BAIRROS DESTRUÍDOS
Falta de estudo urbanístico contribui para crime ambiental
Novos estudos apontam que crimes da Braskem causaram um efeito dominó em Maceió
O crime ambiental provocado pela Braskem e que levou ao afundamento do solo em cinco bairros de Maceió e mais de 50 mil desabrigados, poderia ter sido evitado se o Plano Diretor da capital cobrasse o Estudo de Impacto de Vizinhança (EIV) e a própria empresa respeitasse os próprios princípios de responsabilidade social corporativa. As conclusões são de dois estudos recentes sobre os efeitos da mineração em Maceió, publicados nas revistas Cidades: Comunidades e Territórios – escrito por Tatiane Ferreira Olivatto, Felipe Facci Inguaggiato e José Augusto Di Lollo da Universidade Federal de São Carlos e da Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho – e Perspectivas da Ciência e Tecnologia – escrito por Vanessa Faria Silva (IFRJ), Ana Paula Medeiros Bauer (Faeterj) e Renata Guimarães Quelha de Sá (UFF).
O EIV foi documento nunca apresentado pela empresa muito menos cobrado pelas autoridades públicas ligadas ao meio ambiente. Outro documento, o Relatório de Impacto Ambiental (Rima), só foi disponibilizado em 2023, ou seja, 44 anos após a instalação da empresa no bairro do Pontal da Barra.
DEMOLIÇÃO
O Rima mostra que a ausência de instrumentos urbanísticos adequados dificultou a identificação e mitigação prévia de impactos sobre mobilidade, saneamento, equipamentos públicos, patrimônio histórico e saúde mental. O relatório da Braskem recomendou a demolição controlada nos bairros Mutange, Bebedouro, Pinheiro e Bom Parto; o pagamento das compensações financeiras. Porém, não levou em conta para onde migraram as pessoas obrigadas a deixar estes bairros, sobrecarregando os serviços nas áreas de destino dos realocados.
O EIV, objeto de estudo dos pesquisadores, teria como prever especulação imobiliária, crescimento desordenado e transformações no tecido urbano. “A não condução do EIV não permitiu a correta avaliação dos impactos na qualidade de vida desses refugiados ambientais urbanos, especialmente daqueles que têm impacto na vida diária da população, como por exemplo, alterações do tempo e perfil de deslocamento diários para o trabalho, escola, lazer, etc. Também não foram avaliados os impactos sociais e econômicos diretos nas famílias que possuíam estabelecimentos comerciais que foram fechados”, diz trecho do estudo.
A empresa tinha conhecimento prévio dos riscos da exploração de sal-gema em uma área geologicamente instável, mas ainda assim manteve as atividades por décadas. A comunicação com os moradores foi falha: “Os moradores dos bairros Mutange, Bom Parto, Bebedouro, Pinheiro e Farol não sabiam sobre como funcionavam as atividades da empresa”, o que evidencia o uso da assimetria de informação como forma de manter o controle territorial.
Mesmo após o colapso, as medidas adotadas pela empresa foram consideradas insuficientes. “Os dados analisados apontam para o foco da reparação financeira, como uma obrigação legal e econômica da Braskem, que utiliza o poder dos recursos para lidar com a dor causada nas famílias e recuperar a imagem de empresa responsável”.
“Os crimes contra o território, o enfraquecimento do lugar e as consequências futuras no âmbito cultural das pessoas que tiveram as casas desapropriadas não podem ser reparados com soluções financeiras”, diz ainda o estudo.
O governo do Estado aguarda a venda da Braskem para negociar o passivo Alagoas. O assunto voltou à pauta esta semana, através do senador Renan Calheiros (MDB). Ele lembrou que a mineradora é a maior credora do Estado. Além disso, as indenizações precisam ser pagas de forma justa, diferente dos acordos celebrados entre a companhia e as vítimas. E, ao final, a saída da empresa do Pontal da Barra, hipótese defendida por Renan.