Dólar cede mais após governo sinalizar com corte de despesas em 2025; Ibovespa sobe 0,40%

Por Agência Estado 04/07/2024 - 18:12

ACESSIBILIDADE


A promessa feita pelo governo, de cortar despesas obrigatórias em 2025, contribuiu para que o dólar continuasse o movimento de queda iniciado ontem em relação ao real, deflagrado por um discurso mais claro do Planalto em defesa do ajuste fiscal e por um rumor de que o Banco Central teria consultado o mercado sobre a necessidade de maior liquidez no câmbio.

Com as perdas dos últimos dois pregões, o movimento da moeda brasileira ficou mais alinhado ao de outras moedas latino-americanas observado desde o final de maio, quando o rali do dólar ficou mais evidente em relação a essas divisas.

Nesta base de comparação, o dólar passou a acumular alta de 4,5% em relação ao real e de pouco mais de 6% em relação aos pesos mexicano e colombiano. Na comparação com o peso chileno, porém, a alta foi de 1,7%.

No acumulado do ano, porém, o real ainda é a moeda que mais perde na comparação com o dólar dentre as divisas de grandes países emergentes, seguida de perto pela lira turca.

Ontem à noite, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, reiterou o compromisso do governo com o arcabouço fiscal e as metas de resultado primário e anunciou que já foram identificados R$ 25,9 bilhões em despesas obrigatórias que poderão ser cortadas do Orçamento de 2025. "Nós já identificamos, e o presidente autorizou levar à frente", acrescentou o ministro.

"O fato de Haddad sinalizar e o Lula corroborar o possível corte de gastos de fato ajudou, assim como a possibilidade de intervenção do Banco Central no câmbio", disse André Carvalho, diretor de portfólio da Acura. Ele ressaltou, porém, que o ajuste nas despesas seria "pouco" para fazer cessar a preocupação dos investidores com as contas públicas.

Cristiane Quartaroli economista-chefe do Ouribank, também aponta que, a despeito da queda do dólar hoje, a taxa de câmbio segue num nível muito elevado.

Com o foco dos investidores voltado essencialmente ao cenário fiscal e ao compromisso político com os cortes de despesas, a notícia de que o superávit comercial de junho ficou acima do previsto teve efeito zero sobre a cotação do dólar, assim como a revisão para cima na previsão do governo para o resultado da balança comercial neste ano.

O mercado também operou hoje sem uma diretriz clara do exterior, devido ao feriado do Dia da Independência dos Estados Unidos, que manteve as bolsas de lá fechadas.

O dólar à vista caiu 1,47%, a R$ 5,4864, com máxima de R$ 5,5083 (-1,08%) e mínima de R$ 5,4668 (-1,82%) na sessão. Às 17h45, O contrato da moeda para agosto recuava 1,19%, a R$ 5,5025, com máxima de R$ 5,5270 (-0,75%) e mínima de R$ 5,4830 (-1,54%).

Ibovespa

O anúncio na noite de ontem pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, de que o governo cortará quase R$ 26 bilhões em despesas obrigatórias, em 2025, contribuiu para melhorar o humor dos investidores com relação aos ativos brasileiros desde a abertura desta quinta-feira. Assim, o Ibovespa, mesmo sem a descompressão aguda observada, ontem como hoje, no câmbio e na curva de juros doméstica, obteve a quarta alta consecutiva, aos 126.163,98 (+0,40%), que o mantém no maior nível desde 21 de maio, nos encerramentos.

Com o feriado de 4 de julho nos Estados Unidos, sem negócios em Nova York, o giro se enfraqueceu a R$ 16,4 bilhões. Na semana e no mês, o Ibovespa avança 1,82%, limitando a perda do ano a 5,98%. O dólar à vista fechou hoje abaixo de R$ 5,50, a R$ 5,4864 (-1,47%), em retração pelo segundo dia após ter atingido R$ 5,70, na máxima de anteontem. A curva de juros também devolveu prêmios, refletindo o que o próprio Haddad havia comentado ontem: "Comunicação bem feita melhora tudo."

A quarta-feira já havia mostrado isso, com o recuo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva na retórica beligerante contra a autonomia do BC e o nível da Selic, após conversa matinal com Haddad. E, à noite, o anúncio feito pelo ministro da Fazenda, de corte de gastos, trouxe a mensagem que o mercado esperava há semanas.

Hoje, a leve alta na B3 foi condicionada, em especial, pelo desempenho negativo de Petrobras (ON -1,35%, PN -1,37%) e de Vale (ON -0,50%), apesar de novo avanço tanto para os preços do petróleo como do minério de ferro - bem mais discreto na commodity de energia (Brent +0,10%) do que na metálica (+1,7% em Dalian).

A performance desses carros-chefes da B3 restringiu o ganho do Ibovespa na sessão, em que saiu de abertura aos 125.665,59 pontos, correspondente à mínima do dia, e na máxima atingiu os 126.659,95 pontos. A quinta-feira foi de ganhos bem distribuídos pelas demais ações de peso e liquidez, mas sem muita inclinação: nos grandes bancos, chegou apenas a 0,52% (BB ON) no fechamento.

Na ponta positiva do Ibovespa, Vamos (+8,43%), Pão de Açúcar (+7,33%), Lojas Renner (+6,44%) e Eztec (+5,15%). No lado oposto, além das ações de Petrobras, destaque também para Natura (-2,56%), CSN Mineração (-1,99%) e RaiaDrogasil (-1,80%).

"O governo parece que alinhou o discurso e deu indícios de que pode olhar com mais seriedade o controle e o corte de gastos, como visto nas palavras de Fernando Haddad. Se de fato isso acontecerá, é a dúvida que fica. Mas o mercado precisava desse incentivo para acalmar a curva de juros e o dólar, o que de fato aconteceu hoje", diz Anderson Silva, sócio da GT Capital. "Com a queda da curva futura, naturalmente já observamos entre as maiores altas do Ibovespa papéis como os de Vamos, Lojas Renner e Magazine Luiza (+4,77%), extremamente sensíveis à variação dos juros", acrescenta.

Para Tiago Sbardelotto, economista da XP Investimentos, o anúncio feito por Haddad é importante para a melhora da percepção fiscal, reporta a jornalista Gabriela Jucá, do Broadcast. "Nos últimos dias, falas do presidente Lula e uma certa ausência de movimentação da equipe econômica para apresentar medidas concretas deixaram o mercado inseguro, porque ficou muito no discurso", diz o economista. "Quando apresenta algo mais concreto, ainda que falte detalhamento, mostra que há algum desenvolvimento, ainda mais pelo anúncio ter sido feito após reunião com o presidente", acrescenta.

Para a Guide Investimentos, a autorização concedida por Lula a Haddad, para cortar R$ 25,9 bilhões em despesas obrigatórias no próximo ano, vem em linha com a "preservação do arcabouço fiscal". Em nota, a casa destaca também a reação inicial do mercado, positiva, à fala do presidente sobre o compromisso do governo com a responsabilidade fiscal, ainda na tarde de ontem.

Juros

Os juros futuros fecharam a quinta-feira em queda firme, apoiada na melhora na percepção de risco fiscal e no recuo do dólar abaixo dos R$ 5,50. O anúncio de que o governo identificou quase R$ 26 bilhões em despesas obrigatórias que podem ser cortadas do Orçamento de 2025 derrubou principalmente as taxas do miolo da curva, com impacto nas apostas de alta da Selic em julho e nos próximos meses.

No fechamento, a taxa do contrato de Depósito Interfinanceiro (DI) para janeiro de 2025 estava em 10,610%, na mínima, de 10,695% ontem no ajuste. A do DI para janeiro de 2026 caía de 11,53% para 11,27% e a do DI para janeiro de 2027, de 11,84% para 11,59%. O DI para janeiro de 2029 tinha taxa de 11,99%, de 12,20%. O dólar à vista caiu 1,47%, aos R$ 5,4864.

Sem a referência de Nova York, a liquidez foi mais baixa nesta sessão em que o foco esteve totalmente voltado à área fiscal. Ontem, ao longo do dia, o mercado já tentava antecipar o que viria de anúncio do governo, que saiu após o fechamento dos negócios.

Segundo o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, as despesas obrigatórias que poderão ser cortadas, no valor de R$ 25,9 bilhões, são fruto do pente-fino em programas sociais e outras despesas que vem sendo feito nos últimos meses, e a proposta tem o endosso do presidente Lula.

O estrategista de renda fixa da BGC Liquidez Daniel Leal divide a correção das taxas em duas etapas. A primeira começou ontem no fim da tarde com o presidente Lula afirmando que se tiver algum "desarranjo tem de consertar", e o segundo gatilho veio à noite, com o anúncio. "O mercado clamava por alguma sinalização mais firme de corte de gastos. Entre ontem e hoje, a curva já fechou em torno de 40 pontos com a percepção de que não haverá descaso com as contas públicas", disse.

O efeito foi mais forte nos vértices intermediários, que agregam as expectativas para o fiscal e para a política monetária. Porém, ainda há prêmio de risco para um aperto monetário no próximo Copom - cerca de 24% de probabilidade de aumento de 25 pontos-base, de 35% ontem no fim do dia. Na manhã de terça-feira, quando Lula criticou pela última vez o Banco Central, a chance chegou a superar 80% pela manhã. Para o fim do ano, a curva embute em torno de 75 pontos-base de alta da Selic.

"O mercado ainda preserva algum prêmio na expectativa pelo detalhamento dos cortes e também em função do payroll, amanhã", diz Leal, lembrando que a divulgação do relatório bimestral de receitas e despesas do dia 22 é o próximo evento decisivo no que concerne ao fiscal. Essa precificação de alta também é mantida em alguma medida porque se o BC tiver de mover a Selic para algum lado, a chance de ser para cima ainda é bem maior do que para baixo. "O cenário básico ainda é de manutenção. A curva sinaliza mais o que poderia ser um eventual próximo passo", disse.

No curtíssimo prazo, o relatório de emprego dos EUA referente a junho, amanhã, poderá estimular uma nova "pernada" na correção das taxas, caso os números endossem as chances de queda de juros até setembro e um orçamento total de 50 pontos este ano. Pela pesquisa do Projeções Broadcast, a geração de vagas é estimada em 200 mil, abaixo dos 272 mil postos criados em maio.


Encontrou algum erro? Entre em contato