PALMEIRA DOS ÍNDIOS
Defensoria da União denuncia uso irregular de verba em área indígena
Órgão afirma que R$ 1 milhão em verbas públicas foram usados na compra do terreno
A Defensoria Pública da União (DPU) acionou o Ministério Público de Alagoas (MPAL) após a Prefeitura de Palmeira dos Índios adquirir um terreno localizado em território tradicional da etnia Xukuru-Kariri. Cerca de R$ 1 milhão em recursos públicos foram usados para instalar empreendimentos privados na área, sem consulta prévia à comunidade indígena.
Segundo a DPU, o imóvel foi comprado ainda na gestão do ex-prefeito Júlio Cezar, onde seria instalado o Polo Industrial Noé Simplício e um parque aquático. As obras avançaram sem licenciamento ambiental e sem qualquer envolvimento da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), desrespeitando normas nacionais e tratados internacionais.
O ofício enviado ao MP destaca que “a área relativa ao empreendimento do polo industrial está inserida na terra indígena”, com base em análise técnica da Funai. A fundação já havia alertado a prefeitura para suspender qualquer planejamento sem consenso com os indígenas.
A geolocalização do terreno, conforme documento técnico da Funai, confirmou que o ponto adquirido incide “dentro da Terra Indígena Xukuru-Kariri”, e o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama) chegou a embargar as construções, que foram retomadas em 2024, mesmo após interrupção inicial.
A Justiça Federal, ao julgar a Ação Civil Pública nº 0800893-92.2024.4.05.8001, condenou o município e determinou a paralisação imediata das obras. Diz a sentença: “Julgo procedente a demanda para condenar o Município [...] a cessar definitivamente todas as obras, construções e atividades em andamento na área indígena declarada”.
A decisão judicial reforça que a área é protegida e que qualquer intervenção exige consulta e autorização das comunidades tradicionais. Ainda conforme a sentença, foi imposta multa diária de R$ 10 mil em caso de descumprimento da ordem.
A DPU pediu ao MP investigação sobre responsabilidade civil e criminal dos gestores da época, incluindo Júlio Cezar. No documento, o órgão solicita “medidas jurídicas que entender cabíveis, tendo em vista o uso de recursos públicos para ‘aquisição’ pelo município de imóvel inserido no território indígena”.
O prejuízo direto é estimado em R$ 1 milhão, valor investido na aquisição do terreno. No entanto, a Defensoria destaca que o caso representa mais que dano financeiro, envolvendo “grave lesão aos direitos de um povo tradicional”, devido ao desrespeito à legislação ambiental e aos direitos constitucionais dos povos originários.
O polo industrial foi instituído pela Lei Municipal nº 2.529/2022. Apesar de a prefeitura apresentar certidão de registro livre de ônus, a DPU apontou que tal documento não exime a necessidade de consulta à comunidade indígena e nem substitui os trâmites legais ambientais e fundiários.
Segundo o defensor Diego Bruno Martins Alves, autor do ofício, a atuação da Defensoria é necessária para assegurar os direitos de “grupos em situação de vulnerabilidade ou que mereçam especial atenção do Estado, o que é o caso da Comunidade Indígena de etnia Xukuru-Kariri”.
A Prefeitura de Palmeira dos Índios ainda não se manifestou publicamente sobre as medidas que adotará. A nova gestão, comandada por Tia Júlia, uma parente do ex-prefeito, terá de responder pela execução da sentença e pela recuperação dos recursos empregados.