VIOLÊNCIA contra a mulher
"Se perpetua a ideia que a mulher negra aguenta pancada", diz secretária
Maria José da Silva destaca que a Semudh incentiva, ao longo do ano, vítimas a buscarem ajudaO Ligue 180, dispositivo central na estratégia de enfrentamento da violência contra a mulher no país, já recebeu, até o mês de julho, 84,3 mil denúncias, volume que equivale a um aumento de 33,5% em relação ao mesmo período em 2023. De Alagoas, em 2024, a Central registrou 1.036 denúncias — um aumento de 29,99% em relação ao mesmo período do ano passado.
Entre as denúncias realizadas, 663 foram apresentadas pela própria vítima, enquanto em 370 o denunciante foi uma terceira pessoa. A casa da vítima ainda é o cenário onde mais situações de violência são registradas. No estado alagoano, 493 denúncias tiveram este contexto. Para a secretária de Estado da Mulher e dos Direitos Humanos (Semudh), Maria José da Silva, o aumento nas denúncias se deve aos programas que visam proteger as vítimas.
"A Semudh conta com campanhas permanentes como “Deixe Ela Quieta”, “Agosto Lilás” e “21 dias de ativismo”, o programa “Maria da Penha – Por Todas Elas” e a constante capacitação para rede estadual de enfrentamento, um trabalho voltado para diversos públicos em centros educacionais, instituições públicas e privadas, na capital e interior", destacou.
Confira entrevista
O aumento de 29,99% nas denúncias de violência contra a mulher em Alagoas, comparado ao mesmo período do ano passado, pode ser atribuído a algum fator específico? Há iniciativas recentes que possam ter influenciado esse crescimento?
MJ - É importante destacar que o serviço do 180 foi reestruturado no último ano, pois houve um período de desmonte durante a gestão anterior do governo federal. Recentemente, o Ministério das Mulheres inaugurou uma nova central, ampliando o número de atendentes e facilitando o acesso. O 180 é um importante instrumento, pois ampara a mulher que ainda não se sente segura para fazer uma denúncia pessoalmente. Estamos no Agosto Lilás, onde enfatizamos o enfrentamento à violência contra mulher, mas durante todo o ano realizamos ações visando incentivar essas mulheres a procurar ajuda, divulgando onde podem conseguir apoio.
Com 663 denúncias realizadas pela própria vítima e 370 por terceiros, qual é a estratégia da Secretaria para incentivar as vítimas a denunciarem diretamente?
MJ - A Semudh conta com campanhas permanentes como “Deixe Ela Quieta!”, “Agosto Lilás” e “21 dias de Ativismo”, o programa “Maria da Penha – Por Todas Elas” e a constante capacitação para rede estadual de enfrentamento, um trabalho voltado para diversos públicos em centros educacionais, instituições públicas e privadas, na capital e interior. Conseguimos levar informações e esclarecimentos acerca das violências e das atribuições da Lei Maria da Penha, mas, infelizmente, parte das mulheres ainda não denunciam pois estão num contexto de dependência financeira, dependência emocional, falta de apoio, inclusive ameaça de morte, e demoram a perceber que estão em situação de violência. É importante que toda a sociedade esteja atenta, denuncie e ajude a salvar vidas.
Quais são as principais estratégias e programas implementados pela Secretaria da Mulher para enfrentar a violência contra a mulher e apoiar as vítimas? Os dados mostram que os agressores são, em sua maioria, esposos ou companheiros das vítimas. Quais medidas estão sendo tomadas para lidar com a violência doméstica e proteger as vítimas de abusos por parceiros íntimos?
MJ - Além das campanhas e programas já citados, está vinculado a Semudh um equipamento estratégico no apoio as vítimas de violência: o Centro Especializado de Atendimento à Mulher em Situação de Violência – CEAM. Ele oferece serviços de acompanhamento psicológico, jurídico e social. Em novembro, será inaugurado o Complexo de Proteção à Mulher, que também contará com abrigamento temporário. Também por meio de articulação da Secretaria, Alagoas em breve terá três Casas da Mulher Brasileira. Todos esses equipamentos contribuem para a proteção, apoio e enfretamento à violência.
Com base nos dados que mostram que o maior número de denúncias envolve mulheres entre 25 e 29 anos e que a maioria das vítimas é negra, como a Secretaria está abordando as necessidades específicas desse grupo etário e racial?
MJ - O racismo estrutural é um problema sistêmico. Há alguns anos, pesquisadoras da área destacam que os estereótipos construídos ao longo do tempo influenciam a “autorização” de violências contra as mulheres negras, pois ainda se perpetua a ideia que a mulher negra é forte e aguenta “pancada”. A Semudh conta com as Superintendências de Políticas para a Mulher, Políticas para a Igualdade Racial e de Direitos Humanos atuamos com os eixos de educação e sensibilização com o Programa “Maria da Penha - Por Todas Elas” que aborda o sexismo, o racismo, e a violência de gênero nas escolas e comunidades, sendo parte fundamental para prevenir a violência contra mulheres negras jovens. Além disso, a secretaria articula para que as ações afirmativas e políticas de saúde pública no Estado levem em consideração as especificidades da saúde das mulheres negras, especialmente em relação à saúde mental. Por isso vem atuando junto a Secretaria de Estado de Saúde (Sesau) no programa Mate Masie, que objetiva levar ações de saúde mental para os quilombos alagoanos. A Semudh também realiza um trabalho de resgate e afirmação da identidade quilombola com jovens, trabalhando temáticas variadas como racismo, território e violência de gênero. E acolhemos, fazendo oitiva e dando os devidos encaminhamentos em casos de racismo.