ANÁLISE
Presidente Lula já não é mais reconhecido como o ‘guerreiro’
Cientista social diz que governo precisa de ações chegando ao ‘chão do Brasil’
Mudanças na Secretaria de Comunicação e queda na popularidade do presidente Lula (PT) até no Nordeste – região que ajudou a definir as eleições – levam o governo a tentar entender o porquê, mesmo com as realizações da administração, mais e mais pessoas rejeitam Lula no Palácio do Planalto.
Para a cientista social Ana Cláudia Laurindo, está presente nas ruas o sentimento de que “Lula já não é reconhecido como o guerreiro que ajudou a eleger”. E o país – cada vez mais – tende a encontrar na direita “a saída para a extrema direita”.
Laurindo diz que o governo tinha consciência do tamanho do gabinete do ódio e toda a maquinaria a ser usada por ele para desqualificar a gestão federal. Também explica: não foram poucas as matérias e as investigações realizadas pela mídia – inclusive a tradicional – mostrando que este gabinete do ódio é financiado por empresários, tem relações diretas com o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e apostou em saídas autoritárias para o país.
“Não cabe apenas dizer que o Governo Lula é vítima da ação do gabinete do ódio porque ele já existia quando Lula estava preso. Se observarmos o quebra-quebra em Brasília no 8 de janeiro de 2022 e aqueles que acamparam nas portas dos quartéis meses antes, e sem serem importunados, apesar de atrapalharem o direito de ir e vir do cidadão, veremos que os apoiadores do golpe agiam pelas redes sociais de forma coordenada, precisa. Ou seja: eles sabiam o que queriam: a volta de Bolsonaro, nesta época nos Estados Unidos, ao poder. Tivemos uma eleição, Lula foi eleito, estamos no terceiro ano do governo. Portanto, creditar a impopularidade apenas à ação deste gabinete não é um conceito correto”, analisa.
“O momento político mundial não favorece governos sem perfis definidos e que não assumem pautas, como se desenvolve o Governo Lula neste mandato. Apesar de o povo brasileiro ter sido engolido pelo cotidiano que o coloca cada vez mais distante do conhecimento político e econômico por conta das interações midiáticas através das redes sociais, está experimentando uma ilusão de participação no cenário político por reproduzir as mensagens que considera mais convincentes. E existe o discurso do ódio”, afirma Laurindo.
E continua: “Nestes espaços os melhoramentos econômicos, as grandes apostas do governo, não entram. E o que fica? A revolta segmentada de grupos, que se compreendem afetados pelas políticas de governo. Um exemplo bastante recente: os familiares de diabéticos tipo 1 que, independente do acesso à cesta básica ser facilitado pela diminuição e ausência de imposto sobre os itens, passam a odiar o presidente pelo veto ao projeto de lei que tornava DM1 deficiência, incentivados por perfis contrários ao governo”.
A qualidade do governo também é medida pelos ministérios. E existe a consciência de que parte deles foi entregue a lideranças consideradas inimigas da sociedade, como o presidente da Câmara Arthur Lira (PP). “E ainda assim isso não garante o apoio do Centrão, como se observa nas votações do Congresso. Nem com magia isso pode ser considerado uma atitude boa ou razoável”, explica a cientista social.
Para ela, basta comparar com o Governo Bolsonaro, contrário à reforma agrária. Mas a atual gestão manteve lideranças do Incra, em alguns lugares do Brasil, que são contrárias a uma justa distribuição de terras.
“Então, temos vários elementos: queda de popularidade, um governo sem perfil definido, navegando à direita e fortalecendo o avanço do liberalismo”, conta.
“Chegamos a um ponto de o Governo Lula onde receber e repercutir mensagens da Secom só ocorre em duas ocasiões: ser fã incondicional ou acrítico ou ter consciência da necessidade de manter o nome do presidente em alta para não facilitar o monopólio das redes sociais pela extrema direita. Será que não merecíamos um pouco mais de razões? Creio que sim. O Governo Lula subestima o povo. Não se trata apenas de boas propagandas, mas de ações que cheguem ao chão do Brasil, com força de mobilização, mesmo com a ação do gabinete do ódio. Sem batalha real, como ter vitória? A nação já não reconhece o Governo Lula como ‘guerreiro’ que ela ajudou a eleger. A negociação a qualquer custo com lideranças políticas carreiristas é uma das piores propagandas do governo”, analisa.
“Um dos erros da comunicação foi manter o grosso do investimento na mídia tradicional, burguesa e viciada e eleger dois ou três perfis ditos independentes para patrocinar, como resposta ao apoio massivo que recebeu das pequenas mídias. Neste ponto, o Governo Lula já perdeu para Bolsonaro, que investiu bastante na chamada ‘mídia nova’”, diz.
“Lula seguirá lutando pelo milagre e o Brasil tende a encontrar na direita a saída para o fascismo da extrema direita”, finaliza.