ANÁLISE
Governo Temer completa 2 anos sem força política
Com seu governo dividido em antes e depois do escândalo provocado pelo áudio da conversa que teve com o empresário Joesley Batista, o presidente Michel Temer completa dois anos no cargo no sábado fragilizado politicamente, abalado por denúncias e com um futuro nebuloso após deixar o posto, sob avaliação de analistas de que sua administração ficou aquém da expectativa.
Temer chegou ao cargo em maio de 2016, ainda como presidente interino em meio ao processo de impeachment da então presidente Dilma Rousseff. Na ocasião, prometia arrumar a economia, afetada pela inflação crescente e pela recessão, e usar sua experiência legislativa para aprovar reformas estruturantes no Congresso.
O cenário mudou drasticamente cerca de um ano depois, em 17 de maio de 2017, quando veio à tona uma conversa entre Temer e Joesley, um dos donos da J&F, holding que controla a JBS.
No diálogo, o presidente teria dado aval à compra do silêncio do ex-presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, segundo a acusação formulada posteriormente pelo então procurador-geral da República, Rodrigo Janot.
Também abalou o presidente a imagem, gravada pela Polícia Federal em uma operação controlada, de seu ex-assessor especial Rodrigo Rocha Loures correndo com uma mala de dinheiro recebida por um executivo da J&F.
“Aquilo é um divisor de águas, sobretudo em relação à capacidade do governo de levar à frente sua agenda de reformas”, disse à Reuters o consultor político e professor da Universidade Católica de Brasília Creomar de Souza.
“Acredito que agora ele está muito mais naquela fase em que o café começa a chegar frio nas reuniões e as portas demoram a ser abertas para ele quando ele chega no Palácio”, acrescentou.
A partir daquele episódio, Temer foi alvo de duas denúncias criminais feitas por Janot, e que tiveram seu andamento barrado pela Câmara dos Deputados.
“O presidente teve que trocar as reformas pela sua manutenção no cargo. Quando teve aquelas duas votações para impedir que ele fosse processado, ali o governo, em termos de reforma, acabou”, disse o cientista político Carlos Melo, do Insper.
“Na eleição o Temer já será um ex-presidente em exercício. A meu ver, bastante preocupado com seu futuro”, disse Melo, que avalia que a gestão Temer “ficou muito aquém do que prometeu, muito aquém da expectativa que gerou”.
Pesquisa Datafolha, divulgada em meados de abril, apontou que o governo Temer é mal avaliado por 70 por cento dos entrevistados, ao passo que apenas 6 por cento têm uma boa avaliação da gestão.
Além disso, após deixar o Palácio do Planalto, as duas denúncias contra Temer barradas pela Câmara poderão ser retomadas e o presidente poderá responder às acusações fora do cargo. Mais que isso, ele ainda é alvo de investigações —como a do chamado inquérito dos portos— que podem resultar em novas denúncias.
Apesar da perda de fôlego político e do fracasso em entregar algumas promessas, principalmente a reforma da Previdência, analistas reconhecem que o governo Temer teve sucesso em reverter expectativas econômicas, assim como a trajetória de alta da inflação registrada no governo Dilma.
A aprovação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que criou um teto para os gastos públicos, a recuperação da Petrobras, a criação de uma nova taxa referencial para empréstimos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), a reforma trabalhista e a redução da taxa básica de juros também foram citadas.
“É fato que o governo Temer retomou uma racionalidade da política macroecônomica. A Dilma tentou fazer isso, mas questões políticas a impediram de levar adiante, e o governo Temer conseguiu colocar a economia nos eixos e avançar um pouco em algumas reformas importantes. Não completou toda a agenda e o que ficou faltando é muito importante”, disse o analista Ricardo Ribeiro, da MCM Consultores Associados.
“Cumpriu tarefas. Agora, legado eu acho exagerado. Não deixa legado”, avaliou.
O cenário, de algumas conquistas inegáveis, porém insuficientes, na área econômica, e a sombra constante de acusações fazem do presidente e de seu governo também incapaz de desempenhar papel relevante na eleição presidencial de outubro.
Some-se a isso a tentativa fracassada, na visão de analistas, de conquistar capital político com a intervenção federal na segurança pública do Estado do Rio de Janeiro.
“Nós entramos em um ano eleitoral em que o governo tentou usar todos os meios possíveis para construir uma lógica que desse, no melhor dos cenários, a possibilidade de Temer ser candidato à reeleição, e, no cenário médio, a possibilidade de o governo ter um candidato forte que fosse da base do governo”, disse Creomar de Souza.
“Até o presente momento, nenhum dos dois cenários parece possível”, concluiu.
Ainda de acordo com o Datafolha de meados de abril, Temer chega a, no máximo, 2 por cento da preferência do eleitorado. O ex-ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, que tenta viabilizar sua candidatura pelo MDB e que adota discurso de defesa do governo, consegue, nos melhores cenários, 1 por cento.
Pré-candidatos da base que deu sustentação a Temer em todos esses dois anos ou em parcelas deste período, não parecem dispostos a assumir a defesa da gestão do emedebista.