Dólar cai a menor valor em um mês, a R$ 5,42; Ibovespa fecha na mínima do dia pelo 2º dia

Por Agência Estado 19/09/2024 - 18:21

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O real teve a 2ª melhor performance entre as principais divisas emergentes e de países exportadores de commodities nesta quinta-feira, 19 ,ficando atrás apenas da moeda australiana. A apreciação cambial - pelo sétimo pregão consecutivo, que levou a cotação para menor nível desde 19 de agosto - ocorre com a leitura do mercado de que o corte de 50 pontos-base na taxa dos Fed funds é favorável para commodities, com o Brasil se beneficiando também pelo maior diferencial entre os juros da maior economia do mundo e o local, após o Comitê de Política Monetária (Copom) subir a Selic em 0,25 ponto porcentual e trazer um comunicado hawkish (duro). Contudo, o quadro fiscal brasileiro segue como pano de fundo e limita uma performance ainda mais positiva.

"A combinação de início de ciclo de queda mais intenso nos EUA e de sinalização de ciclo de alta mais forte no Brasil sugere apreciação do real brasileiro por conta do aumento do diferencial de juros", afirma o Banco Pine, em relatório.

O Fed cortou ontem a taxa dos Fed Funds para a faixa entre 4,75% a 5,00% ao ano, estimulando um maior apetite por risco entre os investidores e favorecendo moedas de mercados emergentes, avalia Bruno Nascimento, analista de câmbio da B&T Câmbio.

Já a Selic foi elevada para 10,75%, no primeiro aperto monetário do governo Lula 3. O tom do comunicado do Copom foi considerado mais duro, levantando apostas de que o BC vai acelerar o passo nas duas últimas reuniões do ano para terminar rápido, até janeiro, o ciclo de aperto.

Em baixa desde a abertura, o dólar chegou a tocar mínima intradia de R$ 5,3958 pela manhã. Ao amenizar o ritmo por parte da tarde, a moeda americana fechou em queda de 0,69%, a R$ 5,4242.

Na avaliação do UBS, a erosão da vantagem de rendimento dos EUA deve levar a uma erosão da sobrevalorização do dólar.

Entre as principais divisas emergentes e de exportadores de commodities, o real só perde em relação ao dólar australiano, a que, segundo Adauto Lima, economista-chefe da Western, geralmente tem uma reação mais correlacionada às commodities, sobretudo com o minério de ferro - que subiu 1,69% (Dalian) e 2,18% (Cingapura).

O que pode limitar a apreciação do real continua sendo a questão fiscal, segundo Marcos Weigt, head de tesouraria do Travelex Bank. Para ele, não houve muita evolução no cenário fiscal e se continuar do jeito que está, a queda do dólar frente ao real será limitada.

Já Lima, da Western, pondera que "o fiscal já fez estrago lá atrás, e não houve na margem nada que piore ou melhore". O economista-chefe diz ainda que, no ano, a performance do real - que acumula queda de 11,76% contra o dólar - foi muito impactada por aspectos fiscais.

Ibovespa

Em dia de inapetência por risco na B3, desconectada da disparada de preços dos ativos listados em Nova York - especialmente os de tecnologia (Nasdaq +2,51%), mais sensíveis no curto prazo aos juros americanos -, prevaleceu na Bolsa brasileira o sentimento pós-Copom, combinado de certa forma ao pós-Fed. Por lá, as dúvidas sobre recessão têm ficado para trás, e com sinais mais amenos sobre a inflação, a expectativa é de que o BC americano siga adiante com os cortes de juros - o que em tese beneficiaria emergentes como o Brasil, e não apenas os ativos de risco nos Estados Unidos, como hoje.

Por aqui, contudo, embora Selic mais alta tenha o potencial de atrair recursos especialmente para renda fixa, o olhar imediato para o comunicado do Copom foi de alerta para a mudança na visão do BC sobre o hiato do produto, de neutra para o campo positivo, combinada também à assimetria altista destacada no balanço de riscos, observa Guilherme Jung, economista da Alta Vista Research.

Assim, a curva de juros doméstica avançou neste pós-Copom, com olhar detido do mercado sobre a elevação da projeção do Comitê, ainda que leve, na estimativa para o IPCA no horizonte relevante da política monetária, até o primeiro trimestre de 2026. O conjunto da obra, no comunicado, é de um BC ainda hawkish na transição de comando que se avizinha, no fim do ano. Nesse contexto, avançam apostas de que os próximos dois aumentos da taxa de juros de referência sejam mais graúdos, de meio ponto porcentual cada, o que colocaria a Selic a 11,75% no fim do ano - e chegando a 12% já na reunião seguinte, em janeiro de 2025, como reiterou na noite de ontem Rodolfo Margato, economista da XP.

Pelo segundo dia seguido, o Ibovespa fechou hoje na mínima da sessão, em baixa de 0,47%, aos 133.122,67 pontos, agora no menor nível desde 13 de agosto. Nesta quinta, oscilou entre a mínima do fechamento e a máxima de 134.758,76 pontos, saindo de abertura aos 133.747,64. Após o vencimento de opções sobre o Ibovespa no dia anterior, o giro financeiro recuou nesta quinta-feira para R$ 22,1 bilhões, convergindo para patamar um pouco acima da média recente. Na semana, o índice da B3 cai 1,30% e, no mês, cede 2,12%. No ano, acumula perda de 0,79%.

Nesta quinta-feira, o ajuste se manteve relativamente contido porque a ação de maior peso no Ibovespa, Vale ON, subiu 1,20% - com o minério em alta na China na sessão -, em fechamento negativo para os grandes bancos, como Bradesco (ON -1,03%, PN -1,38%), e misto para Petrobras (ON -0,30%, PN +0,33%) apesar da alta acima de 1,5% para o petróleo Brent e WTI no dia seguinte à suavização dos juros americanos. Na ponta ganhadora nesta quinta, Marfrig (+4,32%), BRF (+4,20%) e Prio (+1,90%). No lado oposto, Brava (-9,40%), Assaí (-5,72%) e Hapvida (-4,08%).

"Lá fora, o mercado reagiu muito bem ao início de corte de juros nos Estados Unidos, e com tom substancialmente mais dovish ameno, o oposto de hawkish de Jerome Powell, o presidente do Fed", diz Matheus Falci, sócio e assessor da One Investimentos. "Como esperado, o Copom veio na contramão do Fed, com alta da Selic e tom mais duro no comunicado, enfatizando ainda preocupação frente à desancoragem das expectativas de inflação, o que desenha a magnitude do ajuste ainda esperado para a política monetária brasileira, adiante", acrescenta.

"O Fomc do Fed cortou em meio ponto e o Copom subiu em 0,25 ponto porcentual ontem. A decisão do BC americano, de certa forma, estava um pouco menos precificada do que a que se viu aqui. Era de se esperar abertura na curva de juros doméstica, ainda nos próximos dias, antes que venha uma normalização", diz Camilla Dolle, head de renda fixa da XP.

"Momento é de o investidor olhar para renda fixa, que deve atrair mais fluxo, inclusive estrangeiro com o início dos cortes de juros nos Estados Unidos, que beneficia emergentes - e o Brasil ainda tem ativos descontados. Eventualmente, deve-se olhar também para algumas teses específicas em Bolsa, que pode ainda atrair recursos de estrangeiros para segmentos com os de bancos e energia", diz Charo Alves, especialista da Valor Investimentos.

Juros

Os juros futuros fecharam a sessão em forte alta nesta quinta-feira pós-Copom. O destaque da curva foi o trecho curto, que subiu 25 pontos-base, diante da leitura de que o ciclo total de ajuste da Selic pode chegar a 2 pontos porcentuais para ancorar as expectativas de inflação. A precificação de Selic para a reunião de novembro já mostrava, nesta tarde, 20% de chance de uma aceleração no ritmo de aperto de 0,25 ponto para 0,75 ponto porcentual. Ainda que em menor magnitude, os vencimentos longos também subiram, acompanhando o avanço dos rendimentos dos Treasuries e pela cautela antes do relatório bimestral de receitas e despesas que sai amanhã.

A taxa do contrato de Depósito Interfinanceiro (DI) para janeiro de 2025 fechou em 10,985%, de 10,940% ontem no ajuste. O DI para janeiro de 2026 encerrou com taxa de 12,05%, de 11,76%, fechando acima de 12% pela primeira vez desde 29/3/2023 (12,14%). O DI para janeiro de 2027 terminou com taxa de 12,01% (de 11,81% ontem no ajuste) e o DI para janeiro de 2029, taxa de 12,08%, ante 11,95% ontem no ajuste.

O Comitê de Política Monetária (Copom) elevou a Selic para 10,75% e trouxe uma comunicação considerada hawkish, deixando totalmente em aberto qual será o plano de voo. Várias casas têm colocado seus cenários para a política monetária em revisão para cima, diante da ênfase dos diretores sobre o ritmo de atividade após terem trazido o hiato do produto para o campo positivo. Essa mudança, em boa medida, foi vista como justificativa para o aumento da projeção de IPCA para 3,5% no primeiro trimestre de 2026, ainda mais distante da meta de 3%.

O avanço dos DIs curtos era esperado, mas não na magnitude registrada, e deveria, em tese, ancorar a ponta longa, mas não foi o que aconteceu. O alívio do câmbio, com o dólar descendo agora à casa de R$ 5,42, não conseguiu nem mesmo limitar o avanço das taxas.

O economista-chefe da Porto Asset, Felipe Sichel, explica que isso até ocorreu no começo do dia, mas depois os vencimentos longos também começaram a ganhar tração. "Estamos vendo um movimento de abertura da parte longa nos Estados Unidos e isso talvez tenha algum tipo de influência aqui, mas no geral deveria ser uma dinâmica mais doméstica do que qualquer outra coisa", comentou.

Sichel não descarta que o mercado tenha também buscado alguma proteção antes da divulgação do relatório bimestral previsto para esta sexta-feira. O secretário do Tesouro, Rogério Ceron, diz, porém, que o documento consolidará "de vez" o cenário para o cumprimento da meta fiscal de 2024.

Na curva, o mercado não só consolidou a aposta de alta de 0,50 ponto da Selic no próximo Copom, como a precificação já mostra 20% de probabilidade de a dose ser de 0,75 ponto. Os DIs apontam ainda taxa básica a 11,75% no fim de 2024 e ciclo total de ajuste de 2 pontos, incluindo o já realizado ontem. Os cálculos são do economista-chefe do banco Bmg, Flávio Serrano, para quem o mercado parece estar embutindo nos preços a chance de o BC ter de elevar a Selic bem mais do que o imaginado pelos receios de manutenção da pressão fiscal.

Dado o nível de estresse na curva, o Tesouro optou por reduzir os lotes de prefixados no leilão desta quinta-feira. As ofertas de 600 mil NTN-F e de 6 milhões de LTN foram absorvidas integralmente.


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