colunista

Alari Romariz

Atuou por vários anos no Sindicato dos Servidores da Assembleia Legislativa e ganhou notoriedade ao denunciar esquemas de corrupção na folha de pagamento da casa em 1986

Conteúdo Opinativo

Anjos no caminho

06/09/2025 - 06:00
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Nesse longo tempo de minha vida lidando com homens públicos, pelo caminho encontramos anjos e demônios.

Um grande amigo que passou por mim durante muitos anos foi o governador Divaldo Suruagy. Apesar de ele ser mais velho cinco anos do que eu, tomávamos o mesmo bonde do Farol. Divaldo, aluno do Colégio Batista, e eu, normalista do Instituto de Educação.

Depois de casados, moramos na Avenida Moreira e Silva; Luzia com duas meninas e eu com minha primeira filha. Foi governador de Alagoas por três vezes e eu simples presidente do “Velho Sindicato”. Nunca deixou de me ajudar e me recebia no Palácio Floriano Peixoto sempre que o procurava.

Seus assessores me protegiam. Quando eu aparecia, me colocavam num lugar estratégico para falar com meu amigo governador. Verbas retidas do sindicato na Secretaria da Fazenda eram liberadas e vários servidores do Legislativo foram socorridos em época de crise.

Outro político que também era humilde e nos recebia bem foi o governador José Tavares. Íamos em sua casa e no Palácio era gentil e educado. Não se achava melhor do que os servidores. Deus o tenha em bom lugar.

Tivemos um presidente do Legislativo que era médico, justo e de fino trato. Certa vez um diretor Geral começou a perseguir duas funcionárias que se negaram a assinar um abaixo assinado em sua defesa. O pai de uma delas foi ao Dr. Mário e narrou o fato. O presidente chamou o diretor na vista das duas servidoras e tomou as devidas providências. Elas voltaram a trabalhar em paz.

Não daria para esquecer o deputado José Bernardes. Ajudou-nos a fundar nossa cooperativa médica. Homem simples, conversava com os servidores no pátio da Assembleia. Se um funcionário menos categorizado adoecesse e não tivesse plano de saúde, eu procurava o Zé e ele resolvia o caso.

Durante muitos anos convivemos na Assembleia com homens de bem, desprovidos de vaidade. Poderíamos citar o deputado Benedito de Lira. Tratava os funcionários com consideração e, sempre que possível, os ajudava.

Alguns parlamentares não foram mordidos pela “mosca azul” do “reinado”. Só depois da Constituição Estadual de 1989, com o duodécimo da Casa sendo gerido por eles, apareceu a necessidade de entrar na Justiça contra a Mesa Diretora para recuperar alguns direitos dos servidores. Eles, os dirigentes, achavam bom que os processos fossem para a Justiça, pois a lentidão os beneficiava. E riam dos pobres coitados funcionários.

Perdemos nossos anjos! Atualmente, para falar com um simples diretor de Pessoal a demora é longa. Para devolver o que foi retirado dos proventos da criatura, é preciso esperar alguns meses. Político no momento atual é um poço de poder e vaidade. Receber um servidor é passar por assessores também vaidosos que blindam a autoridade. São poucas e honrosas exceções.

Lembro-me de que precisei falar com um presidente do Tribunal de Justiça. Liguei para ele e recebi a resposta: “Venha aqui amanhã, às 7 horas. Diga na recepção que a espero”. Fui lá e conversei sobre vários processos do sindicato; era o desembargador José Fernandes, meu amigo de adolescência. Hoje é tudo muito distante.

Para os leitores terem uma ideia: não conheço pessoalmente o presidente do Legislativo. Nunca o vi e se o encontrar na rua, não sei quem é. Só o vejo nas manchetes dos jornais e na TV.

As saudades são muitas do tempo em que conversávamos com os deputados no pátio da Assembleia. Hoje, só vemos carros maravilhosos e assessores cheios de ousadia.

Precisamos rezar pelos nossos anjos que já se foram. Tomara que tenham deixado plantada a semente da humildade no coração dos poderosos do momento.

Que Deus abençoe os políticos que ainda não caíram no ostracismo. Que eles se lembrem: o poder é temporário!

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do EXTRA


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