Conteúdo do impresso Edição 1277

MÁ-FÉ

Homem troca de nome para se livrar de processos criminais

Caso é investigado pelo MP e expõe falhas na emissão de certidões públicas
Por TAMARA ALBUQUERQUE 03/08/2024 - 06:00
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Assessoria
Prédio Sede do MP de Alagoas
Prédio Sede do MP de Alagoas

A alteração de nome, prevista pela Lei nº 14.382/2022, gerou em Alagoas um caso intrigante envolvendo uma pessoa residente no interior e revelou fragilidades nas emissões de certidões negativas pelos órgãos públicos. O caso teve início em maio deste ano, quando o promotor de Justiça da Comarca de Viçosa, Adriano Jorge Correia de Barros Lima, solicitou ao Ministério Público do Estado de Alagoas (MPAL) a abertura de um procedimento ou ação civil para investigar e anular a alteração do nome concedida ao cidadão Jesus Gomes de Vasconcelos, em substituição ao nome Joselito Gomes de Vasconcelos.

Joselito Gomes responde a processos na justiça estadual por estelionato, que tramita na 4ª Vara da capital (nº 8000143-47.2022.8.02.001), e a um processo-crime em trâmite na Justiça Federal (nº 08/0079-16.2022.4.05.8000) por crime contra a administração pública. Além desses, há uma vasta ficha criminal de Joselito, incluindo crimes contra vulneráveis, violência doméstica e medida protetiva com base na Lei Maria da Penha, entre outros, conforme anexado pelo promotor no processo.

Na avaliação do promotor, diante desses processos, há motivos para suspeitar que Jesus Gomes tenha se utilizado da "permissividade abrangente da lei para, ao mudar de nome, se livrar da pecha de réu nos vários processos criminais que respondeu e nos que responde atualmente".

O caso foi comunicado à Corregedoria Geral de Justiça, já que a mudança de nome se deu em uma serventia extrajudicial da capital, o 6º Ofício de Registro Civil das Pessoas Naturais de Maceió. Este cartório chegou a ser criticado pelo MP, que alegou que uma simples pesquisa ao Sistema SAJ do Tribunal de Justiça de Alagoas teria resultado na negativa ao pedido administrativo de mudança de nome, dado o possível indício de má-fé quanto à real intenção do requerente.

A cobrança de esclarecimentos feita pelo MPAL foi então remetida ao cartório, cuja tabeliã, Maria Rosinete Rodrigues Remígio de Oliveira, comprovou, em julho deste ano, que todos os procedimentos prévios relativos à alteração de nome foram adotados para identificar possíveis processos criminais em nome de Joselito Gomes. No entanto, as certidões emitidas pelos órgãos foram “negativas”, sem identificação de qualquer processo crime. Rosinete Remígio anexou à resposta à Corregedoria as certidões negativas requeridas ao Tribunal de Justiça de Alagoas, Tribunal Regional Federal da 5ª Região, certidão estadual civil, certidão estadual de execução fiscal, certidão judicial cível, certidão judicial criminal negativa e até certidão do Tribunal Regional Eleitoral de Alagoas, entre outros documentos.

Com isso, a tabeliã do cartório confirmou ter seguido todos os ditames legais e que não houve qualquer transgressão administrativa, razão pela qual solicitou o arquivamento do processo em relação à serventia.

A documentação do cartório do 6º Ofício de Registro Civil foi encaminhada pelo juiz auxiliar da Corregedoria Geral da Justiça, Anderson Santos dos Passos, ao Ministério Público para que se manifeste a respeito do processo.

A regra do Direito Notarial e Registral Brasileiro, antes da nova legislação, estabelecia que o nome civil era imutável pela via extrajudicial, podendo ser modificado somente quando do casamento para a inclusão de sobrenomes. Atualmente, com o avanço e modificações legislativas, tornou-se possível a mutabilidade do nome civil de forma extrajudicial, segundo explica Rosinete Remígio no processo. Ela afirma que o divisor de águas foi a Lei nº 14.382/2022, que dispôs sobre a alteração de prenome, inclusão e exclusão de sobrenomes diretamente nos cartórios de todo o país.

A lei reforça o fato de o Conselho Nacional de Justiça ter publicado diversas normativas para regulamentar a matéria de alteração de nome, como o Provimento 149/2023. Um dos artigos do provimento assegura a toda pessoa maior de 18 anos o poder de, pessoalmente e de forma imotivada, requerer diretamente a alteração do seu prenome do registro civil, independentemente de decisão judicial. Também determina que a alteração pode ser parcial, do prenome, permitindo acréscimo, supressão ou inversão do mesmo.


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