Conteúdo do impresso Edição 1325

BAIRROS DESTRUÍDOS

Falta de estudo urbanístico contribui para crime ambiental

Novos estudos apontam que crimes da Braskem causaram um efeito dominó em Maceió
Por Odilon Rios 26/07/2025 - 06:00
A- A+
Afrânio Bastos
Mina 18, da Braskem, no bairro do Mutange
Mina 18, da Braskem, no bairro do Mutange

O crime ambiental provocado pela Braskem e que levou ao afundamento do solo em cinco bairros de Maceió e mais de 50 mil desabrigados, poderia ter sido evitado se o Plano Diretor da capital cobrasse o Estudo de Impacto de Vizinhança (EIV) e a própria empresa respeitasse os próprios princípios de responsabilidade social corporativa. As conclusões são de dois estudos recentes sobre os efeitos da mineração em Maceió, publicados nas revistas Cidades: Comunidades e Territórios – escrito por Tatiane Ferreira Olivatto, Felipe Facci Inguaggiato e José Augusto Di Lollo da Universidade Federal de São Carlos e da Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho – e Perspectivas da Ciência e Tecnologia – escrito por Vanessa Faria Silva (IFRJ), Ana Paula Medeiros Bauer (Faeterj) e Renata Guimarães Quelha de Sá (UFF).

O EIV foi documento nunca apresentado pela empresa muito menos cobrado pelas autoridades públicas ligadas ao meio ambiente. Outro documento, o Relatório de Impacto Ambiental (Rima), só foi disponibilizado em 2023, ou seja, 44 anos após a instalação da empresa no bairro do Pontal da Barra.

DEMOLIÇÃO

O Rima mostra que a ausência de instrumentos urbanísticos adequados dificultou a identificação e mitigação prévia de impactos sobre mobilidade, saneamento, equipamentos públicos, patrimônio histórico e saúde mental. O relatório da Braskem recomendou a demolição controlada nos bairros Mutange, Bebedouro, Pinheiro e Bom Parto; o pagamento das compensações financeiras. Porém, não levou em conta para onde migraram as pessoas obrigadas a deixar estes bairros, sobrecarregando os serviços nas áreas de destino dos realocados.

O EIV, objeto de estudo dos pesquisadores, teria como prever especulação imobiliária, crescimento desordenado e transformações no tecido urbano. “A não condução do EIV não permitiu a correta avaliação dos impactos na qualidade de vida desses refugiados ambientais urbanos, especialmente daqueles que têm impacto na vida diária da população, como por exemplo, alterações do tempo e perfil de deslocamento diários para o trabalho, escola, lazer, etc. Também não foram avaliados os impactos sociais e econômicos diretos nas famílias que possuíam estabelecimentos comerciais que foram fechados”, diz trecho do estudo.

A empresa tinha conhecimento prévio dos riscos da exploração de sal-gema em uma área geologicamente instável, mas ainda assim manteve as atividades por décadas. A comunicação com os moradores foi falha: “Os moradores dos bairros Mutange, Bom Parto, Bebedouro, Pinheiro e Farol não sabiam sobre como funcionavam as atividades da empresa”, o que evidencia o uso da assimetria de informação como forma de manter o controle territorial.

Mesmo após o colapso, as medidas adotadas pela empresa foram consideradas insuficientes. “Os dados analisados apontam para o foco da reparação financeira, como uma obrigação legal e econômica da Braskem, que utiliza o poder dos recursos para lidar com a dor causada nas famílias e recuperar a imagem de empresa responsável”.

“Os crimes contra o território, o enfraquecimento do lugar e as consequências futuras no âmbito cultural das pessoas que tiveram as casas desapropriadas não podem ser reparados com soluções financeiras”, diz ainda o estudo.

O governo do Estado aguarda a venda da Braskem para negociar o passivo Alagoas. O assunto voltou à pauta esta semana, através do senador Renan Calheiros (MDB). Ele lembrou que a mineradora é a maior credora do Estado. Além disso, as indenizações precisam ser pagas de forma justa, diferente dos acordos celebrados entre a companhia e as vítimas. E, ao final, a saída da empresa do Pontal da Barra, hipótese defendida por Renan.


Encontrou algum erro? Entre em contato