Brumadinho: julgamento é suspenso após ministra votar pela execução individual de acordo com a Vale

Por Agência STJ 15/08/2025 - 07:25
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Brumadinho: julgamento é suspenso após ministra votar pela execução individual de acordo com a Vale

A Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) retomou, na última quinta-feira (7), o julgamento do recurso especial da Vale contra a decisão que reconheceu a uma moradora de Brumadinho (MG) o direito de executar individualmente a indenização por danos morais prevista em termo de compromisso firmado entre a mineradora e a Defensoria Pública de Minas Gerais.

Após o voto do relator, ministro Antonio Carlos Ferreira, que entendeu não ser cabível a execução individual, a ministra Nancy Andrighi abriu divergência. O julgamento foi novamente suspenso por pedido de vista do ministro João Otávio de Noronha. Até o momento, outros dois ministros – Humberto Martins e Daniela Teixeira – acompanharam a divergência, o que dá um resultado parcial de três a um pela possibilidade da execução individual. O colegiado tem dez membros, mas o presidente, Ricardo Villas Bôas Cueva, está impedido neste julgamento.

O caso envolve uma vítima que busca judicialmente o pagamento de R$ 100 mil, valor previsto no termo de compromisso como indenização por danos à saúde mental, com base no acordo extrajudicial firmado após o rompimento da barragem da Mina Córrego do Feijão, que deixou 272 mortos em 2019.

A Vale contesta a validade do termo como título executivo extrajudicial e a legitimidade da vítima para promover a cobrança individual. Argumenta que o acordo não tem força executiva em favor de terceiros, questiona a via processual utilizada e aponta fragilidade das provas apresentadas, como um laudo psicológico elaborado mais de um ano após o rompimento da barragem. Por esses motivos, requer a extinção do processo, alegando inexigibilidade do título e ilegitimidade da exequente.

Para o relator, dar caráter executivo ao acordo ultrapassaria seus limites

Em seu voto, Antonio Carlos Ferreira afirmou que o termo de compromisso constitui legítimo instrumento de autocomposição e solução extrajudicial de conflitos. No entanto, ressaltou que o documento não preenche os requisitos de certeza, liquidez e exigibilidade previstos no artigo 784 do Código de Processo Civil, o que impede sua caracterização como título executivo extrajudicial.

Segundo o relator, conferir caráter executivo ao termo ultrapassa os limites do ajuste celebrado. Ele destacou que tanto a Vale quanto a Defensoria Pública não reconheceram efeitos executivos no documento. Por isso, considerou inadequada a tentativa de executá-lo judicialmente apenas com base em sua redação.

O ministro alertou ainda que admitir a execução do termo poderia comprometer a segurança jurídica e desestimular o uso de mecanismos alternativos de solução de litígios. Para ele, o instrumento foi concebido como um canal extrajudicial de negociação, sem previsão de obrigação de pagar que autorizasse a execução unilateral.

"Subverter o objeto do ajuste para reconhecer a possibilidade irrestrita de sua execução por qualquer indivíduo que se reconheça como vítima implicaria desestímulo à utilização de métodos de solução de conflitos diversos da adjudicação judicial, ainda que de forma extrajudicial", afirmou ao votar pela extinção do processo sem resolução de mérito.

Para o voto divergente, acordo poderia se tornar apenas simbólico

Ao apresentar seu voto divergente, Nancy Andrighi afirmou que o acordo contém obrigação de pagar certa, líquida e exigível, prevista expressamente na cláusula 15.7, que estabelece a indenização de R$ 100 mil por danos à saúde mental.

Na avaliação da ministra, interpretar o documento de forma a impedir a cobrança direta dificultaria o acesso das vítimas à indenização, contrariando os objetivos do sistema de tutela coletiva, que é voltado à efetiva proteção de direitos difusos e individuais homogêneos.

"Se o termo de compromisso realizado não pode ser executado, e as vítimas permanecem a sofrer as consequências sem qualquer compensação, a sua realização constituiu, em verdade, ato meramente simbólico", declarou.

Nancy Andrighi observou que, embora a legislação especial preveja a legitimidade de órgãos públicos para firmar esse tipo de acordo, não há definição legal sobre quem pode executá-lo. Para ela, essa lacuna deve ser suprida por interpretação judicial que garanta a finalidade protetiva do microssistema de demandas coletivas. Assim, defendeu que a legitimidade para executar o termo seja definida conforme a natureza do direito tutelado, permitindo que os titulares diretos promovam a execução individual.


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