POLÍTICA
Congresso eleva gastos em mais de R$ 100 bi, travando ajuste fiscal
Levantamento da Tendências Consultoria mostra que valor deve subir para R$ 123,25 bi em 2026
Um levantamento da Tendências Consultoria, elaborado a pedido do jornal O Globo, mostra que as medidas recentes aprovadas pelo Congresso terão impacto de R$ 106,9 bilhões nas contas públicas em 2025, valor que deve subir para R$ 123,25 bilhões em 2026.
Entre as causas principais para elevação dos gastos, segundo o estudo da Tendências Consultoria, estão a ampliação do número de deputados de 513 para 531, o crescimento das emendas parlamentares e a aprovação do programa de renegociação das dívidas estaduais (Propag), que praticamente eliminou os juros pagos pelos estados, mantendo apenas a correção pela inflação.
O Congresso e as emendas
As emendas parlamentares são um dos fatores que mais pressionam o orçamento federal: passaram de R$ 8,6 bilhões em 2014 para R$ 62 bilhões em 2025, segundo dados da Tendências.
Para economistas, essa elevação excessiva do valor das emendas contribui para o peso desproporcional do Congresso no gasto público, tornando o governo federal o principal responsável por cobrir déficits, ainda que as decisões sobre despesas sejam amplamente compartilhadas entre Executivo, Legislativo e governos regionais.
Além disso, projetos legislativos recentes trouxeram “jabutis” — matérias estranhas ao tema principal dos textos — que oneram ainda mais o orçamento. No setor elétrico, por exemplo, um pacote aprovado em junho prevê custos de cerca de R$ 190 bilhões que serão repassados aos consumidores, numa operação criticada por especialistas como um “ataque especulativo” contra a sustentabilidade fiscal do país.
Outro ponto relevante são as renúncias fiscais mantidas ou ampliadas pelo Congresso, como a desoneração da folha de pagamentos, criada originalmente para setores específicos e hoje beneficiando 17 setores. O STF (Supremo Tribunal Federal) exigiu que o Congresso apresentasse compensação para perda de receita (R$ 20 bilhões, com a desoneração), mas só foram indicados R$ 9 bilhões de receitas não recorrentes.
Além da desoneração, a prorrogação do programa Perse, de apoio ao setor de eventos em razão da pandemia de Covid-19, também vai prejudicar a arrecadação do governo, que queria extingui-lo, mas os parlamentares mantiveram a isenção, de mais de R$ 15 bilhões.
Ao O Globo, o cientista político Carlos Melo, professor do Insper, destacou que o aumento do número de deputados federais em 2026 deverá aumentar os custos e emendas, refletindo uma preparação do Legislativo para o embate eleitoral do próximo ano. Para analistas políticos, a tensão entre Executivo e Legislativo e o enfraquecimento das medidas de ajuste fiscal são parte de um cenário onde o Congresso tenta preservar seus interesses diante das eleições.
Fundeb e BPC
A participação da União no Fundeb (Fundo de Desenvolvimento da Educação Básica) também está sendo ampliada gradualmente — de 10% até 2020 para 21% nos próximos anos —, o que deve custar R$ 6 bilhões anuais a mais para o governo federal.
No BPC (Benefício de Prestação Continuada), a flexibilização das regras em 2021 para ampliar o acesso tem elevado os gastos públicos, que chegaram a R$ 121 bilhões nos últimos 12 meses, contra uma estimativa de R$ 90 a R$ 95 bilhões caso as regras anteriores tivessem sido mantidas.
Além disso, uma proposta do Partido Progressista (PP) para a isenção do Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5 mil mensais, com cobrança de alíquotas mínimas apenas a partir de rendas muito superiores, pode ampliar a renúncia fiscal em R$ 38 bilhões, segundo especialistas.
Os principais achados da Tendências
✔️ Impacto fiscal do Legislativo: Medidas aprovadas pelo Congresso somam R$ 106,9 bilhões em 2025 e devem chegar a R$ 123,25 bilhões em 2026.
✔️ Fatores que pressionam as contas: Ampliação das emendas parlamentares (de R$ 8,6 bilhões em 2014 para R$ 62 bilhões em 2025), aumento do número de deputados, e programa Propag de renegociação das dívidas estaduais.
✔️ Renúncias fiscais mantidas ou ampliadas: Desoneração da folha, Perse (apoio ao setor de eventos), maior participação da União no Fundeb, flexibilização do BPC e isenção ampliada do IR para rendas mais altas.
✔️ “Jabutis” legislativos: Pacote no setor elétrico com custo de R$ 190 bilhões, repassados aos consumidores, e outras inserções que elevam gastos públicos.
✔️ Consequências: Maior dificuldade para o governo federal implementar ajustes fiscais, aumento das despesas públicas e tensão política em ano pré-eleitoral.