brasília
Hugo Motta adota estratégia semelhante à de Lira para conter pressões
Presidente da Casa intensifica uso de requerimentos de urgência e sessões extraordinárias 
            O presidente da Câmara dos Deputados, Hugo Motta (Republicanos-PB), tem recorrido a instrumentos regimentais como requerimentos de urgência e sessões extraordinárias para reorganizar a pauta legislativa e retomar o controle político da Casa, após uma série de desgastes e motins internos. A análise, publicada pelo Estadão nesta quarta-feira (23) pelo jornalista Hugo Henud, indica que a estratégia repete o modelo de gestão adotado por seu antecessor, Arthur Lira (PP-AL), que consolidou o uso desses mecanismos como forma de centralizar decisões e reduzir a margem de manobra da base parlamentar.
Nos primeiros dez meses de gestão, Motta já aprovou 105 requerimentos de urgência, número próximo aos 136 registrados por Lira no mesmo período de seu primeiro mandato, em 2021. Também foram realizadas 89 sessões extraordinárias, contra 106 sob o comando anterior. O uso intensivo desses instrumentos, segundo a reportagem, reflete a tentativa do atual presidente de demonstrar autoridade e reagir ao enfraquecimento político causado por episódios recentes — como o motim de agosto e as tensões provocadas pela votação de pautas polêmicas, entre elas o PL da Anistia e a PEC da Blindagem, que geraram protestos e divisões internas.
O requerimento de urgência permite que projetos sejam levados diretamente ao plenário, sem tramitar nas comissões, acelerando a votação e restringindo o debate técnico. Já as sessões extraordinárias, convocadas fora da agenda regular, funcionam como um instrumento de controle de tempo e priorização de matérias de interesse da Presidência. Embora Motta tenha sido eleito prometendo ampliar o diálogo e o debate legislativo, o recurso a essas medidas tem sido crescente, especialmente após a crise de agosto.
De acordo com a cientista política Beatriz Rey, pesquisadora do Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa, o episódio do motim — quando deputados da oposição ocuparam o plenário por mais de 30 horas em protesto contra a prisão do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) — evidenciou a fragilidade política de Motta. “Um dos políticos mais novos a ocupar o cargo, ele ainda não demonstrou ter o perfil adequado para equilibrar os interesses do plenário e sustentar acordos duradouros”, afirmou à reportagem.
A avaliação é compartilhada por Murilo Medeiros, da Universidade de Brasília (UnB), que entende que o atual presidente tem governado “pelo regimento, e não pela política”. Para o pesquisador, o uso sistemático de urgências e sessões extraordinárias “esvazia o papel das comissões, reduz a transparência e compromete a qualidade da deliberação legislativa”. Medeiros observa ainda que a prática concentra poder na Presidência, enfraquecendo o papel coletivo da Câmara e ampliando a dependência dos parlamentares em relação à Mesa Diretora.
Dentro do plenário, a percepção também é de desgaste. Deputados da base e da oposição afirmam que Motta ainda não conseguiu se firmar como liderança de consenso. O deputado Chico Alencar (PSOL-RJ) avalia que o presidente tenta equilibrar forças divergentes entre partidos da direita e da esquerda, o que o torna refém da coalizão que o elegeu. “É como um técnico de futebol com pouca experiência, ainda procurando um padrão de jogo. Vai tocando entre avanços e recuos, tropeços e afirmações”, declarou.
Líderes da oposição também criticam a condução da pauta. O deputado Zucco (PL-RS) afirmou que partidos de direita têm sido preteridos nos acordos firmados pela Mesa, o que, em sua visão, amplia o clima de insatisfação e a percepção de falta de comando. Apesar das críticas, aliados de Motta afirmam que o uso dos instrumentos regimentais é uma tentativa de reorganizar a Casa após meses de tensão e de evitar novos impasses. Ainda assim, especialistas ouvidos pelo Estadão consideram que a dependência excessiva desses mecanismos reflete mais um sintoma de fragilidade política do que uma estratégia de força — um sinal de que, por ora, o presidente busca estabilidade na forma, e não no diálogo.
 
                             
                                 
                                 
                                



 
                     
                           
                           
                    