PREOCUPAÇÕES
Especialista da BRTrader analisa queda de ações cripto e tesouraria
Liquidação de papéis expõe fragilidade de modelos corporativos baseados em Bitcoin
A divergência entre a relativa estabilidade do preço do Bitcoin e a forte liquidação de ações ligadas ao setor cripto voltou a colocar em foco a viabilidade das estratégias corporativas de tesouraria baseadas em Bitcoin. Na sexta-feira, as ações da MicroStrategy (MSTR) e da Semler Scientific (SMLR) caíram cerca de 6%, enquanto a japonesa Metaplanet, listada na bolsa de Tóquio, recuou 24% — tudo isso em um dia em que o próprio Bitcoin caiu pouco mais de 2%. Segundo Ivan Henrique, especialista da BRTrader, essas quedas revelam fissuras mais profundas na lógica financeira que tem levado empresas de capital aberto a acumular Bitcoin de forma agressiva, seja por meio de capital emprestado ou emissões de ações. “O mercado pode estar despertando para os riscos do excesso de engenharia financeira em torno da exposição ao Bitcoin”, afirma o especialista.
Henrique também ressalta que os investidores precisam se perguntar se essas ações realmente oferecem uma exposição estável ao Bitcoin ou se representam uma classe de ativos independente e mais arriscada. A queda nos preços das ações, mesmo com o Bitcoin sendo negociado próximo às máximas históricas, é uma prova do ceticismo crescente em relação a esses modelos de negócio — especialmente aqueles baseados em valorizações de mercado exageradas em relação às reservas reais de Bitcoin.
Disparidade de Mercado Entre o Bitcoin e Ações de Empresas Cripto
A sessão da manhã de sexta-feira apresentou uma divergência notável entre o desempenho do Bitcoin e o de várias ações dependentes do setor cripto. Enquanto o Bitcoin se mostrou relativamente resiliente, caindo menos de 2% a partir de suas máximas históricas, a reação do mercado às ações de empresas com tesouraria baseada em Bitcoin foi muito mais acentuada. A Strategy (MSTR), frequentemente associada à estratégia amplamente divulgada de compra de Bitcoin por Michael Saylor, caiu 6%, assim como a Semler Scientific (SMLR). Ainda mais dramática foi a queda da Metaplanet, listada no Japão, que recuou 24%.
Esse aparente desacoplamento tem levado estrategistas e investidores a questionarem se as suposições sobre o grau de correlação entre o desempenho dessas empresas e o do próprio Bitcoin precisam ser revistas. “Se o Bitcoin cai alguns por cento, mas sua ação despenca 24%, isso não é correlação — é superexposição”, afirmou Henrique.
Ele atribui esse movimento de preços a um possível reflexo do desconforto mais amplo do mercado com a arquitetura dos modelos de negócios dessas empresas.
A Armadilha do mNAV: Como a Supervalorização Alimenta um Ciclo de Risco
Grande parte da controvérsia gira em torno de uma métrica conhecida como Valor Patrimonial Líquido Modificado (mNAV). Trata-se da razão entre o valor de mercado da empresa e o valor dos ativos subjacentes em Bitcoin. Para empresas como a Strategy, que levantam recursos para comprar mais Bitcoin, um mNAV em alta sinaliza demanda dos investidores e abre espaço para novas captações a preços mais altos.
Mas se o mNAV cai abaixo de 1,0 — ou seja, quando o mercado deixa de acreditar que a empresa vale mais do que suas reservas em Bitcoin —, isso se torna um problema. Levantar capital torna-se mais difícil, especialmente se os recursos forem necessários para quitar notas conversíveis ou pagar dividendos preferenciais. A empresa deixa então de funcionar como um espelho do Bitcoin e passa a ser vista como um ativo em dificuldades.
Cresce nas redes sociais a crítica a esse modelo. Um perfil influente da comunidade bitcoiner, chamado lowstrife, recentemente descreveu esses modelos baseados em tesouraria como “alavancagem tóxica”, algo contrário aos princípios de um dinheiro descentralizado e saudável. Segundo ele e outros críticos, esse tipo de engenharia financeira amplifica os movimentos em ambas as direções — alimenta valorizações exageradas em mercados de alta e intensifica quedas quando o sentimento vira.
Estratégias Copiadas Amplificam o Risco Sistêmico
Esse não é um modelo isolado. Metaplanet, Twenty One e Nakamoto — todos seguidores da ideia de usar Bitcoin como tesouraria — adotaram estruturas semelhantes. Embora isso gere euforia de curto prazo nas altas, também eleva o risco sistêmico em todo o ecossistema cripto.
O especialista também destaca que a universalização dessas estratégias entre diferentes empresas pode estar alimentando uma bolha de interdependência. “Se poucas empresas fazem, é inovação. Mas quando todo mundo adota, é fragilidade”, explica.
Henrique também aponta para o desalinhamento de liquidez. Embora o Bitcoin seja altamente líquido, a estrutura corporativa por trás dessas empresas — emissão de ações, dívidas e pagamentos de dividendos — não é. Em caso de perda de confiança do mercado, essas empresas enfrentam não apenas a queda do valor de suas ações, mas também um aperto de liquidez, podendo ser forçadas a vender seus Bitcoins a preços desfavoráveis, perpetuando o ciclo.
Conclusão: Um Momento de Cautela para Investidores em Ações de Empresas Cripto
A forte queda nas ações de empresas com tesouraria em cripto, mesmo com os preços do Bitcoin relativamente estáveis, pode marcar um ponto de virada na forma como o mercado valoriza essas companhias. O que antes parecia uma maneira inteligente de se expor ao Bitcoin sem precisar segurá-lo diretamente, agora parece cada vez mais uma aposta especulativa.
Para investidores que consideram entrar nessas ações, Ivan Henrique recomenda cautela. “A correlação está se rompendo, e com ela, a narrativa de que essas ações oferecem uma exposição simples ao Bitcoin”, diz ele. Embora o Bitcoin ainda possa estar em tendência de alta, as ações construídas ao seu redor talvez não ofereçam a mesma clareza ou segurança.
Aviso Importante: Este artigo é meramente informativo e não constitui recomendação de compra, venda ou manutenção de ativos. Seu conteúdo não deve ser interpretado como aconselhamento financeiro. Não garantimos a validade das informações, especialmente quando se referem a fontes ou links de terceiros.