Conteúdo do impresso Edição 1282

JOGO DO PODER

Candidato ao baixo clero, Arthur Lira corre para Lula e teme investigações

Presidente da Câmara vai perdendo poderes enquanto é cercado pelo STF
Por ODILON RIOS 07/09/2024 - 06:00

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RICARDO STUCKERT/PR
Arthur Lira precisa garantir vaga em ministério de Lula como forma de manter seu poderio político em Alagoas
Arthur Lira precisa garantir vaga em ministério de Lula como forma de manter seu poderio político em Alagoas

Quando Arthur Lira cobrava respeito aos maceioenses que o vaiavam no dia 10 de maio, na orla lagunar da capital alagoana, ele tentava se impor como o todo-poderoso presidente da Câmara, cargo que passou a ser associado à sobrevivência do presidente da República. Furioso, gritava e sacudia as mãos, tratando a reação popular como um gesto de ingratidão.

“Eu duvido que um morador que vai ser atendido por essas casas esteja vaiando hoje. Isso é uma falta de respeito”, disse. Estava ao lado do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que entregava 914 unidades habitacionais do Minha Casa Minha Vida. Lula saiu em defesa do líder do Centrão.

“A gente precisa apenas aprender a respeitar quando o ato é institucional […] porque senão fica difícil para um presidente da República viajar para inaugurar coisa, porque as pessoas que vêm aqui são convidadas por nós e ninguém leva ninguém da sua casa para ser vaiado, para ser maltratado. É apenas uma questão de comportamento que me incomoda muito”, disse.

Vaiado duas vezes – a primeira em São José da Tapera um dia antes, em 9 de maio – Lira tinha tratamento diferente em Brasília. Estava no auge: era dono de 60% do orçamento da Prefeitura de Maceió, distribuiu indicados na máquina liderada por JHC, se mexia para indicar o vice do prefeito, tinha o comando das representações locais de estatais como a Codevasf, CBTU, DNOCS.

À medida que o tempo passou, foi encolhendo. Não tem mais a Secretaria Municipal de Saúde; não emplacou o vice de JHC; não conseguiu sequer encaixar um nome seu como vice do pai Benedito de Lira, na Barra de São Miguel. O vereador de Maceió e futuro presidente da Câmara, Marcelo Palmeira, que não se filiou ao PP e está no PL, ganhou protagonismo na cidade.

Agosto chegou, para desgosto de Arthur Lira. No dia 13, o ministro do Supremo Tribunal Federal Flávio Dino encaminhou pedido de explicações, em 10 dias, ao presidente da Câmara sobre o porquê de não instalar a CPI dos Planos de Saúde, cobrada pelos deputados federais; dois dias depois, o STF manteve a suspensão da execução das emendas impositivas, apresentadas pelo Congresso. E no dia 21 de agosto Flávio Dino encaminhou à Procuradoria Geral da República uma lista de 21 processos, segundo a Revista Piauí, envolvendo possíveis irregularidades na execução das emendas do orçamento secreto. Entre elas, a compra superfaturada dos kits de robótica em Alagoas, atingindo Luciano Cavalcante, o mais próximo dos assessores do deputado.

No auge da glória, Arthur Lira conseguiu um generoso gavetaço do ministro Gilmar Mendes, que arquivou as investigações dos kits de robótica. Só que os tempos mudaram. A cinco meses de encerrar seu mandato na presidência da Câmara, Lira sente que perdeu muitos anéis. Então, mexe os pauzinhos para não perder também os dedos. Garantiu com o presidente Lula uma vaga ministerial logo quando chegar o topo do poder. Até quarta-feira, 4, buscava retirar seu candidato preferido à sucessão na Câmara, Elmar Nascimento (União-BA), trocando por Hugo Motta (PB), mais agradável aos governistas.

Os governistas resistem em aceitar Elmar. Hugo Motta é do Republicanos, que já ocupa o Ministério de Portos e Aeroportos. Pode-se considerar essa mudança de rumos como uma nova derrota de Arthur Lira. Ainda em agosto, mandou espalhar para a imprensa amiga que decidiria – e já – seu nome para a futura presidência da Câmara. A estratégia desabou. E Elmar, até então na cabeça da lista, vai sendo escanteado.

É incerto saber o que o tempo reserva a Arthur Lira. Se as investigações dos kits de robótica avançarem, o próprio deputado sabe que será o alvo. Podem não render nada, mas daqui a dois anos há eleições para o Senado e ele quer uma das vagas. Renan Calheiros disputa a reeleição e é tido como garantido por antecipação, em Brasília. Lira? Nem tanto. Terá de gastar mais e contar com a paga dos muitos acordos que fechou agora. E convivendo com o fantasma da dúvida.


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