BOLSA DE VALORES
Contra exterior, Ibovespa inicia semana em baixa de 1,04%, aos 100,9 mil
Dólar encerrou a sessão em queda de 0,52%, cotado a R$ 5,2430
O Ibovespa iniciou a semana como encerrou a última sessão da anterior, em baixa, desconectado nesta segunda-feira, 20, do sinal positivo do exterior, na Europa como nos Estados Unidos. O anúncio, no fim de semana, da aquisição do Credit Suisse pelo UBS trouxe algum alívio quanto à chance de disseminação de crise bancária, embora a questão permaneça como principal fator de risco no momento. Em Nova York, nesta segunda-feira, a negociação de papéis do First Republic Bank chegou a ser suspensa, com relato do The Wall Street Journal de que o JPMorgan está liderando negociações com outros grandes bancos, em novo esforço para estabilizar a instituição financeira.
No front doméstico, o investidores acompanham os desdobramentos em torno do novo arcabouço fiscal. A pedido do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, apresentou hoje "linhas gerais" da proposta aos chefes da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG). Após as reuniões, disse a jornalistas que dará a Lula um retorno sobre o que ouviu nos encontros.
A perspectiva de que o arcabouço fiscal leve ainda algum tempo para ser anunciado pelo governo, o que poderá atrasá-lo em relação à deliberação do Copom sobre a Selic na quarta-feira, contribuiu para manter os investidores na B3 na defensiva nesta largada de semana, em que o Federal Reserve também irá decidir sobre juros, no mesmo dia 22.
"A expectativa ainda é de que o Copom mantenha juros altos por mais tempo, olhando para 2024, que é o horizonte relevante para trazer a inflação à meta. Porém, uma nova variável veio, com essa crise nos bancos lá fora, e também o crédito caindo muito aqui no Brasil, com dificuldade para as empresas renegociarem", diz Piter Carvalho, economista-chefe da Valor Investimentos, acrescentando que "a estabilidade do sistema financeiro também é umas das premissas (do BC)". "Prioridade à estabilidade do sistema financeiro, até mais do que às metas (de inflação) como se vê nos BCs de fora, é fundamental para que a economia continue girando."
"Como resultado do aumento da oferta de crédito, a relação crédito/PIB aumentou sensivelmente nos últimos anos, principalmente a partir do final de 2020, quando os juros atingiram níveis mínimos históricos. O ponto negativo disto é que parece ter havido algum exagero nas concessões, o que é corroborado pelo aumento na inadimplência: diversos casos de atrasos de pagamentos e pedidos de RJ recuperação judicial vêm sendo noticiados ultimamente. Outro ponto negativo é que com o forte aumento dos juros, o refinanciamento de dívidas atualmente está proibitivo, o que pode acelerar os pedidos de RJ", aponta em relatório a Guide Investimentos.
"Uma 'parada abrupta' no crédito pode ser mais relevante atualmente que em 2014/15, dado que o crédito se tornou mais relevante. Além disso, a contração deve vir mais rápido. A deterioração do cenário econômico em 2014/15 foi gradual. O pedido de RJ da Americanas foi uma surpresa, assim como a intervenção em instituições como Portocred e BRK. Estes eventos estão levando os bancos a serem mais criteriosos na concessão de crédito e o mercado de capitais está vendo mais resgates que captação, reduzindo bastante o fôlego para novas operações", acrescenta a Guide.
Com o cenário doméstico e externo na mesma chave desafiadora, o Ibovespa inicia a penúltima semana do mês com poucas ações de primeira linha conseguindo escapar à nova correção. Das principais blue chips, Vale ON ainda mostra leve perda em março, de 0,10%, após ter fechado esta segunda-feira em alta de 0,82%. Petrobras ON e PN cedem, respectivamente, 10,47% e 9,15% no mês, tendo fechado hoje em baixa de 2,35% e 2,47%. Entre os grandes bancos, as perdas chegam a 7,91% (Itaú PN) ou mesmo 9,60% (Unit do Santander) no mês, com Bradesco ainda mostrando ganho de 0,31% em março, após encerrar hoje em baixa de 1,73%, na ponta negativa da sessão entre as maiores instituições financeiras.
Na ponta ganhadora do Ibovespa nesta segunda-feira, destaque para São Martinho (+4,03%), CSN Mineração (+1,52%), Cielo (+1,23%) e Bradespar (+0,89%). No lado oposto, Hapvida (-8,02%), JBS (-7,27%), Alpargatas (-6,96%) e Eztec (-6,69%).
Dólar
Após acumular alta de 1,19% na semana passada, o dólar encerrou a sessão desta segunda-feira, 20, em queda de 0,52%, cotado a R$ 5,2430 no mercado doméstico de câmbio. Segundo operadores, agentes aproveitaram o sinal predominante de baixa da moeda americana no exterior, em meio à diminuição dos temores de uma crise de crédito mais aguda nos Estados Unido e na Europa, para realizar lucros e ajustar posições. Por aqui, há certa cautela diante das negociações, em Brasília, em torno do novo arcabouço fiscal, com queda de braço entre o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, e a ala política do governo.
Lá fora, investidores digeriram hoje a compra do Credit Suisse pelo UBS, com amplo apoio do Banco Central suíço, e a ação orquestrada de bancos centrais desenvolvidos para prover liquidez em dólares, com a possibilidade de operações diárias de swap cambiais com o Federal Reserve. Embora ainda haja dúvidas sobre os desdobramentos do caso Credit Suisse e desconfiança em relação aos bancos médios nos EUA, cuja bola da vez parece ser o First Republic Bank, houve certa recuperação do apetite ao risco Uma corrente minoritária do mercado aposta que, diante do aperto das condições financeiras provocado pelos problemas no mercado de crédito, o Fed vai interromper o processo de alta dos Fed Funds na quarta-feira, 22.
Para o gerente de câmbio da Treviso Corretora, Reginaldo Galhardo, os negócios no mercado de câmbio foram claramente pautados pelo comportamento do dólar no exterior. "A ação dos BCs ajudou a dissipar parte da névoa, mas ainda existe muita incerteza no horizonte. O mercado vai olhar com lupa a situação dos bancos médios nos Estados Unidos e novas vítimas podem aparecer. A questão é saber se o Fed errou ao olhar apenas para emprego e inflação todo esse tempo, sem dar atenção à saúde do sistema financeiro", diz Galhardo.
Termômetro do desempenho do dólar frente a uma cesta de seis divisas fortes, o índice DXY operou em baixa ao longo do dia, furando os 103,300 pontos, com fortalecimento do euro e do iene. No Parlamento Europeu, a presidente do Banco Central Europeu (BCE), Christine Lagarde, como era de se esperar, disse que o sistema financeiro da zona do euro está sólido. E acrescentou que a estabilidade de preços segue sendo o que guia as decisões de política monetária.
Segundo a economista-chefe da Veedha Investimentos, Camila Abdelmalack, a fraqueza do DXY reflete, em parte, as mudanças nas apostas para a taxa terminal de juros nos EUA para uma faixa mais perto de 5% do que 6%. "Vemos alguma recomposição do real hoje, mas sem tanta força por conta da cautela com a apresentação do novo arcabouço. O risco fiscal continua sendo o grande empecilho para uma recuperação mais expressiva do real", afirma Abdelmalack.
Sob o chamado "fogo amigo" da ala política do governo, o ministro da Fazenda cumpriu determinação de Lula e visitou hoje os presidentes da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), para apresentar a proposta do novo arcabouço. Na saída de encontro com Pacheco, Haddad afirmou que a recepção das lideranças partidárias e dos presidentes da Câmara e do Senado "foi muito boa". O ministro garantiu que o anúncio do novo arcabouço será feito antes da visita presidencial à China, no dia 26.
Não se sabe, contudo, se o texto virá á público antes do desfecho da reunião do Copom, no início da noite de quarta-feira, 22. A aposta unânime é de manutenção da taxa Selic em 13,75% ao ano. As expectativas giram em torno do comunicado do colegiado, que pode, sob o impacto da decisão do Fed e, talvez, da proposta do novo arcabouço fiscal, trazer sinais sobre início de processo de corte da Selic ainda neste primeiro semestre.
Juros
Os juros futuros fecharam a segunda-feira com leve alta nos contratos de curto e médio prazos e viés de baixa no trecho longo, numa sessão mais fraca refletindo o compasso de espera pelos eventos no desenrolar dos próximos dias, em especial a decisão do Copom e a apresentação do novo arcabouço fiscal.
A sinalização de que a proposta não vai sair antes de quarta-feira causou uma certa frustração, mas não chegou a ter efeito propriamente negativo. A solução para o caso do Credit Suisse - vendido ao rival UBS - e a ação coordenada dos bancos centrais para assegurar liquidez ao sistema financeiro global é boa notícia e impulsionou o apetite ao risco lá fora, mas não teve grandes repercussões na curva local. A piora das medianas de IPCA no Boletim Focus pesou nos DIs curtos e os longos mostraram queda discreta, na contramão do avanço dos rendimentos dos Treasuries.
A taxa do contrato de Depósito Interfinanceiro (DI) para janeiro de 2024 encerrou a 13,01%, de 12,96% no ajuste de sexta-feira, e a do DI para janeiro de 2025, a 12,11%, de 12,06%. O DI para janeiro de 2027 projetava taxa de 12,46%, de 12,47%, e a do DI para janeiro de 2029 passou de 12,93% para 12,91%.
"A tendência é o mercado andar de lado até quarta-feira", avalia o economista da MAG Investimentos Felipe Rodrigo Oliveira, lembrando que naquele dia tem, ainda antes do Copom, reunião do Federal Reserve.
O mercado esperava começar a semana com sinais mais firmes sobre o novo arcabouço fiscal, mas o pedido do presidente Lula para que o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, conversasse com o Congresso antes do anúncio oficial provavelmente vai empurrar o anúncio para depois do Copom. O ministro cumpriu a agenda de apresentação para os líderes da Câmara e do Senado, além dos presidentes das duas casas. Segundo ele, a ideia é se reunir ainda hoje com o presidente para apresentar o que ouviu dos parlamentares, cuja reação, diz, teria sido muito boa.
Outro fator que parece estar segurando o avanço das etapas é uma decisão de possível anúncio simultâneo de um novo regramento sobre parcerias público privadas (PPPs) que, nas palavras de Haddad, vão alavancar investimentos. O ministro assegurou que o arcabouço fiscal será divulgado antes da viagem à China. "Não tem ninguém no escuro."
Apesar da impaciência do mercado, a preocupação de Lula em inserir os parlamentares nas discussões é válida na medida em que deles depende a tramitação do processo, que deve ser longo e com ajustes no texto inicial. Se a proposta realmente não for divulgada antes de quarta-feira, pode representar um fator a menos de pressão, sobretudo de dentro do PT, sobre o Copom por cortes imediatos da Selic.
Às vésperas da decisão, no Boletim Focus, as medianas de IPCA para 2024 (4,02% para 4,11%) e 2025 (3,80% para 3,90%) mostraram piora, ficando ainda mais desancoradas das metas que, para ambos, é de 3,00%. Para 2026, para o qual ainda não há meta definida, a mediana disparou de 3,79% para 4,00%.
"O descolamento das atuais metas de inflação, de 3,0%, e o contínuo ajuste altista das expectativas refletem não apenas as incertezas no campo fiscal, mas também uma antecipação a um possível aumento das metas de inflação para os próximos anos", afirma a economista da Tendências Luiza Benamor.
Para ela, tanto o quadro inflacionário ainda adverso e quanto as expectativas futuras desancoradas permanecem como limitações ao corte da Selic no curto prazo, embora a desaceleração da economia e o recente evento ligado a bancos no exterior, que deve levar os principais bancos centrais a subirem menos os juros, tragam argumentos na direção do afrouxamento.
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