Atiradores Negaram Conhecer Janadaris
Os autores dos disparos deflagrados contra Marcos André, Álvaro Douglas dos Santos e Elivaldo Francisco da Silva, foram condenados em agosto de 2017, estando inclusive no regime semiaberto por remissão da pena. Durante o júri e mesmo após a oferta do MP de redução da pena, ambos negaram terem sido contratados por Janadaris, afirmando que não a conheciam e que haviam sido contratados para dar um susto no advogado alagoano por Juarez Tenório, então namorado de Maria Flávia dos Santos, que trabalhava como camareira na pousada de Janadaris.
Juarez também foi levado a julgamento pelo crime, já que era o motorista do carro em que Álvaro e Elivaldo fugiram após atirarem em Marcos André. Condenado, também obteve o benefício do regime semiaberto.
Pela versão dos atiradores, Maria Flávia era assediada por Marcos André, que teria reclamado do advogado para o namorado, mas ela negou a versão de assédio depois de ter sido incluída pelo MP como principal testemunha de acusação contra Janadaris.