VALE VERDE EM XEQUE
Assembleia elabora relatório sobre estragos
Defesa Civil identificou riscos da exploração mineral para a saúde dos moradores
Os deputados estaduais preparam, para as próximas semanas, um relatório incluindo informações de moradores além de documentos com detalhes sobre os riscos das explosões realizadas pela Mineradora Vale Verde, a saúde das pessoas e o futuro de residências.
É improvável que a mineradora deixe de funcionar em Craíbas. Nem os deputados têm interesse que isso aconteça.
O deputado Fernando Pereira (PP) fala em equilíbrio entre desenvolvimento e impactos: “Todos querem uma solução, mas não que a mineradora saia de Craíbas, pois ela gera emprego e renda. Temos órgãos competentes para fiscalizar e tornar a atividade viável”. Já Ricardo Nezinho (MDB) cita questões ligadas ao povo: “Casas interditadas, água ficando salgada, poluição sonora, poeira. A extração de minério é degradação por natureza”.
Ronaldo Medeiros (PT) pediu a notificação de órgãos públicos para conferir a qualidade da água, para evitar que se repita tragédias como as de Mariana (Minas Gerais) ou da Braskem, em Maceió: “A mineradora leva milhões daqui de Craíbas, então pode perfeitamente indenizar os prejudicados - são menos de 15 casas afetadas. Não há justificativa para protelar soluções”.
São pontos importantes porque o governo alagoano aposta na mineradora, tanto na geração de empregos diretos e indiretos quanto no potencial de arrecadação.
Por isso abriu as portas para estudos minerais, destacando Alagoas como rota de atenção nacional e internacional a curto e médio prazo para extração destas riquezas. Quando viajou à China, o presidente Lula (PT) construiu essa possibilidade; no início de abril o grupo chinês Baiyin comprou a mineradora Vale Verde por 420 milhões de dólares. Uma missão do governo alagoano se juntou ao Consórcio Nordeste em viagem a países do Oriente Médio. Para os árabes, foi despertar o interesse de investidores da região no potencial das águas alagoanas. Canal do Sertão e o futuro leilão do bloco D, envolvendo Arapiraca e cidades vizinhas, pautaram alguns destes encontros.
Mas a rota da mineração é, literalmente, o mapa da riqueza que o poder público pretende estimular a curto prazo.
Estudo do SGB
Recente estudo do Serviço Geológico do Brasil (SGB), estatal ligada ao governo federal, mostra a presença de minerais estratégicos no subsolo alagoano que também podem ser usados para a produção de energia nuclear, baterias e carros elétricos, o que pode despertar o interesse de grandes investidores, como os chineses; aumentar as receitas públicas com o pagamento de royalties, além da cobrança de impostos.
Mas também servir de alerta para possíveis danos ambientais. O mapa aerogeofísico da Bacia Alagoas, como o relatório do SGB classifica, anima o Governo Paulo Dantas.
“Entre eles [os minerais encontrados em Alagoas], destacam-se o urânio (elemento radioativo usado na geração de energia nuclear), as terras-raras (grupo de metais essenciais para a produção de baterias, turbinas, carros elétricos e equipamentos eletrônicos), os fosfatos (fundamentais para a indústria de fertilizantes), argilas especiais como o caulim (utilizadas na cerâmica, na indústria cosmética e de papel), além de possíveis ocorrências de metais como cobre, ferro e manganês”, explica o geógrafo Thyago Lima, ao analisar os relatórios do SGB.
Segundo ele, a exploração desses recursos, se for adiante, pode aumentar a arrecadação, criar empregos qualificados, atrair investimentos internacionais e formar novas cadeias produtivas no estado. “Pode também colocar o Brasil em posição estratégica no fornecimento de insumos minerais para a transição energética global — uma pauta prioritária nas próximas décadas”, analisa.
Colapso do solo e desastres humanos
Mas existe o outro lado: “A exploração de qualquer recurso mineral abaixo ou próximo de áreas urbanas, sem o devido controle técnico, pode causar colapsos no solo, contaminações ambientais e desastres humanos. E Alagoas conhece esse risco de forma dolorosa”, detalha. É também o que se vê no Agreste. Os problemas causados pela Mineradora Vale Verde são conhecidos há tempos. No início do ano, o EXTRA revelou que o governo federal já foi avisado da existência de uma tragédia iminente. Em 15 de fevereiro, em ofício encaminhado para a Secretaria Nacional de Proteção e Defesa Civil, a Defesa Civil de Alagoas admitiu que os tremores de terra tinham relação com as atividades da Vale Verde.
Para chegar a esta conclusão, a Defesa Civil Estadual ouviu 349 proprietários em 979 imóveis na área afetada em Craíbas, entre os dias 9 e 22 de janeiro de 2025.
O resultado preocupou pois os 309 entrevistados responderam que sentiram os tremores de terra após a instalação da mineradora. Sismos registrados nas quintas e sextas-feiras, dias de desmonte das rochas e explosões, para extração do cobre.
E ainda: 114 moradores denunciam fissuras e rachaduras em suas casas; antes da mineradora, 76 residentes tinham doenças pré existentes, como diabetes, ansiedade, hipertensão ou alergias e após a instalação da Vale Verde, 95 pessoas relataram doenças deste tipo; 28 moradores dizem que a qualidade da água para consumo mudou e para pior; e, foram registradas 312 reclamações por ruídos durante à noite e poeira.