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ELEIÇÕES

Coronel Rocha Lima disputa vaga de vereador em Maceió

Militar acusado de homicídio escapa de condenação; MP vai recorrer
Por Redação 24/08/2024 - 06:00

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Reprodução/Tv Ponta Verde
Rocha Lima é conhecido como ‘limpador de área’
Rocha Lima é conhecido como ‘limpador de área’

Desde a Gangue Fardada, o grupo de extermínio que levou Alagoas às manchetes nacionais no final da década de 90 e que tinha como líder o tenente-coronel Manoel Cavalcante, nenhum outro policial militar alagoano esteve envolto em tantas polêmicas – negativas, diga-se de passagem – como o coronel Antônio Marcos da Rocha Lima. Aos 53 anos, o oficial da PM é um dos 312 candidatos a vereador de Maceió em sua terceira tentativa de alcançar um mandato eletivo.

No dia 1º deste mês, uma semana após ter registrado sua candidatura pelo Solidariedade, o coronel Rocha Lima foi levado a júri popular, acusado de um assassinato ocorrido há 15 anos em São José da Laje e que teve como vítima Cícero Francisco da Silva. O julgamento, previsto inicialmente para a comarca da cidade da Zona da Mata, acabou sendo desaforado para a capital para evitar qualquer tipo de pressão por parte do militar.

Além de Rocha Lima, que de acordo com a denúncia do Ministério Público teria organizado o crime, foram a julgamento o agente de polícia Miguel Rocha Neto, outra figura emblemática e comumente associada a diferentes tipos de crimes, e Anderson Pettyrson Barbosa da Silva.

Cícero Francisco teria sido morto porque ameaçara um subordinado do coronel – na época capitão PM – o sargento Galvão. Conhecido como “limpador de área”, Rocha Lima teria dito que ele não se preocupasse e acionado Miguel Rocha e Anderson, segundo relato dado à Polícia e em juízo por Alan da Costa Lima que afirmou ter testemunhado o crime.

De acordo com Alan, na madrugada do dia 14 de novembro de 2009 a vítima foi por ele atraída para fora de sua casa, colocada de joelhos por Rocha Lima e Miguel Rocha que em seguida dispararam vários tiros contra a mesma e na sequência fugiram no carro que era dirigido por Anderson.

A investigação do crime a cargo do Gecoc (Grupo de Combate ao Crime Organizado, hoje Gaeco, vinculado ao Ministério Público Estadual) resultou na pronúncia dos três acusados a 27 de fevereiro de 2012 pelos juízes da 17ª Vara Criminal que, em determinado trecho da decisão, afirmam: 

“A respeito de Antônio Marcos da Rocha Lima, Capitão PM, pesam inúmeras suspeitas de delitos, tais como homicídios, estupro, concussão, abuso de autoridade, disparo de arma de fogo em via pública, entre outros. Em relação a Miguel Rocha Neto, ex-policial civil, expulso da instituição, o Parquet Estadual expõe que é fato notório seu comprometimento em vários delitos, mormente de homicídios, além da suspeita no comércio de substância entorpecente. Assim, conforme os elementos probatórios elencados, somados aos demais constantes nos autos, possivelmente, o Capitão Rocha Lima mantinha o comando de um grupo organizado, atuante em vários delitos, com animus de estabilidade e permanência. O grupo seria composto pelos ora denunciados, juntamente com terceiros ainda não identificados”.

O julgamento dos acusados somente se deu 15 anos após o homicídio, no dia 1º deste mês, na 8ª Vara Criminal da Capital/Tribunal de Júri, sob a presidência do juiz José Braga Neto. Os três foram absolvidos por unanimidade pelo Conselho de Sentença, o que levou o Ministério Público a anunciar de imediato que iria recorrer da decisão.

Envolta em total segredo de Justiça – mais para segredo de Estado – a ação penal sobre o crime de São José da Laje não tem sequer a tramitação acessível para consulta pública, situação que se repete em outro caso de homicídio que teve o coronel Rocha Lima como indiciado, o assassinato a 25 de outubro de 2019 de Luciano Albuquerque Cavalcante no Conjunto Village Campestre II, em Maceió.

Rocha Lima, então tenente-coronel da PM, mas já conhecido e temido como o coronel Rocha Lima, chegou a ficar quase um ano preso preventivamente acusado de participação no crime e cuja motivação seria um desentendimento entre a vítima e um amigo do oficial, o militar da reserva José Gilberto Cavalcante Góes, com quem Luciano teria negociado um terreno sem contudo cumprir com sua parte no negócio.

Também foram denunciados pelo MP como participantes do crime o segurança particular Wagner Luiz das Neves Silva e Gilson Cavalcanti de Góes Júnior, na época secretário parlamentar da Assembleia Legislativa e que terminou sendo exonerado em janeiro de 2022. Os quatro chegaram a ter a prisão preventiva decretada pelo juiz John Silas da Silva, falecido em maio de 2021 em virtude da covid-19 e que à época presidia a 8ª Vara Criminal.

Em 2022, todos obtiveram a liberdade mediante habeas corpus. O que se sabe deste processo, tramitando a sete chaves na Justiça estadual, é que Rocha Lima foi impronunciado, uma decisão muito provavelmente do juiz Braga Neto, já que a ação penal tramita na 8ª Vara Criminal.

Esta é a terceira vez que Rocha Lima tenta um mandato eletivo. A primeira foi em 2008, quando ele disputou uma vaga de vereador em Maceió pelo PMN e obteve apenas 308 votos, ainda assim ficando como suplente. A segunda investida foi em 2022, mas acabou sendo frustrada pela Lei da Ficha Limpa (Lei Complementar 135/2010). 

Candidato a deputado federal pelo Avante, o coronel teve o registro da candidatura indeferido pelo Tribunal Regional Eleitoral de Alagoas (TRE-AL) a pedido do Ministério Público Eleitoral (MPE) devido à condenação de 2 anos por porte ilegal de arma em fevereiro de 2018, substituída por 2 penas restritivas de direito mas que ainda não havia sido cumprida em 2022.

Histórico desabonador e expulsão anulada

A conduta nada ilibada de Rocha Lima já lhe rendeu a expulsão das fileiras da Polícia Militar de Alagoas, uma decisão do então comandante Dário César, em dezembro de 2010, que terminou sendo anulada pelo Tribunal de Justiça. Na época, a PM fez circular junto à imprensa um relatório com o histórico de crimes que teriam sido praticados pelo militar e elaborado pelo Conselho de Justificação da PM, responsável pelo julgamento administrativo de policiais militares.

De acordo com este relatório (confira ao lado), Antônio Marcos da Rocha Lima ingressou na PMAL através do curso de Formação de Oficiais da Academia Senador Arnon de Mello na Turma Denilma Bulhões e suas primeiras transgressões teriam se tornado públicas a partir de 1995. Além destas, em 2019 o então tenente-coronel chegou a ter suspenso mais uma vez o direito de portar arma no bojo de uma ação de violência doméstica em que foram expedidas medidas protetivas a Fabiana Alves de Lima, com quem ele convivera por 11 anos.

O nome do coronel voltou ao noticiário local em 2020 como um dos suspeitos de participação no assassinato do empresário Kleber Malaquias, em Rio Largo. Rocha Lima chegou a ser citado como o intermediário entre mandante e executores, mas oficialmente seu nome não foi citado pelos delegados que investigaram o caso. O militar teria chegado ao Bar da Buchada, na Mata do Rolo, onde Malaquias foi executado, minutos após o crime.

Promoção em tempo recorde

Em 2022, Rocha Lima ingressou com ação contra o governo do Estado e Polícia Militar pleiteando sua promoção ao posto de coronel por tempo de serviço e obteve sentença favorável do juiz José Cícero Alves da Silva, da 16ª Vara Cível da Capital/Fazenda Estadual, no dia 30 de maio de 2023. Menos de dois meses depois, a promoção viria por meio do Decreto 91.906, de 7 de julho de 2023, elevando seus vencimentos de R$ 22.907,29 para R$ 32.838,15.

Vale destacar que o agente da Polícia Civil Miguel Rocha Neto, também absolvido no júri do caso de São José da Laje, foi igualmente expulso da instituição face às reiteradas transgressões e crimes cometidos, mas, tal qual o amigo coronel, retornou à PC por força de decisão judicial. 

De acordo com o Portal da Transparência do governo do Estado, desde novembro de 2020 ele figura como agente policial estatutário recebendo vencimentos de R$ 9.405,41 (valores de junho último). No dia 21 de junho deste ano, Miguel Rocha Neto foi condenado a 2 anos e 3 meses de reclusão por porte ilegal de arma. A sentença, do juiz Carlos Henrique Pita Duarte, da 3ª Vara Criminal da Capital, refere-se a um flagrante de fevereiro de 2017 e contra a qual ele apresentou recurso ainda a ser julgado.


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