Conteúdo do impresso Edição 1292

MULHERES NO FUTEBOL

‘Impedimento’ revela os desafios do futebol feminino local

Curta-metragem alagoano vem sendo exibido em festivais de vários locais do Brasil
Por ARTHUR FONTES 16/11/2024 - 09:55

ACESSIBILIDADE

REPRODUÇÃO
Cenas do curta da cineasta alagoana Renata Baracho
Cenas do curta da cineasta alagoana Renata Baracho

A diretora de cinema Renata Baracho, natural de Alagoas, trouxe à tona as vivências e desafios de mulheres alagoanas no mundo futebolístico em seu curta-metragem *Impedimento*. O filme retrata histórias que vão além das arquibancadas e mostram a luta por espaço em um ambiente historicamente dominado por homens. 

Por enquanto, o filme não está disponível para o público, sendo exibido apenas em festivais. Segundo Renata, existe a possibilidade de que, no segundo semestre do próximo ano, a obra fique disponível on-line permanentemente.

Em entrevista ao EXTRA, a diretora compartilhou as inspirações que a levaram a explorar o tema, o processo de escolha das personagens, os obstáculos enfrentados pela equipe durante a pandemia e o alcance da obra no meio esportivo.

EXTRA - O que te inspirou a criar um filme que explora a relação das mulheres com o futebol? Você já tinha conexão com o esporte?

Renata Baracho - Eu venho de uma família de torcedores, então vou ao estádio desde criança. Na adolescência, tinha preferência de acompanhá-los somente nos clássicos, mas depois o interesse aumentou e ir aos jogos passou a ser uma programação corriqueira. Foi essa vivência do dia a dia, nas arquibancadas também com as mulheres da minha família, e percebendo as mudanças ao longo dos anos nas questões de gênero e futebol que me despertou a querer pesquisar e documentar essa temática.

EXTRA - Como foi o processo de escolha das mulheres que compõem as histórias do filme?

Renata Baracho - Eu queria que, por meio das personagens, a gente se aproximasse cada vez mais do campo. Então pensei que poderíamos ter uma torcedora de cada um dos dois principais times do estado, depois as profissionais ao redor do campo, em seguida uma profissional da arbitragem e, por último, um time de mulheres. Comecei escolhendo e convidando aquelas que eu sempre via por ali: Charlene, Pei Fon e Brígida Cirilo. O UDA é o principal time feminino de Alagoas, então também foi uma escolha óbvia. E por último, porque seria o mais difícil, iniciei uma pesquisa para encontrar as duas torcedoras. Todas toparam logo de cara.

EXTRA - Nos bastidores, você encontrou algum tipo de resistência ou dificuldades para contar essa narrativa? Como você e sua equipe lidaram com esses desafios?

Renata Baracho - A grande dificuldade que se impôs à equipe, ao filme e ao mundo inteiro foi a pandemia. O filme foi contemplado em um edital no final de 2019; recebemos o recurso e em janeiro iniciamos as filmagens junto ao campeonato alagoano. Em março, tivemos uma diária para captar as entrevistas com as personagens num domingo, na quarta-feira seguinte tudo já estava fechado. E ainda nos restava mais três diárias, pelo menos. Então foi complexo por todos os motivos que a pandemia trouxe. Como equipe, também é complexo, porque uma equipe de curta-metragem geralmente trabalha junta por pouco tempo. No nosso caso, o processo inteiro, até todo mundo se vacinar, os jogos voltarem a acontecer, nos sentirmos seguros para filmar, depois a edição do material e finalmente o filme ficar pronto, durou cerca de três anos.

EXTRA - Existe alguma cena ou depoimento que você considera mais marcante?

Renata Baracho - Acredito que as imagens são bem simbólicas, por isso também optamos por trazer os depoimentos apenas em off, para que a gente pudesse contar a história por meio da imagem, não apenas da palavra. Entre todas, talvez uma das mais marcantes, mas não necessariamente surpreendente para quem conhece o cenário do futebol, é o paralelo de imagens que a gente faz entre a arquibancada alta num jogo masculino e a arquibancada alta num jogo feminino. No jogo do UDA pela Copa Rainha Marta, realizado num sol escaldante das 11 horas da manhã, as arquibancadas não apenas estão vazias, mas estão ainda com os lixos produzidos pela torcida que preenchia toda a arquibancada no jogo da noite anterior.

EXTRA - Como você vê o alcance do filme para além das fronteiras de Alagoas?

Renata Baracho - O filme tem circulado por diversos festivais e a recepção tem sido muito boa. Quando há espaço para debate, sempre se fala sobre as imagens, sem precisar necessariamente das palavras, as imagens já dizem muito. Porque, até pra sair pra se divertir ou trabalhar, as mulheres precisam estar em estado de alerta e de luta enquanto ocupam esses lugares e isso é visto no filme. Então sempre há identificação e surgem diversos depoimentos sobre pessoas que têm essa vivência do estádio, outras que gostariam de ter e até quem tinha e deixou de ter por alguma situação específica. Mas, de maneira geral, no meio cultural, percebo que futebol ainda é visto como um tema menor, como se também não fizesse parte da identidade cultural do nosso estado e do país.


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