ECONOMIA

Alagoas aprova lei desproporcional para ampliar receita de dois municípios

Especialista questiona lei que 'aumenta distribuição do ICMS para privilegiados'
Por Redação com assessoria 19/08/2024 - 12:00
Atualização: 19/08/2024 - 09:44

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© José Cruz/Agência Brasil
Notas de dinheiro
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As discussões no Congresso sobre a reforma tributária acendem os holofotes para situações consideradas anormais nos estados. É o caso de Alagoas. O governo estadual condicionou o repasse de parte da receita oriunda do ICMS Verde aos municípios, sob o pretexto deles possuírem em seus territórios Unidades de Conservação, mas a medida tem a legalidade questionada.

Constitucionalmente 25% de tudo o que é arrecadado de ICMS no estado de Alagoas deve ser repassado aos municípios. Porém, o governo do estado criou uma legislação (a Lei nº 8.234/2020) própria que alterou as regras de repasse para privilegiar os municípios com boas práticas ambientais o que é algo positivo.

O problema é um dos incisos dessa lei criou uma regra considerada desproporcional e que privilegiou inicialmente apenas 2 municípios alagoanos, o do autor da lei e o do governador à época, Renan Calheiros. Esse fato está gerando uma distribuição desproporcional dos valores do ICMS aos municípios, segundo o advogado tributarista Sisley Sampaio.

Sampaio chama a atenção para a necessidade de avaliar qual seria a forma adequada de adotar regras para o repasse da receita de tributos que tenham como critérios hipóteses discriminatórias à luz da Constituição Federal.

Segundo ele, a legislação do Estado de Alagoas pode ser questionada em alguns aspectos, especialmente sobre o princípio da proporcionalidade, pois está concentrando 1% de todo o ICMS arrecadado no Estado em menos de 5% da totalidade dos municípios do estado, além disso, os critérios podem ser considerados discriminatórios em determinados aspectos.

Da forma como está posta a portaria da Secretaria da Fazenda de Alagoas (Sefaz) que determina o cálculo do valor adicionado do ICMS, acaba excluindo indevidamente a maioria dos municípios, ferindo desse modo o princípio da isonomia e da igualdade, na avaliação do tributarista.

“Portanto, como proposta de intervenção, de modo à adequação da norma à constituição e pensando em fomentar a ampliação de novas áreas de preservação ambiental, propôs-se a instituição de uma regra de transição para atender à segurança jurídica, e a modificação da legislação para contemplar os municípios que possuam iniciativas voltadas à instituição de Unidades de Conservação de modo a efetivar a igualdade e isonomia no repasse da receita”.

Segundo Sisley Sampaio, a Lei nº 8.234/2020 que alterou a Lei nº 5.981/1997 para destinar 1% do produto de arrecadação do ICMS aos municípios que possuem Unidades de Conservação em seus territórios, estabelece uma medida que pode ser considerada discriminatória, pois exclui municípios que, embora não possuam tais unidades, desenvolvem esforços significativos para a criação e manutenção de áreas protegidas.

“Esta discriminação vai de encontro aos princípios fundamentais da Constituição Federal, que visam garantir a igualdade e a justiça social em todo o território nacional”, afirma o advogado.

Sisley Sampaio entende que a norma em questão favorece exclusivamente os municípios que já possuem Unidades de Conservação, criando uma situação de desigualdade entre os municípios do estado. Tal abordagem desconsidera os esforços de prefeituras que investem em políticas ambientais, mas que ainda não conseguiram estabelecer formalmente tais unidades. “Esse cenário cria um desincentivo para que novos municípios se engajem em práticas de conservação ambiental, perpetuando uma distribuição desigual de recursos e oportunidades”, alerta.

O Brasil possui uma vasta diversidade de ecossistemas, que necessitam de medidas específicas para sua conservação e uso sustentável. Para tanto, o país adotou um sistema de Unidades de Conservação (UCs), regulamentado pelo Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza (SNUC), instituído pela Lei nº 9.985 de 2000. As UCs são divididas em dois grandes grupos: Unidades de Proteção Integral e Unidades de Uso Sustentável, cada uma com diferentes objetivos e níveis de restrição.

“As Unidades de Proteção Integral, como o nome sugere, visam a preservação integral da biodiversidade, permitindo apenas o uso indireto dos seus recursos naturais. Entre essas, destacam-se os Parques Nacionais, Estações Ecológicas, Reservas Biológicas, Monumentos Naturais e Refúgios de Vida Silvestre. Essas áreas são essenciais para a proteção de espécies ameaçadas, preservação de ecossistemas únicos e manutenção de processos ecológicos essenciais”, lembra o advogado.

Por outro lado, as Unidades de Uso Sustentável permitem o uso direto dos recursos naturais, mas de maneira planejada e sustentável, assegurando a continuidade dos processos ecológicos. Entre essas, encontram-se as Áreas de Proteção Ambiental (APAs), Florestas Nacionais, Reservas Extrativistas, Reservas de Desenvolvimento Sustentável e Áreas de Relevante Interesse Ecológico.

"Dentro deste contexto, o Rio São Francisco, um dos mais importantes cursos d’água do Brasil, poderia ser classificado e protegido sob uma dessas categorias. O rio é fundamental não apenas pela biodiversidade que abriga, mas também pela importância socioeconômica e cultural para diversas comunidades ribeirinhas. A criação de uma Unidade de Conservação ao longo do Rio São Francisco poderia ser uma estratégia eficaz para garantir sua preservação”.

Na avaliação de Sisley Sampaio, “não existem critérios do ICMS verde de Alagoas que contemple de maneira mais efetiva as demais áreas de conservação do Estado. Além disso, as políticas ambientais incentivam práticas sustentáveis que beneficiam tanto o meio ambiente quanto a economia. Programas de incentivo ao uso de energias renováveis, reciclagem e manejo sustentável de florestas, por exemplo, podem gerar empregos verdes e promover o desenvolvimento econômico de forma sustentável”.

Ao instituir políticas ambientais robustas, o Estado não apenas protege o patrimônio natural, mas também promove a educação ambiental e a conscientização pública, fomentando uma cultura de sustentabilidade e responsabilidade ambiental entre os cidadãos e as empresas. Dessa forma, as políticas ambientais são essenciais para assegurar um futuro equilibrado e sustentável para as próximas gerações.


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