Brasileiros que vivem na Alemanha contam como é trabalhar no país

Por Agência Estado 04/07/2024 - 12:54

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No início de junho, a Alemanha lançou um novo sistema de vistos com o objetivo de atrair profissionais qualificados de países de fora da União Europeia (UE). A medida, que visa mitigar a escassez de mão de obra que o país enfrenta, facilita a entrada de estrangeiros desde que atendam aos pré-requisitos estabelecidos. Especialistas em TI e enfermeiros são os profissionais mais demandados. Mas muitos brasileiros já consideravam a Alemanha um destino atraente para viver e trabalhar mesmo antes dessa mudança.

É o caso do engenheiro mecânico Igor Teles, de 28 anos. Em 2015, o cearense participou de um intercâmbio de um ano no país por meio do programa Ciência Sem Fronteiras. Após a experiência, retornou ao Brasil, finalizou a graduação e começou a trabalhar em sua área. Insatisfeito com o rumo da carreira, decidiu cursar mestrado em Munique, na Alemanha, onde reside desde 2018.

Teles é um dos 160 mil brasileiros que vivem atualmente na Alemanha, segundo dados do Ministério das Relações Exteriores. "O que me motivou a voltar para a Alemanha foi a experiência positiva que tive aqui anteriormente, e as oportunidades na minha área. Além disso, o trabalho em Fortaleza (CE) não foi como eu esperava. Esses fatores me incentivaram a tentar e deu certo", diz Teles.

Teles trabalha desde 2021 em uma empresa que presta consultoria e desenvolve planejamento técnico para prédios industriais e comerciais. O departamento em que atua é responsável pelo fornecimento de energia e descarbonização de indústrias.

O esquema de férias é um ponto positivo, revela o engenheiro. O período é de 30 dias úteis a cada ano e pode ser dividido em vários períodos. "Eu já dividi minhas férias em seis vezes, acabei emendando com alguns feriados", diz. Aqui, a Consolidação de Leis Trabalhistas (CLT) dá direito a 30 dias corridos de féria.

Em relação à carga horária, a Alemanha está entre os três países com as menores jornadas de trabalho no mundo - são 34,4 horas semanais, atrás apenas da Dinamarca e da Holanda. Segundo a OCDE, somente 4% dos trabalhadores cumprem períodos muito mais longos. Igor Telestem jornada de 40 horas semanais.

Segundo ele, empresas maiores têm participação de sindicatos fortes nas negociações de acordos coletivos, o que ajuda nos direitos em geral e nos aumentos de salários. E há a flexibilidade. "No meu caso específico, preciso viajar bastante a trabalho. Mas, no geral, os empregos aqui são bem flexíveis quanto ao home office", diz Teles, observando que a empresa em que atua não cobra horários fixos. Em dias mais ensolarados, por exemplo, ele e outros colegas de trabalho costumam sair mais cedo para aproveitar o clima.

Carreira e salário

Teles considera ainda que a sensação de segurança, a qualidade de vida, a infraestrutura das cidades e o poder de compra são aspectos favoráveis. Mas ele faz um alerta a profissionais sem qualificação. Estes devem avaliar com cuidado a ideia de mudar para a Alemanha, já que o custo de vida é alto. "Brasileiros que imigram sem tantas qualificações talvez não tenham uma vida tão confortável. Sugiro pensar melhor se vale a pena."

O salário mínimo na Alemanha é calculado com base no número de horas trabalhadas. A remuneração mínima por hora é de € 12,41 (R$ 73,12). Para um emprego de 40 horas semanais, o salário bruto mensal gira em torno de € 1.985,60 (R$ 11.699).

Foi exatamente o quesito financeiro que chamou atenção da gestora de redes sociais Débora França, 30. Ela mora na Alemanha desde 2020 depois de uma temporada de sete anos em Portugal. A mudança foi influenciada pelo marido, que é alemão. Logo que chegou, em plena pandemia, dedicou-se a aprender o idioma local. No segundo ano, fez trabalho voluntário em uma creche, depois, trabalhou num restaurante, onde recebia € 13 por hora, e só este ano decidiu atuar na área de social media. Desde abril, ela trabalha em uma startup do setor de saúde. Ela não quis revelar o salário.

Assim como o engenheiro Igor Teles, Débora também avalia que a cultura de trabalho valoriza o equilíbrio entre vida pessoal e profissional. "Se o seu horário de saída é até 17h, você vai embora e ninguém vai questionar ou pensar que é preguiçosa."

Em busca de melhores oportunidades na carreira, a farmacêutica Dulce Coelho, de 30 anos, também decidiu mudar-se para a Alemanha em 2022. Depois de estudar alemão, ela conta que teve que aprender do zero como montar um currículo, já que o processo seletivo é um pouco diferente do Brasil. Para todas as vagas a que se candidatou teve de enviar uma carta explicando as razões para querer trabalhar na companhia. É um documento exigido pela maioria das empresas alemãs, diz.

Custo de vida

Há pouco mais de dois meses Dulce ingressou na área de pesquisa e desenvolvimento de suplementos alimentares de uma empresa farmacêutica. Porém, mesmo com mestrado, ocupa um cargo de estagiária. "Na Alemanha, é muito difícil entrar na indústria farmacêutica sem experiência."

Tomando como referência que mora na cidade de São Paulo e ganhe R$ 15 mil por mês, para manter o mesmo padrão de vida em Berlim seria necessário ganhar cerca de R$ 29 mil (€ 5.023,7), conforme o site Numbeo, especializado em custo de vida. O custo de vida em Berlim, incluindo aluguel, é 95,8% maior do que na capital paulista.

Os brasileiros reclamam ainda do sistema de saúde. No Brasil, o engenheiro Igor Teles tinha o hábito de realizar exames de rotina, o que não é simples por lá. "Como a população é muito velha e há poucos médicos, eles reservam serviços de rotina para os idosos. Então, se você (jovem) for ao hospital com o intuito de fazer um exame de rotina, o médico vai rir da sua cara".


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