Conteúdo do impresso Edição 1306

CIDADE SITIADA

Família Gonçalves envolve Rio Largo em nova crise de sequestros, herança e conflitos políticos

Rumores envolvendo o ex-prefeito Gilberto Gonçalves e sua família provocam tensões políticas
Por JOSÉ FERNANDO MARTINS 15/03/2025 - 06:00
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REPRODUÇÃO
Carlos Gonçalves assumiu como prefeito em 1º de janeiro
Carlos Gonçalves assumiu como prefeito em 1º de janeiro

Há algo de podre no reino de Rio Largo. Uma crise envolvendo a Família Gonçalves vem gerando um burburinho político que mistura questões familiares e denúncias graves. Há rumores que vão desde um sequestro até disputas por heranças. Surpreendentemente, até o momento, não houve qualquer pronunciamento oficial da Prefeitura ou do ex-prefeito Gilberto Gonçalves (PP), atual supersecretário da Secretaria Municipal de Governo (Segov), sobre o assunto, o que é mais estranho ainda, uma vez que GG é conhecido por seu comportamento impetuoso.

GG já foi filmado durante seu mandato em episódios polêmicos, como a impaciência com alunos de uma escola municipal e um enfrentamento isolado contra moradores que protestavam em uma via da cidade. Mas a crise de agora teve início em 2024, quando Gonçalves, com o apoio de sua esposa e ex-primeira-dama, Cristina Gonçalves, apoiou o sobrinho dela, Pedro Carlos da Silva Neto – que adotou o nome político de Carlos Gonçalves (PP) –, como seu sucessor.

A intenção de manter o poder nas mãos da família, no entanto, começou a desmoronar antes mesmo da posse do novo prefeito. Em um evento religioso tradicional, a festa da padroeira de Rio Largo, o clima de união esperado foi substituído por um momento de tensão política. Durante a cerimônia, Gilberto Gonçalves evitou até mesmo abraçar a esposa publicamente, culminando em um episódio de hostilidade com o sobrinho. Ao se aproximar de Carlos, GG, com semblante furioso, o chamou de “cabra safado”, gerando murmúrios entre os presentes.

Em janeiro último, Carlos Gonçalves assumiu a prefeitura, e Gilberto Gonçalves ganhou uma secretaria para chamar de sua. No entanto, a ingerência de GG no governo municipal se tornou insustentável. O ex-prefeito, agora supersecretário, tentou intervir na eleição das comissões da Câmara Municipal, mas foi barrado pela unanimidade dos vereadores. Revoltado, GG exonerou servidores indicados pelos vereadores, o que gerou uma forte reação política. Após a pressão, o prefeito Carlos Gonçalves foi forçado a validar a decisão dos vereadores e reverter as demissões, mas a tensão permaneceu.

SEQUESTRO

O prefeito, em entrevista ao EXTRA, procurou minimizar o conflito, afirmando que o ex-prefeito segue no governo, com 50 cargos à disposição e um salário de R$ 20 mil. Contudo, novas polêmicas começaram a surgir, a mais grave delas envolvendo a ameaça de morte ao prefeito Carlos Gonçalves. Ele estaria sendo pressionado a renunciar ao cargo, com sua avó, mãe biológica de Cristina Gonçalves, tendo sido sequestrada em 5 de fevereiro de 2025 como parte da chantagem. A idosa teria sido liberada após algumas horas, mas o medo e a insegurança permeiam o ambiente político local. Nenhum boletim de ocorrência foi registrado. O EXTRA entrou em contato com a senhora Cecília, mas só conseguiu respostas desconexas. Uma hora atendeu falando que não “queria saber”, mesmo sem a reportagem fazer perguntas. E por mensagem no WhatsApp, chegou a responder, mas bloqueou o EXTRA antes de qualquer resposta.

Mas vale lembrar que sequestro não é um tema novo na família Gonçalves. Em 2018, chegou a sair em sites locais que Geoberto Gonçalves da Silva Cordeiro, filho do ex-prefeito GG e de Cristina e irmão da deputada estadual Gabriela Gonçalves, teria sido sequestrado e mantido em cárcere privado pela própria família. A fúria contra o filho seria um relacionamento amoroso reprovado pelos pais.

De forma geral, parece que toda a família Gonçalves adora colecionar dramas. A irmã de Gilberto Gonçalves publicou um vídeo nas redes sociais denunciando dificuldades financeiras, alegando que o ex-prefeito a estaria impedindo de ter acesso à herança dos pais, o que a obrigaria a viver apenas com seu salário. Apesar do apelo nas redes sociais, Nadeje Gonçalves só conseguiu comentários de internautas insinuando que ela teria problemas psicológicos.

Contas reprovadas

O inferno astral de GG se intensifica com o Tribunal de Contas do Estado de Alagoas (TCE-AL) reprovando as contas de 2023 de sua gestão como prefeito. A decisão se baseou no relatório da Diretoria de Fiscalização Municipal (DFAFOM) e no parecer do Ministério Público de Contas, que apontou irregularidades graves e um rombo de R$ 18.162.043,49. Entre as irregularidades apontadas, destaca-se a abertura de créditos suplementares por superávit financeiro sem que houvesse recursos disponíveis para cobri-los, o que configura um claro descontrole financeiro.

Durante a sessão plenária de julgamento das contas no TCE, presidida pelo conselheiro Fernando Ribeiro Toledo, foi recomendada à Câmara Municipal de Rio Largo a reprovação das contas de Gonçalves para o exercício de 2023. A reprovação das contas pode resultar em inelegibilidade de até oito anos para o ex-prefeito, conforme a legislação eleitoral, caso as irregularidades sejam consideradas insanáveis.

Vitória do MDB

Eleito pelo PP com o apoio de GG, Carlos Gonçalves já deu sinais de afastamento do grupo liderado pelo ex-presidente da Câmara, Arthur Lira (PP), e de aproximação com o governador Paulo Dantas (MDB) e o grupo dos Renans. Nos últimos dias, o prefeito intensificou diálogos com Dantas, discutindo projetos para Rio Largo, incluindo obras de infraestrutura e segurança pública. A movimentação não parou por aí: Carlos Gonçalves também se reaproximou dos senadores Renan Calheiros (MDB) e Renan Filho (MDB), ministro dos Transportes, em articulações que já vinham ocorrendo nos bastidores.

Na terça-feira (11), um vídeo divulgado nas redes sociais reforçou essa guinada política. Nas imagens, Carlos aparece em Brasília ao lado dos dois Renans, afirmando estar em busca de investimentos para o município. O gesto foi interpretado como um indicativo claro de sua mudança de lado – algo que não passou despercebido por GG. Gilberto Gonçalves, que comandou Rio Largo por oito anos, sempre esteve alinhado ao grupo de Arthur Lira. Diante da movimentação de seu ex-aliado, a expectativa agora é de um possível rompimento definitivo, com Carlos desembarcando no MDB e GG assumindo a oposição ao atual prefeito.

Histórico conturbado

O ex-prefeito Gilberto Gonçalves acumula um histórico de acusações e processos judiciais que envolvem desvio de recursos públicos, lavagem de dinheiro e crimes eleitorais. Seu nome aparece em investigações de grande repercussão, como a Operação Taturana e a Operação Beco da Pecúnia, além de outros processos criminais.

Envolvimento em esquemas de corrupção

- Operação Taturana (2007): Gilberto Gonçalves foi preso sob acusação de participar de um esquema que desviou aproximadamente R$ 300 milhões da Assembleia Legislativa de Alagoas. As investigações apontaram crimes como formação de quadrilha, peculato, lavagem de dinheiro e crimes contra o sistema financeiro nacional.

- Operação Beco da Pecúnia (2022): durante seu mandato como prefeito de Rio Largo, foi preso preventivamente e afastado do cargo sob suspeita de desviar recursos federais do Fundeb e do SUS. O Ministério Público apura sua ligação com um esquema de lavagem de dinheiro e organização criminosa.

Outros crimes e investigações

- Ameaça de morte (2010): Gilberto foi acusado de ameaçar de morte um ex-funcionário que havia movido uma ação trabalhista contra ele.

- Crime eleitoral (2014): foi detido por facilitar a fuga de um motorista envolvido em propaganda política irregular.

- Ocultação de bens e lavagem de dinheiro: o Ministério Público investiga Gonçalves por utilizar terceiros como “laranjas” para ocultar patrimônio e operar empresas em seu nome. Ele é suspeito de movimentar recursos de origem ilícita através de empresas registradas por aliados.


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