BAIRROS DESTRUÍDOS
TJ tende a beneficiar Braskem sobre posse de imóveis
Ações questionam cláusula ‘ilegal e absurda’, mas tribunal reconhece argumento da empresa
Decisões mais recentes do Tribunal de Justiça de Alagoas tendem a beneficiar a Braskem ao manter todos os pontos do acordo assinado entre os moradores e a empresa para desocupação de áreas de risco. Isso significa que a cláusula 14, referente aos pagamentos de terrenos e edificações implicando a transferência deles para a fábrica, também não deve ser questionada, apesar da operação ser considerada ilegal e absurda tanto pela Defensoria Pública Estadual quanto pelo advogado Antiógenes Lira, dono de imóvel no bairro do Pinheiro e buscando, na Justiça, impedir alterações no bem.
A Defensoria e o advogado sustentam que a perda da propriedade dos imóveis em benefício da Braskem fere o Código Civil, pois não vincula perda da propriedade em decorrência de indenização por dano.
Tanto a presidência do TJ quanto a 3ª Câmara Cível decidiram esta semana, em ações diferentes sobre o caso Braskem, que após a assinatura do termo de acordo para desocupação de áreas de risco, o beneficiário, neste caso o morador da área de risco, “conferiu quitação irrevogável à Braskem S/A (...) de quaisquer obrigações, reivindicações e pretensões e/ou indenizações de qualquer natureza, transacionando todos e quaisquer danos patrimoniais e/ou extrapatrimoniais relacionados, decorrentes ou originários direta e/ou indiretamente da desocupação de imóveis em razão do fenômeno geológico verificado em áreas da Cidade de Maceió/AL, bem como todos e quaisquer valores e obrigações dai decorrentes ou a ela relacionados, nada mais podendo reclamar a qualquer título, em Juízo ou fora dele”.
Mais adiante, nas mesmas ações, está escrito: “CERTIFICO também, que nos termos do acordo, o(a) beneficiário(a) renunciou e desistiu de eventuais direitos remanescentes decorrentes da desocupação, para nada mais reclamar em tempo algum, expressamente reconhecendo que não possui mais qualquer direito e que se absterá de exercer, formular ou perseguir qualquer demanda, ação ou recurso de qualquer natureza, perante qualquer tribunal ou jurisdição, comprometendo-se a pleitear a desistência de todas e quaisquer demandas judiciais e/ou administrativas e de suas respectivas pretensões, iniciadas no Brasil ou em qualquer outro país”.
Se nenhum ponto do acordo pode ser questionado, teoricamente isso inclui a cláusula 14. Mas é preciso saber que não existe uma decisão específica sobre o assunto. Daí a ação movida pelo advogado Antiógenes Lira:
“A partir desta cláusula, os Ministérios Público (Federal e Estadual) e as Defensorias Pública (da União e do Estado) determinaram a perda da propriedade dos imóveis de forma total e absolutamente ILEGAL em benefício da Braskem, olvidando completamente o conteúdo do art. 1275 do Código Civil, ou seja, essas Instituições determinaram a perda da propriedade em decorrência de indenização por dano”, explica Lira, na ação.
“A evidente ilegalidade é porque a transferência da propriedade do autor foi determinada por instituições sem atribuição, nem poder para ordenar a perda ou expropriação da propriedade de quem quer que seja. Por isso, a sentença homologatória do acordo menciona apenas o pagamento de INDENIZAÇÕES (por dano material e moral), silenciando quanto à transferência da propriedade ou da posse dos moradores”, declara.
O item 2 do termo de acordo assinado entre morador e a empresa fala em pagamento de indenização por danos morais e materiais. É o que está escrito no processo judicial em tramitação na 3ª Vara da Justiça Federal, ação movida pela Defensoria Pública Estadual:
“2. Em conformidade com a Cláusula 13ª, Capítulo IV (Do Pagamento Pelos Imóveis Desocupados e Pela Interrupção da Atividade Econômica), do TERMO DE ACORDO, o montante ofertado pela Braskem S.A. contempla danos morais e materiais dos beneficiários, assim considerados: (i) os proprietários e moradores dos imóveis desocupados; (ii) os indivíduos que exerciam atividade econômica nas áreas de Risco.”
A cláusula 58 do termo de acordo para extinguir a ação civil pública socioambiental proíbe a Braskem de construir edificações no local.
“A Braskem compromete-se a não edificar, para fins comerciais ou habitacionais, nas áreas originalmente privadas e para ela transferidas em decorrência da execução do Programa de Compensação Financeira, objeto do Termo de Acordo celebrado em 03 de janeiro de 2020, SALVO SE, após a estabilização do fenômeno de subsidência, caso esta venha a ocorrer, isso venha a ser permitido pelo Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano da Cidade de Maceió – AL.”
Mas, diz o advogado, o que é possível observar atualmente é que “os terrenos estão prontos para serem edificados e não há qualquer ato público que impeça”.