saúde
Doenças do coração avançam entre jovens e acendem alerta na medicina
Hipertensão e colesterol alto já atingem homens e mulheres entre 20 e 30 anos
Homens jovens, entre 20 e 30 anos, estão passando a apresentar fatores de risco cardiovascular que até pouco tempo eram observados quase exclusivamente a partir dos 40 anos. Dados do National Health and Nutrition Examination Survey indicam que, entre adultos de 18 a 39 anos, 7,3% já convivem com hipertensão e 8,8% apresentam colesterol elevado. Outros 26,9% têm pressão arterial acima do ideal e 21,6% exibem níveis limítrofes de colesterol, muitas vezes sem diagnóstico formal.
O cardiologista Aloisio Barbosa da Silva afirma que quase um em cada quatro jovens já apresenta algum sinal de alteração de pressão arterial ou colesterol antes dos 40 anos, fenômeno diretamente associado a maus hábitos e à disfunção metabólica precoce. A professora de cardiologia da Escola de Medicina da Pontifícia Universidade Católica do Paraná, Sarah Fagundes Grobe, integrante do Comitê de Comunicação da Sociedade Brasileira de Cardiologia, confirma o avanço do risco cardiovascular entre jovens de 20 a 30 anos, em ambos os sexos. Segundo ela, a ideia de que infarto, hipertensão e arritmias são problemas restritos à velhice já não corresponde à realidade brasileira nem internacional.
No caso das mulheres, a médica explica que há fatores de risco específicos que antecipam o surgimento de doenças cardíacas, como complicações gestacionais — entre elas pré-eclâmpsia, eclâmpsia e diabetes gestacional —, além de menopausa precoce e doenças autoimunes. Esses elementos contribuem para o aparecimento mais cedo dos primeiros eventos cardiovasculares. Entre os homens, por sua vez, predominam o sedentarismo, a alimentação rica em ultraprocessados, jornadas extensas de trabalho, uso de estimulantes para treino ou para manter-se acordado, abuso de álcool, privação de sono e o consumo de esteroides anabolizantes.
Estudos recentes, segundo Sarah Grobe, demonstram uma relação consistente entre o uso de anabolizantes e o aumento de doenças cardiovasculares, configurando um risco silencioso que muitas vezes é subestimado. Para a especialista, esse conjunto de fatores acelera o envelhecimento do coração, fazendo com que a idade biológica cardiovascular avance mais rápido que a idade cronológica. Aloisio Barbosa reforça que o estilo de vida é a base desse problema, destacando o aumento do sedentarismo, da alimentação desbalanceada, de vícios cada vez mais precoces e da dependência excessiva de telas, com redução significativa da atividade física.
A sobrecarga de trabalho, a ansiedade constante e o excesso de estímulos também contribuem para esse cenário. Segundo Sarah Grobe, muitos jovens recorrem a medicamentos para acordar, dormir ou manter o foco, quando o ideal seria priorizar hábitos saudáveis, como sono adequado, prática regular de exercícios físicos — ao menos 150 minutos semanais de atividade moderada a intensa —, alimentação equilibrada, controle do peso e cuidado com a saúde mental e espiritual. Essas medidas, segundo ela, poderiam evitar ou ao menos postergar o surgimento das doenças cardiovasculares.
Os especialistas defendem que a prevenção deve começar cedo. Aloisio Barbosa recomenda consultas médicas regulares, com clínico geral ou cardiologista, a partir dos 20 anos, para acompanhamento da pressão arterial, do peso e de exames laboratoriais. Ele alerta que a obesidade, antes mais comum na vida adulta, tem sido observada já na adolescência e que casos de doença aterosclerótica coronariana vêm surgindo em pessoas com menos de 30 anos. Para reduzir riscos, orienta uma dieta baseada em alimentos naturais, prática regular de exercícios, abandono do tabagismo, consumo moderado de álcool, boa qualidade do sono e controle do peso corporal.
Sarah Grobe acrescenta que, culturalmente, os homens costumam buscar menos a medicina preventiva do que as mulheres, que desde cedo aprendem a realizar acompanhamento ginecológico. Ela ressalta a importância de avaliações clínicas periódicas, incluindo medições de pressão arterial, exames de colesterol e, quando indicado, a dosagem da lipoproteína(a), marcador genético associado ao risco cardiovascular. Segundo a médica, identificar precocemente esses fatores permite antecipar intervenções e melhorar significativamente o desfecho ao longo da vida.
Pesquisas internacionais reforçam o alerta. Um estudo realizado na Espanha mostrou que cerca de 18% dos jovens adultos já apresentam pré-diabetes, hipertensão ou dislipidemia, enquanto quase metade está acima do peso ou fisicamente inativa. Para Aloisio Barbosa, o consumo frequente de energéticos, pré-treinos, drogas estimulantes e cigarros eletrônicos agrava o quadro, ao favorecer inflamação vascular, elevação da pressão arterial e aumento do risco de arritmias, consolidando um cenário de adoecimento cardiovascular cada vez mais precoce entre os jovens.



