MASSA FALIDA DA LAGINHA
Deságio de 60% em dívidas com credores será decidido no dia 12
Falta de quórum adia assembleia geral que deveria ter acontecido quinta-feiraOs credores da Massa Falida da Laginha Agro Industrial S/A, holding que reunia as empresas do antigo império canavieiro do ex-deputado João Lyra, decidirão na próxima quinta-feira, 12, se aceitam propostas de deságio de mais de 60% em dívidas com bancos e com o governo federal. A definição ocorre em um cenário marcado por disputas jurídicas prolongadas e pela recente decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), que manteve a competência do Tribunal de Justiça de Alagoas (TJAL) para julgar os recursos em segunda instância.]
Essa decisão judicial, proferida pelo ministro Kassio Nunes Marques, autorizou a realização da Assembleia Geral de Credores (AGC), marcada em primeira convocação para o dia 5 de dezembro, mas adiada por falta de quórum. Com uma nova tentativa marcada para o dia 12, o encontro incluirá na pauta o plano de venda de ativos e a análise de propostas de deságio, medidas que podem definir o futuro da massa falida.
A pauta da AGC inclui a aprovação do plano de venda de ativos proposto pelo administrador judicial Armando Wallach, além da análise de propostas feitas por diversos credores, entre eles, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) e o Bank of America.
No início da semana, o ministro Kassio Nunes Marques rejeitou em definitivo uma ação movida por Solange Queiroz Ramiro Costa, ex-esposa de João Lyra, falecido em 2021, na qual ela contestava a imparcialidade dos desembargadores do TJAL em julgarem eventuais recursos a decisões dos juízes responsáveis pelo processo falimentar que tramita na 1ª Vara de Coruripe.
A comissão de juízes tem demonstrado empenho na liquidação dos ativos da usina, com apoio da Procuradoria Geral da Fazenda Nacional (PGFN), que sugeriu um desconto de 62% na dívida da Massa Falida com a União, visando acelerar o processo. Esse movimento também deve gerar benefícios financeiros para os procuradores da União, que podem receber honorários de sucumbência que chegam a até R$ 500 milhões.
Porém, nem todos os credores concordam com as condições propostas para a liquidação. O Bradesco, que possui um crédito de R$ 47,6 milhões, contesta a ordem de pagamento sugerida e defende que os valores sejam liquidados conforme as prioridades estabelecidas pela Lei de Falências, o que favoreceria o banco em relação a outros credores, como a União.
DÍVIDA FISCAL PODE FICAR EM R$ 855 MILHÕES
A Fazenda Nacional apresentou uma proposta para regularizar o passivo fiscal da Massa Falida da Laginha. A dívida total do grupo é de aproximadamente R$ 2,3 bilhões, incluindo débitos com o FGTS, Contribuição Social da LC nº 110/2001, entre outros passivos administrativos ainda em processo na Receita Federal. A proposta da União prevê um desconto de até 62,1% sobre o saldo devedor federal, levando em consideração a capacidade de pagamento da massa falida.
A dívida fiscal federal seria reduzida para R$ 855,5 milhões, com a divisão dos créditos tributários a ser feita proporcionalmente entre os entes federados, respeitando a ordem de preferência dos credores, conforme a legislação vigente. Além disso, a proposta inclui a transação de todos os débitos consolidados do grupo, com renúncia de disputas judiciais e administrativas pendentes.
O acordo, que também abrange débitos com a Receita Federal, exige que a massa falida desista ou renuncie a recursos dentro de 30 dias após a assinatura do acordo. O pagamento do saldo remanescente será feito em parcela única utilizando saldos bancários existentes, e a dívida do FGTS, estimada em R$ 175 milhões, será incluída no mesmo acordo, com os mesmos descontos aplicados.
Além disso, o Bank of America, um dos credores, propôs um deságio, visando acelerar o recebimento de créditos por meio da aceitação de descontos no valor dos títulos. A proposta busca uma solução mais célere para os credores, permitindo um deságio proporcional, conforme a situação específica de cada classe de credores, como as dívidas fiscais com os entes federados.
Deságio é um termo utilizado no mercado financeiro que se refere ao desconto aplicado sobre o valor nominal ou de face de um título ou ativo, seja no momento da compra ou venda. Em outras palavras, significa vender ou comprar um ativo por um valor inferior ao seu valor de mercado ou valor nominal. Por exemplo, se um título de dívida tem um valor nominal de R$ 100,00 e está sendo vendido com um deságio de 10%, o preço de venda será R$ 90,00. O deságio reflete uma expectativa de que o valor do ativo ou título será pago com algum desconto, o que pode ocorrer por diferentes razões, como a necessidade de liquidez imediata ou a percepção de risco maior do ativo.
Incra será questionado sobre ocupação de usina
A Usina Laginha, localizada em União dos Palmares e atualmente ocupada por membros de movimentos sociais, apresenta uma série de questões a serem resolvidas antes da alienação de seus ativos. Conforme o relatório da Vivante, Administradora Judicial, em 2015, o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) solicitou autorização para realizar vistorias e avaliações na área, com o intuito de propor a aquisição de terras para a criação de projetos de assentamento agrário. A decisão, proferida nos autos falimentares em 27 de agosto de 2015, autorizou a vistoria dos imóveis vinculados à Usina, abrangendo aproximadamente 11.000 hectares.
Até o momento, os laudos concluídos cobrem apenas 60% da área total, com os 40% restantes ainda carecendo de ajustes técnicos. No entanto, não há informações atualizadas sobre o andamento das vistorias ou o interesse efetivo do Incra na compra das terras. Diante deste cenário, a Vivante sugere que o órgão seja intimado para confirmar seu interesse na aquisição das terras e, caso afirmativo, apresentar o Laudo Agronômico mais recente. Caso o Incra decida não prosseguir, o processo de alienação da Usina Laginha seguirá conforme as diretrizes estabelecidas para os demais ativos.
Uruba, Guaxuma e escritório devem ser colocados à venda
Quanto à alienação dos ativos das usinas Guaxuma (Coruripe) e Uruba (Atalaia) e do Escritório Central (em Jacarecica), a modalidade sugerida pela administração judicial é o “processo competitivo organizado”. Esta escolha se justifica pelo alto valor e especificidade dos ativos, exigindo uma busca ativa por compradores. A modalidade permite também a fixação de uma remuneração inferior a 5% para o Agente Especializado, em contraste com o leilão, conforme decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ).
O processo competitivo seria conduzido em duas etapas: a definição do Agente Especializado e a alienação dos ativos. O uso do “stalking horse”, ou Primeiro Proponente, garantirá um valor mínimo de venda, estimulando o interesse no mercado e assegurando a viabilidade do processo, diz a proposta.
Decisão do STF encerra disputa jurídica
A decisão do ministro Nunes Marques em rejeitar a ação movida por Solange Queiroz, ex-esposa de João Lyra, põe fim, ao menos temporariamente, em uma acirrada disputa jurídica. Ela argumentava que a suspeição declarada pela maioria dos desembargadores do TJAL configurava um cenário que transferiria a competência para julgamentos de recursos no bojo do processo falimentar ao Supremo, conforme previsto no artigo 102, inciso I, alínea “n” da Constituição Federal.
No entanto, o ministro entendeu não haver provas suficientes para confirmar irregularidades ou a necessidade de deslocar o caso ao Supremo, revogando uma liminar anterior que suspendera o andamento de recursos em segunda instância no tribunal alagoano.
Os problemas jurídicos da Laginha começaram em 2008, com um pedido de recuperação judicial que culminou na decretação de sua falência pelo TJAL em 2014. Desde então, o processo tem sido marcado por disputas entre credores, questionamentos sobre a imparcialidade de magistrados e alegações de irregularidades administrativas.
Solange Queiroz, uma das credoras, moveu reclamação no STF alegando que o TJAL teria adotado manobras para evitar o reconhecimento de sua incompetência no caso. Entre as irregularidades apontadas, destacou que o tribunal teria incluído um juiz convocado no cálculo de quórum para aumentar o número de desembargadores aptos a julgar os recursos de 17 para 18, o que seria uma afronta às regras constitucionais.
Além disso, argumentou que, dos 13 desembargadores que inicialmente se declararam impedidos quando os recursos chegaram às suas mãos, cinco voltaram atrás, o que, segundo ela, infringiria a irretratabilidade da declaração de suspeição por foro íntimo.
Em defesa de sua competência, o TJAL realizou ajustes na composição do quórum de julgamento e declarou que 11 dos 17 desembargadores estavam habilitados a atuar no caso, número suficiente para afastar a transferência do processo ao STF.
O ministro Nunes Marques destacou que a atualização realizada pelo tribunal alagoano foi suficiente para dirimir as dúvidas sobre sua competência. Apesar disso, solicitou esclarecimentos adicionais aos desembargadores Domingos de Araújo Lima Neto, Elisabeth Carvalho e Tutmés Airan.
O Ministério Público Federal também recomendou a improcedência da reclamação de Solange, argumentando que a regra constitucional de deslocamento de competência exige comprovação expressa de que a maioria dos membros do tribunal está impedida. Esse requisito, segundo o MPF, não foi cumprido no caso.