DENÚNCIA
MP investiga repasse de R$ 1,3 milhão para ONG em Lagoa da Canoa
Órgão apura irregularidades na Associação Abraçando Vidas
O Ministério Público de Alagoas (MPAL) instaurou um procedimento administrativo com base em uma notícia-crime para apurar possíveis irregularidades no uso de R$ 1.350.000,00 repassados à Associação Abraçando Vidas, entidade com sede em Lagoa da Canoa. O procedimento foi aberto em 20 de janeiro de 2025, conforme o Ofício nº 016/2025 da Promotoria de Justiça de Feira Grande.
O valor foi recebido em 2020, por meio de emenda parlamentar da Assembleia Legislativa de Alagoas, e deveria ser destinado a projetos de saúde, educação, nutrição e geração de renda. No entanto, há indícios de que a ONG não prestou contas de forma adequada e pode estar operando de maneira irregular.
A Prefeitura de Lagoa da Canoa confirmou que a ONG presta serviços de saúde sem as licenças necessárias. Em resposta ao Ministério Público, a Procuradoria-Geral do Município informou que, após consulta aos órgãos responsáveis, constatou que a entidade não possui todas as autorizações exigidas para atuar nessas áreas.
O QUE É A ASSOCIAÇÃO ABRAÇANDO VIDAS ?
Fundada em 2016, a Associação Abraçando Vidas é registrada como uma organização social (OS) voltada para a defesa de direitos sociais e para a realização de ações culturais e artísticas. No entanto, segundo a denúncia, a entidade passou a atuar na prestação de serviços de saúde e educação sem os registros exigidos por lei. A Vigilância Sanitária chegou a notificá-la para suspender essas atividades, e a ONG solicitou, posteriormente, a inclusão oficial dessas áreas em seu registro. Além disso, há indícios de que a organização realizava o descarte inadequado de resíduos odontológicos, incluindo materiais biológicos contaminados e perfurocortantes.
FALTA DE TRANSPARÊNCIA
A Lei de Acesso à Informação (Lei nº 12.527/2011) obriga entidades que recebem recursos públicos a garantir total transparência na gestão dos valores recebidos. No entanto, segundo os denunciantes, a associação não publicou informações obrigatórias, como estatuto social, planos de trabalho e prestações de contas, descumprindo também o Decreto nº 7.724/2012.
A denúncia apontou que a ONG não possui alguns alvarás essenciais, como a licença sanitária e a licença ambiental. Entretanto, há registros de alvará de funcionamento, alvará do Corpo de Bombeiros e um cadastro na Vigilância Sanitária. Além disso, a ONG não respondeu aos pedidos de informações feitos pelo Ministério Público sobre a aplicação dos recursos. A Promotoria certificou que, mesmo após o prazo estipulado, não houve qualquer retorno por parte da entidade.
Um dos indícios da falta de transparência está na ausência de informações no Mapa das Organizações da Sociedade Civil (Mapa OSC), plataforma desenvolvida pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) para reunir e disponibilizar dados sobre entidades que recebem recursos públicos. No caso da Associação Abraçando Vidas, o perfil cadastrado não contém dados básicos, como missão, visão, finalidades estatutárias e o link para o estatuto da organização. O Ministério Público solicitou a apresentação de documentos financeiros da entidade referentes aos anos de 2020 a 2023, além de comprovações de alvarás e licenças. Também requisitou pareceres de promotorias locais para verificar se a ONG possui atestados de regular funcionamento.
A investigação busca esclarecer se houve desvio de finalidade na aplicação dos recursos e se a entidade pode ser responsabilizada por eventuais danos ao erário. Caso as irregularidades sejam confirmadas, os responsáveis poderão responder com base na Lei Anticorrupção (Lei nº 12.846/2013), que prevê sanções para organizações que pratiquem atos ilícitos contra a administração pública.
NÃO FOI O PRIMEIRO REPASSE MILIONÁRIO PARA A ONG
Em 2023, a Associação Abraçando Vidas recebeu R$ 1.000.000,00 da Secretaria de Estado da Saúde de Alagoas (Sesau), por meio de um termo de fomento firmado entre a entidade e o governo estadual. O repasse tinha como objetivo apoiar crianças, jovens, mulheres e famílias em situação de vulnerabilidade social, além de prestar serviços de saúde. A liberação do recurso foi feita em parcela única, e a vigência do termo era de 12 meses, conforme publicado no Diário Oficial do Estado de Alagoas.
A Promotoria também pretende analisar a aplicação desse valor e verificar se houve prestação de contas regular. O EXTRA entrou em contato com a associação por e-mail e telefone. No entanto, até o fechamento desta reportagem, a Associação Abraçando Vidas não havia se manifestado sobre as denúncias.