POLÍTICA

Agenda bolsonarista na área de segurança derrota polícias, diz fórum

Por Redação com Fonte Segura 06/10/2022 - 15:21
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Policiais durante operação
Policiais durante operação

Os resultados da eleição no último domingo ampliaram a chamada bancada da segurança pública no Congresso Nacional, saindo de 28 deputados na atual legislatura para ao menos 38 membros a partir de 1º de janeiro de 2023. À primeira vista, se nos detivermos nos nomes dos eleitos, a eleição nos mostra que o bolsonarismo “colonizou” as candidaturas policiais e pode ter impacto significativo sobre a agenda sindical da categoria, que deverá permanecer estagnada nos próximos quatro anos. O foco dos policiais eleitos passou longe, com poucas exceções, das condições de vida e trabalho de tais profissionais.

A avaliação acima é do presidente Fórum Brasileiro de Segurança Pública, Renato Sérgio de Lima. Em texto publicado na newsllater nº 156 do portal Fonte Segura, Lima explica que a explicação, neste caso específico, não pode ser buscada dentro das polícias, mas surge como um reflexo de um processo maior no cerne das corporações, cujos líderes sindicais e de associações radicalizaram-se e atrelaram-se ao projeto bolsonarista de poder. 

"Com isso, o discurso predominante era o da agenda de Bolsonaro e não o das demandas da categoria. Vários líderes tradicionais buscaram ajustar seus discursos para se aproximarem do bolsonarismo e serem vistos como aliados fiéis".

Mesmo assim, continua Lima, algumas figuras bastante conhecidas do sindicalismo policial e que ocupavam posição de destaque como defensores do trabalho de diferentes carreiras policiais não tiveram seus mandatos renovados. "Um caso bastante emblemático é o do Subtenente Gonzaga (PSD/MG), que não se reelegeu apesar de todo o trabalho desenvolvido ao longo dos anos na Câmara dos Deputados em prol dos praças das Polícias Militares".

Mas não foi só ele, continua a avaliação. Do campo conservador, também não se reelegeram Delegado Waldir (UB/GO) e João Campos (Rep/GO), este último relator da proposta de Lei Orgânica das Polícias Civis, que saíram candidatos ao Senado por Goiás sem sucesso – dos nomes tradicionais da pauta corporativista no Congresso, apenas Capitão Augusto (PL/SP) foi reeleito e Alberto Fraga (PL/DF) foi eleito após quatro anos afastado.

Entre os não policiais, chama atenção que dentre os que tiveram destaque na discussão sobre a redução de danos do pacote anticrime, em 2019, Margarete Coelho (ex-coordenadora do Grupo de Trabalho que avaliou o pacote do então ministro Sergio Moro), também não conseguiu se reeleger, mesmo sendo uma das parlamentares mais atuantes da atual legislatura na construção de políticas de enfrentamento da violência contra a mulher e na revisão do Código de Processo Penal e no Código Eleitoral, que previa quarentena para policiais, juízes e membros do Ministério Público poderem se candidatar a cargos eletivos. 

"E o caso dela chama ainda mais atenção pelo fato de Coelho formar o grupo da máxima confiança do Ministro da Casa Civil, Ciro Nogueira (PP/PI), e do Presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PL/AL). Mas isso não impediu que sua candidatura tenha sido abatida por ela ter feito um mandato pautado em diálogos e em políticas públicas quando o ambiente de guerra de narrativas parece vencer".

Dito de outra forma, fica evidente a perda de espaço do campo conservador não radicalizado nas eleições. "Candidatos que não professaram sua fé irrestrita na liderança e na pauta de Jair Bolsonaro foram sendo ejetados. A segurança pública ficou circunscrita a temas externos aos problemas das corporações e, ao menos no caso de São Paulo, há uma tendência adicional que reforça esse movimento: o estado elegeu 7 policiais, sendo 5 delegados e 2 oficiais, sendo que um dos delegados tem a pauta do meio ambiente e defesa dos animais como foco. Outro foi eleito na chave do movimento armamentista e não difere do perfil mais amplo desse grupo. O restante, três delegados e um oficial da PM, são versões repaginadas para redes sociais de um fenômeno muito antigo, que é o da espetacularização da atividade policial, que nos anos 1980 teve nos programas de Gil Gomes e Afanásio Jazadi seus momentos de glória. O meio de transmissão mudou, mas o fenômeno é o mesmo".

A pauta da Comissão de Segurança Pública e Combate ao Crime Organizado, por exemplo, só deve avançar em temas corporativistas se as polícias se entenderem entre si. A exemplo do que ocorreu desde 2019, o governo vai manter o discurso de que apoia as polícias. Mas não há dúvida de que o foco será a agenda bolsonarista de armas, excludente de ilicitude, redução da maioridade penal e afins. Ao que tudo indica, propostas sobre as condições de vida e trabalho dos policiais perderão tração após os resultados de domingo, inclusive nas assembleias estaduais, sendo substituída pela agenda da “arma, ‘liberdade’ e luta contra o mal”.

O presidente d Forum encerra o texto afirmando que "há, em suma, um equívoco tático dos policiais que confunde o cotidiano da atividade policial com projetos políticos de poder. O foco na profissionalização cede espaço para o espetáculo e a profissão cega de fé. Por essa razão, é necessário que a sociedade perceba que não deve dar foco excessivo nos aspectos internos e de gestão das forças policiais, mas valorizar reestruturação das carreiras e propostas efetivas de mudança da área. É preciso tratar segurança como um direito fundamental".


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