Barra de Santo Antônio

MPF e Ufal constatam condições precárias de marisqueiras e pescadores

Adoecimento da comunidade e dificuldade de acesso a políticas públicas refletem em vulnerabilidade
Por Assessoria 09/05/2024 - 09:27

ACESSIBILIDADE

Divulgação
Vila São Pedro, às margens do rio, na Barra de Santo Antônio
Vila São Pedro, às margens do rio, na Barra de Santo Antônio

Durante inspeção realizada na última segunda-feira (6), o Ministério Público Federal (MPF) e a Universidade Federal de Alagoas (UFAL) constataram a difícil realidade enfrentada pelos moradores da Vila São Pedro, antes conhecida como Vila Chié, localizada no município de Barra de Santo Antônio, no litoral norte de Alagoas. A comunidade está mergulhada num cenário de adoecimento, necessitando de atenção imediata.As equipes da procuradora da República Roberta Bomfim e da professora Dra. Eliane Cavalcanti foram recebidas por Ana Paula, representante da Rede de Mulheres Pescadoras da Costa dos Corais, e representantes da comunidade, que guiaram a visita. Esta pequena comunidade está instalada nas proximidades da área de mangue, na margem do Rio Santo Antônio, é formada por marisqueiras e pescadores (cerca de 80 famílias) e se sustentam da atividade pesqueira, em especial do massunin.

Durante a visita, os moradores relataram doenças que podem ter relação com as atividades desempenhadas pelos catadores de massunim. Além dos males ósseos e articulares, que podem estar ligados à falta de vitamina e às posturas e exercícios repetitivos na prática de catar o marisco, também foi apontada a disseminação de condições como a amebíase, verminoses, diabetes e hipertensão.As mulheres, por sua vez, enfrentam recorrentes problemas ginecológicos, muitas vezes sem acesso a exames e tratamentos adequados.A condição de extrema vulnerabilidade social é agravada pela presença de resíduos, esgoto a céu aberto, entulho, cascas de marisco e animais soltos por toda a comunidade. Esta realidade não apenas expõe os pescadores e marisqueiras, mas também, e mais preocupantemente, as crianças, cujo desenvolvimento e saúde podem ser comprometidos por este ambiente.

A professora e médica Eliane Cavalcanti, que participou da inspeção, não hesitou em descrever a comunidade como adoecida e em uma situação de vulnerabilidade alarmante, informando que devem ser indicadas ações de melhoria na política de saúde pública no local.Por sua vez, a procuradora da República Roberta Bomfim, membro do núcleo de tutela coletiva, destacou que a visita foi motivada pela necessidade de melhor conhecer a comunidade, mas que a inspeção revelou necessidades que ultrapassam em muito as doenças causadas pela contaminação da água e outros agentes poluentes. O problema se estende à falta de acesso a medicamentos, tratamentos e exames, exigindo medidas efetivas e elementares das autoridades competentes.“Diante desse quadro, é imprescindível que os órgãos responsáveis, em todas as esferas de governo, ajam para mitigar os danos à saúde e promover a dignidade e o bem-estar dessa comunidade tão negligenciada. Os habitantes da Vila São Pedro estão adoecidos, e a inação não pode ser uma opção”, finalizou Roberta Bomfim.

Registro Geral dos Pescadores

Marisqueiros e marisqueiras da Vila São Pedro relataram que têm enfrentado dificuldades para conseguir o registro como pescadores (RGP).O RGP é um documento emitido pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) e tem como principal objetivo regularizar a situação dos pescadores, garantindo seus direitos e acesso a benefícios.

Legalização da atividade: Confere legitimidade à profissão, garantindo que os trabalhadores estejam em conformidade com as leis e regulamentos da pesca;

Acesso a direitos trabalhistas: Permite que os pescadores tenham acesso a direitos trabalhistas, como aposentadoria especial, seguro-desemprego, auxílio-doença e benefícios previdenciários;

Participação em programas sociais: Muitos programas voltados para a pesca artesanal exigem o RG de pescadores como critério de participação. Isso inclui programas de capacitação, assistência técnica, financiamento e subsídios;

Controle e gestão da pesca: Ao saber quantos pescadores estão atuando em determinada região, o poder público pode implementar medidas adequadas para garantir a preservação dos estoques pesqueiros;

Identificação pessoal: Além de todos os aspectos legais e de acesso a benefícios, o RG de pescadores serve como documento de identificação pessoal, facilitando o relacionamento com órgãos governamentais, instituições financeiras e outras entidades.

Programa de Pesquisas Ecológicas de Longa Duração (PELD)

Representantes do programa PELD também participaram da visita, assim como o Observatório do Manguezal. O programa é um observatório de pesquisa sobre manguezais e ecossistemas, destaca uma realidade fundamental: a saúde do entorno está intrinsecamente ligada à preservação do meio ambiente. Isso é especialmente relevante para comunidades como a Vila São Pedro, onde os desafios de saúde pública estão intimamente relacionados às condições ambientais.Em Alagoas, a inclusão de áreas como a Barra de Santo Antônio, Paripueira e Ipioca (em Maceió) no observatório ressalta a importância de entender como problemas de saúde pública estão ligados ao meio ambiente local.

Questões como saneamento básico e gestão de resíduos, como esgoto e lixo, exigem não apenas intervenções práticas, mas também esforços de conscientização. É necessário que a comunidade esteja envolvida, especialmente considerando os territórios tradicionais, onde homens e mulheres da pesca são fundamentais.Um levantamento detalhado dos dados da comunidade, incluindo seu histórico e origens, é essencial para compreender plenamente os desafios enfrentados. Além disso, é fundamental promover uma campanha de valorização dos pescadores e marisqueiras, destacando seu papel como trabalhadores essenciais para a comunidade e incentivando o respeito e reconhecimento de sua profissão.

Meio Ambiente, Saúde Pública e Comunidade Tradicional

O MPF vem acompanhando os impactos ambientais e sociais da poluição do Rio Santo Antônio há alguns anos. Os impactos já diagnosticados revelam danos ambientais que se desdobram em danos à saúde de todos que se relacionam diretamente com o rio, especialmente comunidades tradicionais de pescadores.A situação da saúde, especialmente das mulheres pescadoras, já levou à realização de audiências públicas e reuniões para tratar do assunto. 

Nas mais recentes reuniões, ocorridas em março e abril, incluindo uma visita de Roberta Bomfim à comunidade pesqueira do Município, foi estabelecido um cronograma de atuação para viabilizar a articulação entre os órgãos envolvidos e garantir acesso ao diagnóstico e à implementação de políticas públicas de saúde para pescadoras e marisqueiras da Barra de Santo Antônio.A inspeção desta segunda-feira (6), torna prioridade uma solução para as doenças que atingem a comunidade de Vila São Pedro.



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