Conteúdo do impresso Edição 1306

LAGOA DA ANTA

Estado era acionista de hotel, mas papéis sumiram

Acordo firmado há 51 anos também desapropriava área para grupo Lundgren
Por ODILON RIOS 15/03/2025 - 06:00
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Área pública da Lagoa da Anta é um dos pontos atrativos da capital
Área pública da Lagoa da Anta é um dos pontos atrativos da capital

A desapropriação da área pública de 13 mil metros quadrados onde está localizada a Lagoa da Anta e destinada à construção de um hotel nos anos 1970 exigia a participação do governo do Estado como acionista no empreendimento privado, só que os papéis sumiram e a empresa pública responsável por gerenciar a documentação foi dissolvida no início dos anos 2000.

O terreno onde está a Lagoa da Anta pertence, desde 31 de agosto de 1973, a Arthur Lundgren Hotéis do Nordeste S/A, conforme registro em cartório. Em 17/12/1974 o então governador Afrânio Lages autorizou, através da Lei 3.419, a instalação do empreendimento privado. Pelo que foi aprovado na Assembleia Legislativa, o Poder Executivo estava autorizado a adotar todas as providências necessárias “à participação do Estado em qualquer grupo encarregado da instalação de Hotéis, objetivando a construção de mais uma unidade hoteleira na cidade de Maceió”, conforme trecho do documento transcrito na ata da Assembleia Geral Extraordinária do grupo Lundgren, realizada em 15/7/1977 e publicada nos jornais de maior circulação da época.

O parágrafo único da lei descreve como seria a participação do Estado no empreendimento:
“mediante a subscrição de ações ordinárias no valor não inferior a Cr$ 100.000,00 (cem mil cruzeiros), integralizado através de incorporação do terreno denominado ‘Lagoa da Anta’, de sua propriedade”.

O artigo 2º é ainda mais específico: “O Governador do Estado poderá transferir no todo ou em parte as ações que o Estado possuir, no Grupo Hoteleiro, para a Empresa Alagoana de Turismo S.A. — EMATUR, desde que a operação, a seu critério, convenha aos interesses da Administração”.

A Ematur deixou de existir no início dos anos 2000, no rastro de empresas públicas dissolvidas por funcionarem quase exclusivamente como cabides de emprego a apadrinhados. Não descobrimos o valor exato do terreno incorporado, mas tanto o Estado quanto o grupo acordaram que esse trabalho ficaria a cargo de uma empresa especializada em avaliações – hoje extinta – a Jangada Imóveis e Representações LTDA, cujo escritório funcionava na Rua do Imperador, 361.

Atualmente funciona na área da Lagoa da Anta o Jatiúca Hotel & Resort, ainda do grupo Lundgren e que está em negociações avançadas com a Record Construtora. Ela pretende erguer cinco torres de 15 andares no local. A preocupação de entidades da sociedade civil organizada é o futuro da Lagoa da Anta.

Mas é improvável que isso aconteça porque a visão da lagoa nas janelas dos apartamentos do hotel sempre foi explorada comercialmente, ao longo das décadas, como um atrativo aos consumidores, tanto através de anúncios e publicações do passado e mais recentemente.

“Quando falamos da Lagoa da Anta estamos diante do último resquício de bacia d’água em zona urbana de Maceió, por isso temos o dever constitucional de preservar esse nosso ponto turístico, de convívio urbano e de preservação da natureza. Temos ainda ali, matas ciliares que desempenham papel fundamental na natureza”, explicou o presidente da Comissão de Meio Ambiente da Assembleia Legislativa, Delegado Leonam (União Brasil), em sessão pública realizada esta semana pela Assembleia Legislativa.

Davi Maia, ex-secretário do Meio Ambiente em Maceió, contesta o que chama de “barbaridades” ditas na sessão: primeiro, a Lagoa da Anta não é o último resquício de lagoa urbana na capital. “Acho que a Lagoa Mundaú fica no Japão”, ironiza.

Sobre a área: detalha que ela é privada (e isso corrobora com a documentação oficial), não é de preservação “e tem uma cancela na porta”. Defende também que o debate seja levado adiante pela Câmara de Vereadores da capital, não pela Assembleia Legislativa. Além do plano diretor, cuja última edição foi em 2005. “A Prefeitura engavetou [a atualização do plano]”, resume.

O Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano de Maceió (Iplan) planeja atualizar ainda este ano o plano.


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