Conteúdo do impresso Edição 1295

INQUÉRITO CIVIL

MPT investiga universidade por lesar direitos trabalhistas dos professores

Unima é acusada de redução salarial, regressão de funções e assédio moral
Por TAMARA ALBUQUERQUE 07/12/2024 - 06:00
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Divulgação
Sede da Unima em Maceío
Sede da Unima em Maceío

O Ministério Público do Trabalho (MPT) em Alagoas abriu inquérito civil para investigar irregularidades denunciadas por docentes do Centro Universitário de Maceió – Unima, que vem estabelecendo, desde 2022, uma série de mudanças consideradas lesivas aos direitos trabalhistas dos professores. Habilitado no processo (nº 001843.2024.19.000/5), aberto em agosto deste ano pela procuradora Virgínia de Araújo Gonçalves Ferreira, o Sindicato dos Professores de Alagoas (Sinpro/AL) afirma que as mudanças implementadas pela universidade culminaram com a redução salarial e erros nos cálculos dos salários, a realização de funções desvinculadas das horas em sala de aula sem nenhuma remuneração, regressão de funções e assédio moral coletivo, entre outras consequências.

As mudanças também transformaram a estrutura física da universidade em ambiente insalubre, especialmente no tocante à climatização e acústica das salas de aula, que os docentes ficaram sem controle, e até na segurança da qualidade da água ofertada a professores e estudantes, já que houve corte na compra de água mineral e copos descartáveis. A Unima é uma instituição de ensino superior que faz parte do Grupo Afya, com sede em Minas Gerais e presente em vários estados brasileiros. Atualmente, a instituição em Maceió conta com mais de 200 professores de ensino superior, além dos professores dos cursos de pós-graduação, do pessoal de apoio acadêmico e técnicos das mais diversas áreas, todos submetidos ao regime da CLT. São mais de dois mil alunos matriculados e apresenta como carro-chefe o curso de medicina, cuja mensalidade chega a custar R$ 9 mil no início da graduação.

Em 2022, a Unima comprou o Centro Universitário Tiradentes (UNIT), instituição pertencente ao Grupo Tiradentes do estado de Sergipe, que estava estabelecido em Maceió desde 2007. A negociação incluiu a estrutura física e seus recursos humanos. Até então, o ambiente de negócio na instituição era sadio e seus efeitos sentidos na qualidade do ensino praticado na Unit.

De acordo com Eduardo Vasconcelos, presidente do Sinpro, a realidade atual na Unima tem provocado o adoecimento dos professores, uma consequência do excesso de trabalho e da insegurança sobre seus vencimentos e permanência do acordo contratual na instituição. Desde 2023, afirmam os denunciantes, a Unima tem promovido desligamentos de pessoal, entre os quais professores. Para compensar, a instituição ampliou a oferta de aula online e promoveu o enxugamento do currículo sem discussões com o corpo docente nem com alunos. Os estudantes também recorreram ao Ministério Público Estadual (MPAL) solicitando intervenção e averiguação em várias irregularidades denunciadas, inclusive que, por falta de professor em determinadas matérias, eles são obrigados a estudar em horários diferentes daqueles definidos na grade do curso.

Procurada pelo EXTRA, a Unima respondeu que não se manifesta acerca de processos judiciais em tramitação.

Redução Salarial

No processo em tramitação no MPT de Alagoas consta a denúncia de que, desde que foi implantada, a Unima vem estabelecendo medidas que provocaram redução no salário dos professores após a implantação do novo plano de cargos e salários apresentado pela instituição 15 dias antes da abertura do semestre letivo. Não houve discussão prévia com a categoria ou mesmo com a entidade sindical que os representa.

“Ressalte-se que mesmo antes da implantação do novo plano de cargos e salários já estava havendo redução salarial, conforme demonstra o requerimento feito por um professor dirigido ao reitor da instituição no mês de abril de 2024, o qual expõe que seu salário em julho de 2021 era de R$ 5.421,45 passando para R$ 2.960,93 em março de 2024, sem que a instituição justificasse”, destaca a denúncia. Neste caso, a instituição esperou três meses para dar uma resposta ao professor, que, por motivos óbvios, tem o nome preservado. A redução salarial foi reconhecida pela Unima, que atribuiu a medida a uma cláusula que prevê expressamente que: “O empregado terá uma jornada de trabalho em número de hora-aula em conformidade com os horários de aulas, podendo ocorrer variação para mais ou para menos de um semestre para o outro, sem que esta variação importe alteração unilateral do contrato e sem que gere direito a qualquer indenização ou incorporação”.

Na avaliação do Sinpro, é evidente que tal cláusula é nula de acordo com o ordenamento trabalhista que vigora no país, “pois visa fraudar direitos trabalhistas, uma vez que a variação de horas-aula para professor pode ocorrer desde que haja uma motivação plausível (como, por exemplo, a redução de turmas), o que não foi o caso. Diante da situação de inconformismo e sem reconhecer o direito à irredutibilidade salarial, a instituição preferiu demitir o professor sem justa causa no fim do primeiro semestre letivo, após quase 10 anos de serviço na instituição.

Em outra cláusula, a Unima obriga os docentes à realização de funções que são desvinculadas das horas em sala de aula e sem remunerá-las devidamente, entre elas a participação em bancas examinadoras, a elaboração de conteúdos pedagógicos e metodológicos do Ensino à Distância, o exercício de funções de direção, definição de conteúdos, metodologia e formas de acompanhamento de estágio supervisionado e sua realização, dedicação à produção de conhecimento e à inovação tecnológica, como publicar a produção científica e registrá-la adequadamente, entre outras descritas no Regimento Interno e no Plano de Carreira do Magistério Superior – PCMS, bem como aquelas que, inerentes ao cargo ocupado, sejam determinadas, verbalmente ou por escrito, pela instituição.

A instituição também é acusada de determinar que o funcionário possa assumir a função de assessoria, coordenação de cursos e coordenação de núcleos, entre outras atividades, concomitantemente às suas atividades de sala de aula, podendo inclusive responder simultaneamente por mais de uma das funções, sendo que o acúmulo de tais atribuições, por se tratar de cargo de confiança da instituição, não gere obrigação de remuneração cumulativa.

“É importante salientar que em meados de 2023 a Unima alterou unilateralmente o contrato de trabalho dos professores que ocupavam cargo de gestão, criando um novo contrato em que a atividade de gestão acadêmica é distinta da atividade docente e em seguida, seis meses depois, rescindiu esse contrato, descumprido a norma que prevê a continuidade do contrato de trabalho, com vistas a se esquivar do pagamento do valor das gratificações devidas e de suas repercussões”, afirma a denúncia feita no MPT.

O processo no MPT de Alagoas está tramitando com a juntada de documentos pela instituição. Porém, o Sinpro vai solicitar uma reunião com a procuradora Virgínia Gonçalves para discutir o andamento do processo, o que deve ser realizado após o recesso de final de ano, no início de fevereiro.


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