BOLSA DE VALORES

Ibovespa cai 1,38% e apaga ganho da semana com perdas das bolsas em NY

O dólar subiu mais de 1% no mercado doméstico de câmbio nesta sexta-feira
Por Estadão Conteúdo 11/03/2023 - 04:00
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Divulgação
Dólar e Real, relação de altos e baixos
Dólar e Real, relação de altos e baixos

O Ibovespa caiu 1,38% nesta sexta-feira, 10, aos 103.618,20 pontos, refletindo a cautela do investidor com o cenário externo e doméstico. No exterior, a quebra do Silicon Valley Bank (SVB) renovou a aversão global a risco, em meio a leituras mistas do payroll dos Estados Unidos em fevereiro e da espera pelo CPI, na semana que vem. Por aqui, o IPCA de fevereiro acima do esperado diminuiu as apostas de antecipação dos cortes da Selic.

Sem apetite do estrangeiro por risco, o Ibovespa apagou o ganho semanal e encerrou o período em queda de 0,24%, após ter perdido 1,83% na semana anterior. No ano, a referência da B3 cede 5,57%. O desempenho do dia ficou em linha com os pares de Nova York, onde o S&P 500 recuou 1,45%, acompanhado de perto por Dow Jones (-1,46%) e Nasdaq (-1,07%).

"Acredito que a piora do Ibovespa hoje se deve, em grande parte, à aversão a risco no cenário internacional", diz a economista-chefe da Veedha Investimentos, Camila Abdelmalack. "O mercado interpretou alguns dados do payroll como sinal de desaceleração do mercado de trabalho, o que veio a calhar para tirar um pouco de pressão dos juros americanos. No entanto, o evento do SVB acabou contaminando o mercado."

A criação de postos de trabalho apurada pelo payroll em fevereiro superou as expectativas do mercado, mas o relatório também apontou um aumento do desemprego a um nível acima do esperado, de 3,4% a 3,6%. O dado trouxe a aposta de aumento de 0,25 ponto porcentual da taxa dos Fed Funds de volta à mesa, dias após a ferramenta do CME Group ter indicado um aumento de 0,5 ponto como mais provável.

Mas o colapso do SVB, maior banco americano a quebrar desde a crise financeira de 2008, apagou o otimismo com uma trajetória mais suave de juros no Fed e fez com que as bolsas de Nova York - e o Ibovespa - tocassem as mínimas da sessão durante a tarde. O episódio contaminou também o segmento financeiro no Brasil, que caiu 2,35%, puxado pelas baixas de Bradesco (-2,86% PN, -2,64% ON) e Itaú Unibanco PN (-2,39%).

"As ações do setor financeiro já vêm sendo penalizadas pela leitura de um cenário mais restritivo e de maior inadimplência em 2023, que deve afetar a carteira dos bancos. Com essa questão específica dos Estados Unidos, o setor financeiro das bolsas no mundo todo acaba sofrendo a repercussão, e a gente também acaba sentindo", explica Abdelmalack.

No cenário doméstico, o IPCA acima do esperado em fevereiro foi lido pelo mercado como um dado que limita a possibilidade de antecipação dos cortes da Selic. Após a divulgação do dado, pela manhã, o Bank of America citou a chance de uma "pausa" na tendência de desinflação no País.

Os investidores também continuam em compasso de espera pelo anúncio do arcabouço fiscal, que pode ser apresentado na semana que vem, à véspera da reunião do Copom de março (dias 21 e 22). Durante a tarde, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, disse que apresentará a proposta ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva na próxima semana e que o mandatário terá a "palavra final" sobre o tema.

"No Brasil, nada é tão ruim que não possa ser pior, especialmente na parte fiscal. Está ficando difícil Haddad apresentar uma regra com controle de gastos que agrade à cúpula do PT e ao presidente Lula", diz o economista-chefe da Frente Corretora, Fabrizio Velloni, que vê na incerteza um vetor doméstico negativo para a Bolsa hoje. "Isso, em conjunto com o IPCA, ajuda a pressionar especialmente alguns segmentos do varejo."

Na ponta positiva do índice, o maior ganho foi de Hapvida (27,32%), que recuperou parte das perdas no mês. Em seguida, apareceram Embraer ON (5,67%), MRV ON (1,42%) e Locaweb ON (1,05%). O Ibovespa oscilou entre mínima de 103.201,41 pontos e máxima de 105.071,19 pontos. O giro financeiro atingiu R$ 29 bilhões.

Dólar


O dólar subiu mais de 1% no mercado doméstico de câmbio nesta sexta-feira, 10, e voltou a fechar acima de R$ 5,20. Dados mistos do relatório de emprego (payroll) nos EUA esfriaram um pouco as apostas em torno da possibilidade de que o Federal Reserve acelere o passo e anuncie neste mês uma alta da taxa de juros em 50 pontos-base - o que abriu espaço para uma baixa do dólar frente a pares fortes. Sinais de estresse no setor financeiro americano com o fechamento do Silicon Valley Bank (SVB) - o maior banco dos EUA a quebrar desde a crise financeira de 2008 - provocaram, contudo, deterioração dos ativos de risco que respingou em moedas emergentes.

Por aqui, o Ibovespa, já abalado pela divulgação do IPCA de fevereiro acima do esperado, acentuou as perdas à tarde com a degringolada das bolsa em Nova York, o que contribuiu para aumentar a pressão sobre o real. Em tal cenário, agentes correram para realizar lucros acumulados com a moeda brasileira e recompor posições defensivas, uma vez que o dólar apresentava queda de 1,12% na semana até ontem, movimento atribuído em grande parte ao otimismo com a expectativa pelo anúncio do novo arcabouço fiscal.

O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, fez pronunciamento hoje à tarde, mas para anunciar compensação da União aos Estados pelas perdas de arrecadação com mudança do ICMS. O ministro informou que apresentará a nova regra fiscal na próxima semana a Lula, a quem caberá "a palavra final". Pela manhã, o presidente disse que Haddad "é criativo" e vai "arrumar recursos" para o governo investir em infraestrutura.

Com sinal positivo desde a abertura dos negócios, o dólar encerrou a sessão em alta de 1,30%, cotado a R$ 5,2082 com máxima a R$ 5,2203, à tarde. A arrancada de hoje foi suficiente para anular as perdas de ontem e levou a divisa a terminar a semana com ganhos de 0,15%. No acumulado dos oito primeiros pregões de fevereiro, contudo, o dólar ainda recua (-0,32%).

"A moeda brasileira apresenta um dos piores desempenho frente ao dólar, em uma sessão marcada pela ansiedade em torno do setor bancário americano, incerteza sobre altas de juros com dados ambíguos do payroll e também desconforto com a inflação mais forte do que o esperado aqui no Brasil", diz CEO do Transferbank, Luiz Felipe Bazzo.

Divulgado pela manhã, o payroll mostrou criação de 311 mil vagas em fevereiro, acima da mediana (220 mil) e do teto (300 mil) de Projeções Broadcast. De outro lado, a taxa de desemprego subiu de 3,4% em janeiro para 3,6% no mês passado, ante previsão de estabilidade. Além disso, o salário hora subiu menos que o esperado na comparação mensal e anual.

"Os dados de salário e horas trabalhadas vieram um pouco mais baixos, o que se reflete na inflação. O mercado avalia que talvez o Fed não acelere o ritmo. Ainda assim, estamos vendo um mercado de trabalho muito forte e robusto", afirma o economista-chefe da RPS, Victor Candido, sobre o payroll.

Por aqui, o IPCA acelerou de 0,53% em janeiro para 0,84% em fevereiro, dentro do intervalo de Projeções Broadcast (de 0,67% a 0,89%), mas acima da mediana (0,78%). Embora já se esperasse aceleração do índice, analistas dizem que a composição e os núcleos mostram que não está em curso um processo de desinflação Isso reduz o espaço para que o Banco Central inicie um processo de corte da taxa Selic ainda no primeiro semestre.

Para o economista-chefe da Western Asset, Adauto Lima, a perspectiva de manutenção de diferencial de juros interno e externo ainda elevado estimula as operações de carry trade e, ao lado da melhora dos preços das commodities, abriria espaço para queda do dólar no mercado doméstico. De outro lado, o ambiente ainda de incertezas políticas e fiscais jogam contra a moeda brasileira.

"Sem um fato novo mais forte, o real fica volátil, oscilando dentro desse 'range' que estamos vendo entre R$ 5,00 e R$ 5,25. O que pode fazer a taxa de câmbio mudar de patamar é efetivamente uma melhora na percepção doméstica. Ou uma piora muito grande de percepção de risco global", afirma Lima, que não se diz otimista com o novo arcabouço fiscal gestado pelo Ministério da Fazenda. "Deve diminuir a possibilidade de uma deterioração rápida do fiscal, mas vai manter a incerteza sobre a convergência da dívida. O presidente diz que investimento não é gastos e que o Haddad se vire e seja criativo para arranjar dinheiro".

Juros


Após uma sequência de quatro quedas consecutivas, os juros futuros fecharam a sexta-feira, 10, em alta, num movimento de realização de lucros que pela manhã se limitava às taxas curtas com respaldo do IPCA acima do consenso. À tarde, contaminou toda a estrutura a termo, dada a piora na percepção de risco fiscal e externo. A ponta longa inicialmente cedia, alinhada ao comportamento dos rendimentos dos Treasuries, mas passou a avançar à tarde, com um noticiário farto para as contas públicas e aumento da aversão ao risco em Wall Street. No balanço da semana, porém, a curva perdeu inclinação, com as taxas longas cedendo bem mais do que as curtas.

A taxa do contrato de Depósito Interfinanceiro (DI) para janeiro de 2024 fechou em 13,16%, de 13,01% ontem no ajuste, e a do DI para janeiro de 2025 saiu de 12,21% para 12,38%. O DI para janeiro de 2027 encerrou com taxa de 12,65%, de 12,55%, e o DI para janeiro de 2029, com taxa de 13,06%, de 12,95%.

Na semana, que teve quatro dias consecutivos de alívio nos prêmios de risco, as taxas curtas cederam em torno de 20 pontos-base, menos do que as longas, que caíram 50 pontos. Num dia de aversão a risco no exterior e de redução de otimismo na seara fiscal, era provável haver uma correção na rota, mas que não comprometeu significativamente as apostas para o ciclo de afrouxamento monetário.

Segundo a BlueLine Asset, a curva a termo segue precificando chance de início de redução da taxa básica de 13,75% em maio, de 25 pontos-base, mas pouco menores do que ontem. A probabilidade passou de 40% para algo entre 25% e 30%. O orçamento total de alívio recuou para 245 pontos, de 250 pontos ontem. O IPCA de fevereiro, de 0,84%, superou a mediana das estimativas (0,78%) e ficou mais perto do teto de 0,89%, com preços de abertura que não agradaram.

"O IPCA de hoje mostra que esse espaço para corte de juros que o mercado está precificando não existe", afirmou o economista do Banco BV Carlos Lopes, que também não vê sentido numa antecipação de crise no mercado de crédito para justificar um alívio monetário. Ele lembra ainda que as expectativas de inflação estão desancoradas, o que ajuda a desautorizar o nível de otimismo da curva com relação ao ciclo de distensão monetária

Com isso, as taxas curtas já oscilavam em alta pela manhã, enquanto a ponta longa cedia acompanhando o ritmo de fechamento da curva americana. O payroll nos Estados Unidos trouxe criação de 311 mil vagas em fevereiro, mas o aumento nos salários veio abaixo do esperado, o que embaralhou um pouco as apostas para o encontro do Federal Reserve em março, com a expectativa de alta de 25 pontos-base voltando a ganhar fôlego. À tarde, contudo, os DIs longos passaram a subir com o aumento da aversão ao risco gerada pelo colapso do Silicon Valley Bank, o maior banco americano a quebrar desde a crise financeira de 2008, que também penalizou o câmbio.

Além do exterior, a percepção de risco fiscal piorou com uma série de notícias negativas no dia. Lopes, do Banco BV, disse que o acordo que o governo fechou com os Estados para compensar perdas de arrecadação com a mudança na base de cálculo do ICMS sobre bens essenciais durante o governo Bolsonaro pesou sobre os vencimentos longos, ainda que o valor de R$ 26,9 bilhões tenha vindo um pouco menor do que os Estados estavam reivindicando. "Mas não deixa de ser significativo. Ainda que seja uma compensação, é algo negativo com o mercado à espera do novo arcabouço fiscal", afirmou. A nova âncora será apresentada na próxima semana ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que dará a palavra final.

O reajuste nos valores da merenda escolar do ensino público a serem anunciados nesta sexta-feira pelo presidente Lula, que pode chegar a 39%, e a possibilidade de aumento de subsídio para faixa 2 do programa Minha Casa, Minha Vida, são outros fatores da cena fiscal que foram mal recebidos. 

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