DESCASO
Monumento abandonado pela Prefeitura de União dos Palmares será colocado em praça de Maceió
“Braço sagrado dos orixás das águas” doado pelo professor Edson Moreira foi resgatado por ele com a colaboração da médica Taciana Lopes e do ex-vereador Cleber Costa
Após anos de abandono pela Prefeitura de União dos Palmares, o monumento histórico “Braço sagrado dos orixás das águas”, doado pelo professor e historiador Edson Moreira à terra de Zumbi dos Palmares, foi resgatado no início da semana e será colocado em uma praça no bairro de Jacarecica, em Maceió. A previsão é que até dezembro de 2025 o projeto seja concluído e a obra tenha o destaque que merece.
O descaso com a mão de pedra em granito fincada na Lagoa Sagrada, situada na Serra da Barriga, foi gritante a ponto de o monumento ser deixado no lixo. O caso veio à tona em denúncia no blog do jornalista Ivan Nunes. Indignado com o desprezo de parte da história e cultura, o empresário Lucilio Vasconcelos, proprietário do restaurante A Porteira, em União, acolheu a obra em seu estabelecimento comercial. Lá foi cuidado até a Prefeitura de Maceió ceder um caminhão e motorista para conduzir o Braço Sagrado ao Quilombo Real, residência do historiador Edson Moreira na capital alagoana.
A mão sagrada era um projeto antigo do professor, mas que só em 2014 foi concretizado. Confiante que devido seu valor histórico seria cuidada como merecia, Moreira ficou surpreso com a falta de respeito com a obra. Após a denúncia, ele pediu a colaboração do Dr. Cleber para resgatar o monumento e construir a Praça Avenida das Nações Africanas, em Jacarecica – cujo projeto está em andamento – e doar a estátua para o município de Maceió.
A médica Taciana Lopes, parceira e amiga de Moreira, não mediu esforços e se deslocou até União dos Palmares para buscar o braço sagrado e entregar a seu idealizador. A emoção tomou conta do professor ao rever aquele monumento tão importante para a história e que foi adquirido com recursos próprios.
Vale ressaltar que no mesmo dia em que aconteceu a entrega da Mão Sagrada à Secretaria de Cultura de União, a estátua de Nossa Senhora dos Pretos também foi deixada no local. Antes, porém, o professor Edson e Taciana falaram com o prefeito à época sobre o projeto e sua importância. Porém, não demorou muito e a primeira decepção veio com a falta de compromisso e a promessa de colocar a imagem no espaço indicado não foi cumprida. Cansado de esperar pelo poder público, o professor Edson foi conversar com o padre da cidade para abençoar a santa. E assim, o professor, mais uma vez, com recursos próprios, locou um caminhão e Nossa Senhora foi levada em procissão até o Muquém e lá celebrada uma missa.
O projeto desenhado pelo professor previa a construção de uma capelinha para proteger a obra. Nunca saiu do papel e a santa se encontra com as mãos quebradas e o local encoberto pelo mato e sujeira. Na verdade, a proposta inicial era de que aos arredores da santa fosse criado um espaço de artesanato que movimentasse a economia local. Nada foi feito até então.
Esta não foi a primeira vez que o professor passou por constrangimentos devido à sua doação à causa. Prova disso é a estátua de Zumbi dos Palmares que ele também comprou com recursos próprios para ser colocada na Serra Dois Irmãos, em Viçosa, mas a administração do município à época fez pouco caso e não mostrou interesse em receber a doação. Na ocasião, o ex-vereador Cleber Costa abraçou a proposta que foi desprezada pelas autoridades daquela localidade e junto ao prefeito de Maceió, JHC, conseguiu a reforma da Praça Zumbi dos Palmares, no Centro da capital alagoana, e a estátua foi colocada na praça que leva seu nome.
SAÚDE DEBILITADA
O professor Edson Moreira está com a saúde debilitada e tudo se agravou desde a época em que a Praça Ganga Zumba foi destruída numa madrugada e ele ficou sabendo através do noticiário da manhã seguinte. Era a gestão do prefeito Cícero Almeida e o secretário responsável Mozart Amaral. A proposta seria de revitalização, mas seu monumento principal virou sucata e Moreira não aguentou tamanho desdém, logo em seguida sofreu um AVC (Acidente Vascular Cerebral). De lá para cá, a saúde do mestre está cada vez mais fragilizada e a cada falta de responsabilidade de alguns gestores com a história só se agrava a situação.
Apesar das limitações, o professor Edson Moreira se mantém um entusiasta de sua história, de seu povo. Como costuma dizer, “uma só pedra não foi colocada no Brasil se não foi por trabalho escravo”. “Se a história do povo afro se mantém viva em nosso estado foi através da luta dele e da família, por meio de muito sacrifício como doar seu único salário como professor para comprar monumentos, quadros e peças para manter a nossa história”, enalteceu a amiga que abraçou a causa, Taciana Lopes.
PATRIMÔNIO HISTÓRICO VIVO
O professor, historiador e teólogo Edson Moreira da Silva tem dedicado a vida na contribuição e valorização da cultura negra no país, o que levou Taciana Lopes a sugerir às autoridades competentes no âmbito municipal, estadual e federal que ele seja considerado oficialmente como patrimônio histórico vivo. “Que o reconhecimento seja feito em vida, pois a vida dele foi tomada em prol da cultura brasileira. O professor Edson continua se doando de corpo e alma até hoje, mesmo na situação a qual se encontra”, afirmou a amiga Taciana.
Vida longa e o reconhecimento para o professor e poeta Edson Moreira!