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Adolescentes palestinos enfrentam policiais israelenses em Jerusalém

Por O Globo 18/11/2014 - 09:11

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Os colegas na escola o chamam de “o Pinguim”, por causa do seu aspecto físico. Ele tem 16 anos e se veste com o uniforme de guerreiro palestino, calça jeans skinny, camiseta de futebol, tênis de marca e uma balaclava. Exceto quando tira o gorro, queixando-se de coceira.

O Pinguim é a cara do levante palestino em Jerusalém, em que o rancor e a violência tomaram conta da cidade sagrada, nos últimos quatro meses. Ele é a vítima ou o causador de problemas, dependendo de qual parte de Jerusalém você está, do lado árabe ou judeu.

O primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, disse na semana passada que a violência está sendo propulsionada por “radicais islâmicos” e políticos palestinos. Mas os manifestantes de rua são em sua maioria adolescentes, como o Pinguim, que não parece estar recebendo ordens de ninguém.

No posto de controle militar de Jerusalém Oriental, no campo de refugiados Shuafat, Pinguim e seus amigos arremessaram na semana passada pedaços de cimento contra os soldados israelenses, que revidaram com gás lacrimogêneo e balas de borracha.

A atmosfera parece caótica e roteirizada, com novos fotógrafos registrando as cenas. Mas quando chega a hora do jantar, Pinguim coloca suas pedras no chão e vai para casa. Ele tem lição de casa para fazer.

A polícia israelense e oficiais da Inteligência dizem que os protestos em Jerusalém não envolvem dezenas de milhares de adolescentes, mas centenas, aqui e ali, em cinco ou seis bairros palestinos da cidade.

Porém, mais de mil palestinos foram detidos em tumultos em Jerusalém Oriental desde o fim da guerra de Gaza em agosto, quase todos eles jovens, de acordo com a polícia israelense.

Dos mais de 300 acusados de atirar pedras, fogos de artifício e garrafas de gasolina na polícia, 188, ou seja, mais de 60%, são menores de 18 anos.

A idade dos manifestantes levaram alguns analistas de segurança a descrever a revolta em Jerusalém como uma “Intifada infantil”.

O Comissário de polícia de Israel, Yohanan Danino, estremeceu quando perguntado se há uma intifada surgindo em Jerusalém, como no começo de 2000 que deixou milhares mortos. “

— Não é uma intifada — disse Danino. Mas ele concordou que seus antagonistas são muito jovens, como nunca foram antes.

— Estamos começando a usar informações de Inteligência para chegar àqueles que estão perturbando a paz, mas na verdade, no final, eles estão enviando crianças pequenas de 12, 13 anos de idade — disse Danino. — Eles não são jovens, e sim crianças, e com as crianças nós realmente não podemos fazer nada.

Não são todos adolescentes, é claro. Tem adultos palestinos lançando uma em série de ataques mortais com facas ou veículos contra israelenses em Jerusalém, como ocorreu nas últimas semanas. Mas as autoridades israelenses os descrevem como “terroristas solitários.”

O sequestro e assassinato de três adolescentes israelenses por agentes do movimento militante Hamas na Cisjordânia, em junho, foi seguida pelo assassinato de um palestino de 17 anos chamado Mohammad Abu Khieder, que foi queimado vivo por extremistas judeus em Jerusalém.

A mais recente vítima do lado palestino, Mahmoud é Saber, de 11 anos, foi gravemente ferido no rosto quinta-feira de manhã, com uma bala de esponja disparada por um membro das forças de segurança israelenses.

 

PROTESTOS NAS HORAS DE FOLGA

A maioria das revoltas ocorre entre 07:30 e 09 e entre 16 e 18 horas, horário que os estudantes do ensino médio estão a caminho ou voltando da escola, segundo a polícia israelense.

— Eles vêm com seus livros — disse o porta-voz da polícia de Israel, Micky Rosenfeld. — Estamos tentando falar com seus pais: por favor, não deixe o seu filho ser fichado pela polícia. Ele não vai entrar na faculdade. Não vai conseguir um emprego.

O prefeito de Jerusalém, Nir Barkat, se reuniu na semana passada com diretores de escolas em Jerusalém Oriental. Ele propôs gastar mais dinheiro para estender os horários das aulas, como um antídoto para os protestos.

— São crianças e jovens, que estão entendiadas, fora da escola, socialmente desfavorecidos e vivem em péssimas condições econômicas. São eles que se juntam a esses protestos — disse Barakat Riman, co-diretor do Centro de Pesquisa e Informação Israel- Palestina.

Os palestinos representam mais de um terço da população em Jerusalém, mas recebem menos serviços municipais que seus vizinhos judeus.

Netanyahu, de acordo com o presidente da Autoridade Palestina, Mahmoud Abbas, incita a violência. No entanto, muitos dos jovens que atiram pedras disseram em entrevistas que eles acham Abbas um velho tonto. Eles não pensam muito em seu partido político, o Fatah, e menos ainda no Hamas.

— Essas crianças não ouvem ninguém, nem seus pais, políticos, ninguém — disse Issa Salem Issa, uma autoridade reconhecida na sociedade palestina.

Quando eles fazer uma pausa na “brincadeira” de jogar pedras, Pinguim e seus amigos engolem uma bebida energética de marca israelense para ganhar fôlego. Ele e outros jovens entrevistados para este artigo se recusaram a dar seus nomes completos por medo de serem detidos por autoridades.

Rosenfeld, porta-voz da polícia de Israel, disse que os adolescentes aprenderam a não ser identificados.

— Eles agora cobrem seus tênis com sacos plásticos, por isso não podemos identificar a marca, e eles ficam trocando de camisetas — disse Rosenfeld. —

Perguntado por que eles estão em conflito com os israelenses, os adolescentes gritam que eles estão defendendo a mesquita Al-Aqsa, cenário de confrontos frequentes, impulsionada por ativistas judeus que querem rezar no local, conhecido pelos judeus como o Monte do Templo e pelos muçulmanos como o esplanada das mesquitas. Muçulmanos rejeitam qualquer mudança em seus direitos no santuário.

— É uma guerra — disse Hakim, de 16 anos. — Eles só não declararam ainda.

Hakim e seus amigos disseram que não podem viajar para qualquer lugar em Jerusalém como shoppings, cinemas, exceto al-Aqsa, onde, porém, restrições de idade foram aplicadas recentemente por razões de segurança.

Questionados se eles tinham algum amigo judeu, eles responderam em coro: “não, não, não.”

— Os judeus querem nos matar — disse um deles. — Os judeus querem destruir a mesquita — disse outro.

Autoridades israelenses dizem que os jovens são incitados pela mídia palestina e por Abbas, que declarou no mês passado que o fechamento de al-Aqsa por israelenses foi “uma declaração de guerra.”

Netanyahu anunciou na semana passada que seu governo vai tomar medidas mais duras para dissuadir os jovens de atirar pedras, garrafas de gasolina e guloseimas, incluindo multas aos pais cujos menores estiverem envolvidos nos distúrbios. Após o encontro com o rei Abdullah II da Jordânia, que serve como guardião dos lugares sagrados para os muçulmanos em Jerusalém, Netanyahu também concordou para acalmar as tensões aliviar as restrições, incluindo nos postos de controle ao redor de Jerusalém Oriental.

 


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