Análise: Índia tem equipamentos mais eficientes do que caças Tejas Mk1A a oferecer ao Brasil
O Brasil está cogitando um acordo com a Índia para a aquisição de caças Tejas Mk1A, caso a Força Aérea Indiana selecione o avião cargueiro KC-390, da Embraer, para sua licitação de aeronaves de transporte médio. A medida faz parte dos planos da Força Aérea Brasileira para modernização da frota.
Em entrevista à Sputnik Brasil, especialistas em defesa destacam que benefícios a aquisição dos caças Tejas Mk1A trariam para a frota brasileira.
Que benefícios a aquisição do Tejas Mk1A traz?
Fabrício Ávila, doutor em ciência política pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e presidente do Instituto Sul-Americano de Política e Estratégia (ISAPE), afirma que o Brasil tem necessidade de substituir 21 caças AMX: 10 das versões AMX-T (A-1A/B) e 11 da versão AMX-A-1M.
"São caças subsônicos e oriundos do consórcio AMX Internacional, que tinha a empresa Embraer junto das italianas Aermacchi e Alenia. Tinha um alcance curto, mas desempenhava bem sua missão de apoio para as tropas mecanizadas do Exército Brasileiro. O Super Tucano pode realizar essa missão, mas o AMX é mais rápido e, em caso de conflito, o tempo de cumprimento das missões é essencial", destaca o especialista.
Ele explica que "o HAL Tejas Mk1 possui características muito parecidas com o AMX como o raio de combate, dimensões e capacidade de carga".
"Os projetos dos caças são da década de 1980. Porém, a velocidade do Tejas é o dobro do AMX e daria uma manobrabilidade e poder de fogo muito maior para apoio das tropas em terra."
Ávila enfatiza que o Brasil tem 43 caças F-5EM que necessitam ser substituídos porque excederam a sua vida útil em muitos anos.
"Quando isso acontece com o armamento, ele se torna mais perigoso para os seus tripulantes que para os inimigos. Os recentes acidentes com esse modelo provam que a necessidade de substituição é urgente. Mesmo os programas de modernização de equipamentos não conseguem substituir estruturas e a fadiga de material", explica.
Ele avalia que o caça Gripen-E é moderno e atenderá bem às necessidades brasileiras, mas a demora nos testes de comissionamento pode criar uma lacuna na defesa brasileira. Ademais, segundo Ávila, a entrada da Suécia na Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) elevou o risco de embargo ao projeto.
"Neste sentido, valeria a pena a diversificação de fornecedores para nossa frota aérea e a Índia pode ser uma retomada dos projetos em parceria, como foi o caso do Brasil com a Itália no AMX. Contudo, existe uma questão importante que é a categoria das aeronaves. O Gripen equivale na sua categoria e função ao F-5EM Tiger II. O HAL Tejas estaria no nível do AMX, mas pode ampliar suas funções de combate."
Para Ávila, é importante para o Brasil retomar os trabalhos em conjunto com outros países. Ele ressalta que o Brasil tem "tecnologia própria para o desenvolvimento de projetos, mas as parcerias diminuem custos e possibilitam a troca de tecnologias".
"O KC-390 está sendo uma porta de entrada do Brasil novamente nesse mercado. Em termos gerais, a aquisição do caça sueco Gripen foi um primeiro passo nessa direção que pode ser consolidada com uma parceria com a Índia. Os indianos possuem essa característica de parcerias com produção local e trocas de tecnologias. A Força Aérea Brasileira necessita substituir os caças AMX de apoio e o HAL Tejas pode ser uma viabilidade. As parcerias militares são uma necessidade e a diversificação de meios se tornou um componente importante da estratégia dos países dentro dessa conjuntura da multipolaridade em desequilíbrio no sistema internacional."
Modernização da frota é urgente
Pedro Paulo Rezende, especialista em assuntos militares, frisa que o Brasil necessita com urgência de aviões plenamente operacionais para complementar a Força Aérea Brasileira.
"No momento nós temos apenas 15 caças F-5EM voando, disponíveis, nós já chegamos a mais de 50, só para ter uma ideia. Parte da frota, inclusive, desses 15 tem problemas de restrição estrutural. Então, na verdade, nós temos 10 caças operacionais, a gente poderia somar em total mais dois AMX que devem ser descartados no ano que vem porque não tem mais pacote para a manutenção do motor. Ou seja, nós temos 17 aviões de combate para cuidar de toda a extensão territorial brasileira."
Ele acrescenta que o Brasil tem oito Grippen do modelo E, que estão em Anápolis, "mas que não podem disparar nada, por enquanto, nem míssil, nem canhão".
"E essa capacidade só vai ser incluída no projeto no ano que vem, quando tem o IOC, Initial Operational Capability. Ou seja, nós precisamos, com urgência, de um avião pronto, que possa ser adotado pela Força Aérea em um prazo de até no máximo dois anos", afirma.
Ele também aponta que o projeto de aquisição do Gripen-E está muito atrasado, por questões financeiras e técnicas.
"O avião passa por uma série de revisões e isso obviamente está atrasando a entrega, e a FAB não tem disponibilizado verba suficiente para a continuidade do projeto dentro do planejado."
Rezende se mostra cético quanto à aquisição do Tejas, apontando o fato de ser um avião que ainda está em desenvolvimento, ainda em fase experimental. Segundo ele, a principal vantagem da aquisição do Tejas seria a abertura do mercado indiano para o KC-390.
"O maior benefício se a gente comprar esses Tejas estaria na possibilidade de vender os KC-390 para a Índia. O KC-390 é o nosso segundo maior projeto estratégico, o primeiro são os submarinos nucleares."
Marcos José Barbieri Ferreira, economista e especialista em indústria aeroespacial e defesa da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), aponta que há necessidade de o Brasil ter uma frota de aviões de caça adequados para substituir não apenas os aviões F-5, mas também os aviões AMX, que já estão no final da vida útil.
"O Brasil é um país continental, um país com uma quantidade grande de recursos humanos, vidas, recursos naturais, é dos países mais estratégicos no mundo, o maior produtor de alimentos, um dos grandes produtores de energia. Então o Brasil precisa ter uma capacidade de defesa adequada, muito superior ao que nós temos hoje, a nossa capacidade de defesa hoje ainda está muito aquém das necessidades do Brasil e da posição que o Brasil ocupa no mundo", afirma.
Nesse contexto, ele ressalta que o Brasil precisa não apenas de aviões de defesa de alta qualidade, mas também de uma quantidade bastante significativa.
"Alguma coisa em torno de, pelo menos, 100 aeronaves é o que seria indicado como necessário. Mesmo no projeto Gripen, a própria Força Aérea Brasileira colocou no início necessidade que fossem três lotes de 36 aeronaves, isto é, 108 aeronaves para termos um mínimo de capacidade de defesa adequada às nossas necessidades", ressalta.
Acordo de troca entre Brasil e Índia é especulação
Com relação ao Tejas, Ferreira aponta que existe uma negociação da Embraer e do governo brasileiro com a Índia para a venda dos aviões KC-390 para a Força Aérea Indiana e há boa possibilidade de a aeronave ser escolhida. Entretanto, ele afirma que "a contrapartida em relação ao Tejas não passa de uma especulação".
"Isso não está colocado em nenhum documento, não está colocado em nenhuma fala oficial, é apenas uma especulação. E diria mais, não faz o menor sentido. O Tejas é um caça que apresenta algumas limitações. Primeiro, é uma aeronave que vem sendo desenvolvida pela Índia, enfrentou vários percalços no desenvolvimento dela, é uma aeronave tecnologicamente e do ponto de vista operacional bem inferior ao Gripen."
Ele afirma ainda que o Tejas, assim como o Gripen, usa uma turbina da General Electric (GE), só que inferior, de modelo 404, enquanto o Gripen opera com uma turbina de 414, mais potente.
"O Tejas também utiliza a aviônica israelense, assim como o Gripen [...] a diferença é que apesar de ser israelense a aviônica do Gripen é muito mais sofisticada e foi [mais] desenvolvida no Brasil. Então não faz o menor sentido para o Brasil a aquisição do Tejas. Eu acredito que, caso o Brasil tenha interesse em fazer uma contraparte em relação à Índia, a Índia tem outros equipamentos militares que possam ser adquiridos pelas Forças Armadas brasileiras de maneira muito mais eficiente."
Por Sputinik Brasil