A CASA DAS QUATRO MARIAS
Pais do Rio comemoram avanços na adoção de três meninas alagoanas
Renata Darzi e Pedro Bruno adotaram as crianças no interior do estado
Alagoas é destaque por suas praias deslumbrantes e tantas outras belezas naturais. A história, a cultura, a culinária inigualável, o artesanato e a hospitalidade de sua gente, agregam valores à terra que viu nascer Graciliano Ramos, Djavan, Nise da Silveira, Pontes de Miranda e tantos outros filhos ilustres.
Porém, nos últimos dias os holofotes foram voltados para a família de Renata Darzi e Pedro Bruno. Ao divulgar, na semana passada, um vídeo de dezembro de 2024, quando saíram do Rio de Janeiro para o interior alagoano buscar suas Marias em um abrigo no município de Teotônio Vilela, o assunto adoção veio à tona e a história virou notícia nacional.
“Uma família incomum. Mãe de três Marias via adoção e uma atípica”. É assim que a empresária e influencer Renata Darzi, 39, se apresenta em sua rede social, que conta com mais de 480 mil seguidores.
Em poucos meses de convivência, Renata comemora avanços no lidar com suas meninas que têm fama de fofas e carismáticas. As filhas, Maria Fernanda, 7, Maria Cecília, 5, e Maria Valentina, 4, se juntaram a Maria Luísa, 4, filha biológica do casal e que tem paralisia cerebral.
Pedro Bruno, advogado, 38 anos, pai das Marias, desde o início é parceiro. Ensina e aprende com elas.
Renata viu que na adoção o processo de vínculo é intenso e apesar de poucos meses no mesmo teto, já viveram tantas primeiras vezes, tantas coisas difíceis, tantas provações em relação a esse vínculo e a esse amor que parece que são anos de convivência.
E comemora cada avanço, cada descoberta. Garante que muita coisa mudou, principalmente em relação a elas. Hoje em dia as Marias já entenderam que não vão ficar sem comida, sabem que não vão voltar para o abrigo, já entenderam quem é vó, vô, quem é tia, tios do balé.
Pequenos detalhes que significam muito. Antes, elas não conseguiam entender quem eram as pessoas da família.
A mãe de quatro meninas confessa que o casal sabia que elas eram suas filhas, mas em relação ao vínculo e sentimento que têm por elas hoje é muito maior e muito mais forte do que era quando elas chegaram.
E desmistifica termos e valores. “A gente tem essa tendência a relacionar adoção a um ato nobre, a pessoas, seres iluminados e bondosos e tudo mais, mas na verdade a adoção nada mais é do que a construção de uma família e uma forma de fazer isso e pelo casal, quem quer adotar, quem toma essa iniciativa, quem quer ter filho. Então, eu não acho que seja um ato nobre, eu acho que é um ato racional, né?”, diz Renata.
E vai além: “a gente quer ter uma família grande e a gente escolheu essa via para formá-la, porque senão a gente acaba também colocando um sentimento, uma obrigação de gratidão eterna a esses pais, assim, um peso na criança de que ela tem que ser perfeita, de que ela tem que ser é o ato de que esses pais salvaram a vida delas e não foi, eu digo que a melhor coisa do mundo é a gente mudar a nossa vida”, filosofa.
Outro ponto forte que a mãe destaca é que no primeiro momento de aproximação perceberam que elas eram meninas muito unidas, que se davam muito bem e que a mais velha era o porto seguro das mais novas.
Eram meninas carinhosas e que não fazia sentido separar. “A gente daria conta de mais uma e de fato foi a melhor coisa que a gente fez. Elas são muito unidas e é uma irmandade muito bonita e diria que é o tipo de relação de irmã que eu nunca tive e sempre quis ter”.
A MAIS VELHA É UM ABRIGO PARA AS MAIS NOVAS
A decisão assertiva se contradiz com a ideia inicial do casal. De princípio, o perfil para adoção era de duas crianças até cinco anos.
“A gente tinha esse mesmo estereótipo de que crianças mais velhas seriam as mais difíceis e que seria uma adoção muito complicada. Então, a gente limitou a idade de cinco anos e confesso que quando as conheci soube que tinha a mais velha, por várias vezes pensando na minha cabeça, putz, se não tivesse a mais velha sem conhecê-la, né, ia ser muito mais fácil essa decisão e tudo mais. E quando eu conheci, hoje eu posso dizer que a mais velha ela é primeiro um abrigo assim para as duas mais novas”.
De fato, como não amar. E Renata abre o coração de mãe ao dizer que Maria Fernanda foi a pessoa que talvez tenha segurado muitas barras das mais novas e passado muito amor, porque são crianças muito amorosas.
“Ela é um laço que une todo mundo e ela é uma criança extremamente amorosa e carinhosa e foi a primeira que entendeu sobre o conceito família. Foi a primeira a chamar de mãe. Enfim, é uma criança que tá muito longe desse estereótipo que eu também tinha na minha cabeça e que a gente ouve a vida toda”.
Renata fala da parceria com o marido Pedro. “Antes da gente engravidar, a gente já conversava sobre a adoção, sempre foi uma vontade minha. Eu acho que eu acabei colocando essa possibilidade na cabeça do Pedro e depois que a Malu nasceu, nossa filha biológica, ela nasceu muito prematura, ficou quase um ano na UTI, a gente passou por muitas internações, o início de vida é muito difícil e a gente estava num momento tão turbulento que era inviável pensar em engravidar naquele momento, não me passava pela cabeça, não conseguiria me ver naquela situação grávida”.
E aí, como era uma ideia e já falava sobre, a dupla resolveu entrar na fila de adoção porque vai demorar uns 5 anos, daí vai ter tempo suficiente de pensar se é isso mesmo.
Mas, depois de dois anos e meio uma pessoa comentou que existiam três Marias e que elas eram muito fofas e estavam em um abrigo no interior de Alagoas.
“A gente se interessou em conhecer esse lugar e a gente acabou se apaixonando por elas. E aí abriu essa sessão de adotar mais de duas crianças”.
ADOÇÃO COM LEVEZA E INCERTEZAS
Renata diz que o casal fala sobre adoção com leveza e também com as incertezas. E relembra que viveram uma maternidade diferente, com a Malu, que tem diagnóstico de paralisia cerebral por prematuridade, e acha que ela ensinou que existem diversas formas de se construir uma família, de ser feliz, que o diferente às vezes assusta, mas na verdade, que às vezes, o medo é pior do que de fato o que acontece depois.
E esse treinamento da Maria Luísa de força, de resiliência por tudo que passaram, e de entender que nem tudo que as pessoas falam, os preconceitos que se ouve, nem sempre vai se concretizar.
“Ouvi a vida toda que uma criança com deficiência era a pior coisa do mundo, e aí eu vivo, no início eu me assusto, e depois eu vejo que não, que ela é uma criança esterilizada. Extremamente amada, feliz, e que a gente consegue fazer um monte de coisa com ela”.
Então, “quando vem esse cenário de adoção, a gente já tem essa primeira experiência. E então a gente questiona o que a gente ouve, né, porque adoção não dá certo, porque criança mais velha dá problema, porque, ah, mas é isso mesmo, deixa eu viver aqui pra eu ver, né, e eu acho que primeiro vem disso, e segundo, a gente se preparou muito, a gente estudou muito, a gente via tudo que a gente podia em relação à adoção.
A gente viu muito filme, documentário, a gente conversou com pessoas que viveram a adoção, e aí eu acho que, eu acho, não, isso faz toda a diferença. Então a gente tem mais segurança, porque durante dois anos a gente se preparou pra estar aqui onde a gente tá agora. Teve terapia pra adoção, fez a minha terapia pessoal, então a gente teve muita preparação, e isso obviamente torna a gente mais forte”.
Em relação a projetos, Renata adianta que tem vontade de escrever um livro. Não sabe se só especificamente sobre a Malu ou sobre as meninas, mas acha que dessa história talvez é a transformação de uma pessoa, de uma mulher, de um ser humano diante disso tudo que envolve um pouquinho todas elas.
“Preciso de tempo, agora eu sou uma mãe de quatro e a minha vida é louca, trabalho, tenho empresa. Então, agora eu só preciso de um tempinho para conseguir escrever esse livro, mas ele vai sair”.
ROTINA CAIU NA REDE
Para quem quer saber mais sobre essa história de amor, doação, partilha, cumplicidade e um pouco mais da vida de um casal com quatro meninas, o @ do Instagram e TikTok: @renatadarzi.
No Instagram, mostra muito a rotina, os desafios de forma autêntica e transparente.
“Eu entendo que eu, a partir do momento que eu escolho falar sobre adoção, também tenho uma responsabilidade gigante, né? Claro, eu vou desmistificar muita coisa pra muita gente, mas também vou inspirar outras pessoas.
Se eu falar ali só as coisas boas, eu vou causar problemas, possivelmente na vida de outras crianças que vão ser adotadas por casais que têm uma expectativa de que vai ser talvez tudo fácil porque é o que viu na internet e na prática vai ver que não é.
Então eu tento, sem expor a história delas e, enfim, sem essa linha tênue entre expor a vida, as características delas, mas deixar claro todas as delícias e os desafios desse tipo de maternidade”.
A mãe Renata tem uma empresa de marketing digital. O pai Pedro é advogado e tem um escritório de advocacia.
Moram no Rio de Janeiro e a cada conquista das meninas é motivo de alegria, de muita emoção.
FILA DE ADOÇÃO
Quando se entra na fila de adoção, maioria das pessoas faz perguntas tipo como você não pode engravidar, por que você está adotando, mas você não tem medo da história da criança.
Renata diz que sempre levam para conta da criança o possível sucesso ou fracasso daquela adoção.
“Hoje, eu diria para quem quer adotar que 99% das chances de sucesso daquela adoção vão depender muito mais de quem está adotando do que da criança que está chegando. Independente da história que ela traz, o quanto aquele casal está preparado, o quanto ele realmente estudou sobre a adoção, se uniu de informação para lidar com os momentos difíceis”.
A mãe de quatro diz que antes de adotar, seja racional na escolha do filho, não pense só com o coração. Se prepare, leia, estude, tenha certeza que é isso que você quer.
Renata ensina que quando as pessoas souberem que alguém vai adotar, pergunte se ela está preparada, se ela está se preparando, e não qual a história da criança, ou se ela não tem medo de puxarem a genética dos genitores.
E também não perguntar sobre a história da criança, o que ela viveu. “Não importa o que ela viveu, essa é uma história dela. Os pais deles não têm que ficar falando sobre a história de um outro ser humano que não é a história deles. Acho que as pessoas também têm que parar de perguntar o que aconteceu, quem são os pais, e não importa.
A vida agora é outra e eu acho que não interessa, a gente não sai na rua perguntando qual é a história das pessoas. Então, por que as pessoas se sentem nesse direito quando existe uma adoção envolvida”.
Ela argumenta: “Muitas vezes famílias biológicas passam pelos mesmos por questões muito iguais a uma família adotiva, mas quando é em uma família adotiva a conta sempre cai para adoção.
Então, acho que é uma coisa que a gente tem que parar de espalhar, casos que a gente não sabe como foi feito, como foi conduzido e colocar sempre na conta da adoção”.