COVID-19
'Sou hipertensa e sobrevivi. Minha filha era saudável, mas morreu'
As duas foram infectadas e internadas para tratamento
Desde o início da pandemia, as confirmações de que o Coronavírus acometem pessoas com comorbidade de forma mais graves acontecem diariamente. No entanto, isso não significa que a doença não faça vítimas que tinham histórico saudável.
Este é o caso da filha da dona de casa Germaine Herculano dos Santos, de 43 anos. Ela, hipertensa, foi infectada pelo Coronavírus. Sua filha, Kamilly Ribeiro, de 17 anos, sem comorbidades, também. As duas foram internadas em um posto de saúde em Xerém, distrito de Duque de Caxias, na Baixada Fluminense, no dia 23 de março, após apresentarem quadro suspeito de Covid-19. Na unidade de saúde, permaneceram isoladas juntas. Dois dias depois foram encaminhadas para o Hospital Moacyr do Carmo, na mesma cidade.
Dois dias após a internação, Germaine, que faz parte do grupo de risco se recuperou e recebeu alta. Kamilly, que se enquadrava entre os pacientes de risco, apresentou complicações graves e não resistiu. A filha de Germaine fez parte de um grupo pequeno em meio à pandemia do novo coronavírus: o de jovens saudáveis com complicações graves em decorrência da Covid-19.
Estudos apontam que os pacientes sem comorbidades e com menos de 50 anos correspondem a menos de 1% das pessoas em estado grave em decorrência do Sars-Cov-2, nome oficial do novo coronavírus. Quanto mais jovem, menos chances de apresentar complicações.
Médicos relatam que o sistema imunológico é o responsável pela melhor resposta do corpo à doença, e as vezes, existe uma falha pontual crítica mesmo sem comorbidades conhecidas e, por isso, a pessoa acaba desenvolvendo um quadro grave ou até morrendo em decorrência do coronavírus.
Kamilly passava parte dos dias se dedicando aos estudos e sonhava em cursar Medicina. A mãe conta que estava acompanhando o pai, idoso, que sofreu de AVC e estava internado no hospital. Em casa, começou a apresentar alguns problemas de saúde, como arrepios pelo corpo, tremedeira, calafrios e febre. Germaine contou que foi a uma unidade de saúde da região, passou por exames e foi diagnosticada com pneumonia.
Enquanto tomava os medicamentos para a suposta pneumonia, Germaine ficou de repouso em casa. Kamilly ajudava a mãe o dia inteiro. A adolescente reclamava de dores nas costas, mas não demonstrava preocupação com o problema. Depois da dor nas costas, ela começou a tossir e teve muita febre. "Com o passar dos dias, a situação foi piorando. Demos medicamentos para gripe para ela, mas nada melhorava", relata a dona de casa.
No dia 23, Kamilly foi um posto de saúde junto com o pai, o barbeiro José Antônio dos Santos. Na unidade, passou por raio-X, que mostrou que o pulmão dela estava comprometido e tinha aspecto semelhante ao de pacientes com a Covid-19. Os médicos logo pediram que a jovem fosse isolada e permanecesse no hospital. Germaine, que estava em casa, foi ao hospital para levar roupas para a filha e a equipe médica também a examinou — o marido dela e o filho caçula não apresentaram sintomas.
"Quando viram meu pulmão, notaram que estava comprometido com o dela. Nós duas fomos colocadas em um quarto em isolamento", relata. Posteriormente, mãe e filha foram levadas para o Hospital Moacyr do Carmo, onde permaneceram isoladas. As duas receberam o mesmo tratamento, que incluiu cloroquina.
Ela relata que alguns pessoas afirma que a filha morreu por causa do uso da cloroquina. " Não gosto quando dizem que minha filha morreu mesmo usando cloroquina. Eu também usei e sobrevivi. Não dá para falar que foi o medicamento que me salvou, nem que a prejudicou. Penso que devemos seguir o que dizem os estudiosos da área", diz Germaine.
Nos primeiros dias intubada, Kamilly apresentou melhora e respondeu bem aos medicamentos. Em seus últimos dias, porém, a adolescente piorou. Em 14 de abril, após 20 dias internada, Kamilly não resistiu. Na certidão de óbito da jovem consta que ela teve choque séptico, pneumonia e infecção por Covid-19 — o exame da jovem, feito logo após a internação, ficou pronto enquanto ela estava intubada.
"Quando me contaram que ela morreu, eu comecei a chorar e a gritar desesperada. A minha filha só tinha 17 anos. Como pode, né? Ela era saudável. Eu achava que eu, hipertensa, tinha mais chances de morrer que ela. Eu senti um vazio muito grande. A morte dela me trouxe uma sensação de impotência diante da vida. A gente não tem controle de nada", desabafa Germaine.
Ainda com sintomas, a mãe não pôde acompanhar o enterro da filha. Hoje recuperada, a dona de casa tenta retomar a vida.
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