EFEITO BRASKEM
Município encerra 2024 sem solucionar tragédia com moradores dos Flexais
Comunidades isoladas rejeitam revitalização local e imploram por realocação com indenização justaO Município de Maceió encerra o ano de 2024 sem conseguir solucionar um dos mais trágicos problemas já vivenciado pela população nos últimos anos: os danos provocados pela irregular e criminosa mineração da Braskem, que deixou gravíssimas sequelas sociais, econômicas, ambientais e urbanas na capital alagoana.
Nota divulgada esta semana pelo Movimento Unificado das Vítimas da Braskem (MUVB) esclarece, para quem desconhece, as deficientes ações adotadas pelo Município, pelo Ministério Público Federal (MPF), Ministério Público do Estado de Alagoas (MPAL) e a Defensoria Pública da União (AGU) no sentido de reparar os prejuízos causados pela mineradora.
Um ponto crítico é o projeto de revitalização dos Flexais levado adiante pela Braskem e a Prefeitura de Maceió e que foi fruto de um acordo firmado entre eles e os órgãos citados (MPF, MPAL e AGU), que não levou em conta os interesses da maioria dos moradores da região, que lutam pelo direito de serem realocados com indenização justa.
O MUVB denuncia que os órgãos, numa atuação claramente deficiente em relação aos direitos coletivos dos moradores dos Flexais, não respeitaram a posição da maioria dos titulares do direito violado, provocando uma revitimização das vítimas do maior crime socioambiental urbano em curso do mundo.
"Procurando suprir a atuação deficiente acima mencionada, a Defensoria Pública do Estado de Alagoas ingressou com uma ação civil pública, que foi parcialmente julgada procedente, ampliou os valores das indenizações dos danos morais e materiais e está na fase de elaboração de uma perícia, não obstante oito estudos juntados aos autos, dando conta que é a realocação com indenizações justas que é a medida mais adequada para o caso", informa representantes do movimento.
No período da realização da CPI da Braskem, convocada pelo Senado Federal em maio de 2024 - lembra o MUVB- foi ouvido pela segunda vez o Sr. Thales de Queiroz Sampaio, servidor aposentado do Serviço Geológico do Brasil (SGB/CPRM) e coordenador dos estudos que identificaram a mineração da Braskem como responsável pelo fenômeno da subsidência do solo e das fissuras e rachaduras das residências em cinco bairros de Maceió, disse em alto e bom som que a região dos Flexais estava, de fato, na área de risco geológico.
A empresa e os órgãos aliados no acordo com a Braskem adotaram posição negacionista, não obstante as inúmeras subsidências, fissuras e rachaduras existentes nas casas dos Flexais, que segundo eles é fruto de causas alienígenas ao problema causado pela Braskem.
Contrariando qualquer ideia de solução apresentada pela Braskem, a comunidade dos Flexais continua habitando uma região devastada e sem condições mínimas de moradia saudável. As famílias permanecem próximas à área diretamente impactada pelo crime socioambiental da empresa, enfrentando riscos geológicos, isolamento social e econômico, e uma completa falta de dignidade.
"A demanda da comunidade pela realocação imediata é urgente e legítima", afirma o MUVB. "Hoje, para chegar à área habitada nos Flexais, é necessário atravessar uma região marcada pela destruição, onde a paisagem de desastre se impõe como um lembrete constante do descaso. Isso resultou em um isolamento completo da comunidade, tanto social quanto economicamente. O acesso precário, aliado à falta de infraestrutura e serviços essenciais, torna impossível uma vida digna para as famílias que ainda residem no local. E o chamado projeto de requalificação ou revitalização da área nem de longe irá resolver esses problemas, sendo uma espécie de cadeira de rodas para quem ficou paraplégico, dizendo que com a cadeira de rodas dará plena mobilidade e condições de vida para quem tinha suas pernas perfeitas".
Indenização irrisória
O acordo oferecido à comunidade dos Flexais pela Braskem é um exemplo claro da injustiça enfrentada pelas vítimas, na avaliação de quem se debruçou ao estudo da tragédia que destruiu os bairros de Maceió. "Sob combate direto da Defensoria Pública do Estado de Alagoas, as famílias foram indenizadas com apenas R$ 25 mil, por família afetada, um valor completamente desproporcional aos danos sofridos. Esse montante, que deveria reparar as perdas materiais, emocionais e sociais das famílias, representa um ultraje diante da gravidade dos problemas causados" denuncia o MUVB.
As condições de vida nos Flexais são insustentáveis, segundo atesta estudos realizados na área por instituições como a Universidade Federal de Alagoas (Ufal). A contaminação ambiental, a instabilidade do solo e a ausência de serviços básicos, a insegurança tornam o local impróprio para a moradia.
A proximidade com a área afetada pelo crime ambiental apenas agrava a situação, expondo as famílias a riscos contínuos e perpetuando o sofrimento. "É inaceitável que, após anos do desastre, a Braskem não tenha garantido um plano de realocação efetivo com indenizações justas para as famílias. A tentativa da Braskem de limpar sua imagem com campanhas publicitárias não pode apagar a dura realidade enfrentada pelas vítimas. A comunidade dos Flexais exige justiça, e isso significa não apenas sua realocação imediata para um local seguro, mas também indenizações justas que reflitam os danos reais sofridos por essas famílias".
A oferta de R$ 25 mil como reparação é considerada um insulto à dignidade das vítimas pelo MUVB e demonstra o descaso com que a empresa trata as pessoas afetadas por seu crime. "É hora de a Braskem assumir plenamente sua responsabilidade, garantindo que as vítimas dos Flexais sejam tratadas com respeito e recebam condições para reconstruir suas vidas com dignidade.
A situação de desespero das famílias dos Flexais com o projeto de revitalização da Braskem, pode muito bem ser ilustrada com o suicídio cometido pela Dona Pureza, moradora da região, em outubro deste ano. A doméstica ingeriu veneno e o distribuiu à filha com deficiência e ao gato de estimação, todos mortos.
Antes de falecer, dona Pureza deixou uma carta onde afirmou: Cada vez que eu vejo os benefícios da Braskem a minha desilusão aumenta. Estou cada vez mais depressiva em saber que vou ficar nesse isolamento para sempre.
Na avaliação do MUVB, o projeto de revitalização dos Flexais não apresenta solução para os problemas da comunidade, que deseja realocação com indenizações justas, e a sua continuidade e defesa só causa mais desespero e angústia.