BAIRROS DESTRUÍDOS
TJ descarta provas de CPI e beneficia Braskem
Tribunal segue argumento da empresa, que alega ‘insegurança jurídica’
O Tribunal de Justiça de Alagoas beneficia a Braskem ao não levar em conta as provas levantadas pela Comissão Especial de Inquérito (CPI), cujo relatório final foi apresentado há um ano e que investigou os crimes ambientais cometidos em Maceió e admitidos pela mineradora. O TJ também desconsidera os argumentos discutidos na Holanda, cuja Justiça, em julho de 2024, não só condenou a empresa como determinou pagamento de indenização às vítimas que perderam imóveis após afundamento do solo provocado por décadas de exploração do sal-gema.
Para tentar reverter pontos do acordo de indenização dos imóveis atingidos pela mineração indiscriminada, os advogados dos moradores dos bairros que afundaram em Maceió inserem nas ações judiciais tanto os resultados do relatório final da CPI da Braskem quanto o julgamento ocorrido na Holanda.
A mais recente decisão, da 4ª Câmara Cível, do final do mês de abril, analisou embargos de declaração movidos pela defesa de alguns moradores, mas os desembargadores acordaram que “a alegação de existência de decisão estrangeira e a CPI da Braskem constitui tentativa de reabrir a discussão de mérito, o que é vedado nesta via recursal”. Outros recursos estão pautados para análise nas próximas semanas.
O entendimento da Corte é que não se pode questionar pontos do acordo de indenização assinado entre os moradores e a Braskem para desocupação das áreas de risco. O lastro do acordo é a cláusula 14, referente aos pagamentos de terrenos e edificações, implicando a transferência deles para a empresa, operação considerada ilegal e absurda tanto pela Defensoria Pública Estadual quanto por moradores.
A principal tese adotada pela Braskem é a de que os argumentos expostos no relatório final da CPI quanto à decisão judicial na Holanda são “irrelevantes para o deslinde da causa”.
Já a defesa dos moradores levanta que a comissão recomendou a revisão dos acordos firmados porque eles não asseguram reparação integral às vítimas “e que foram realizados sem observância às peculiaridades de cada caso”.
Além disso, a CPI da Braskem também recomendou a revisão das indenizações, “sendo garantidos os direitos às famílias afetadas por meio de novas ações judiciais, o que reforça a tese de legitimidade da ação individual”.
Já a Braskem, além de insistir no descarte das conclusões tanto da CPI quanto das discussões levantadas na Holanda, também diz que as narrativas individuais dos moradores são genéricas; que os moradores das áreas afetadas aceitaram firmar acordos individuais no âmbito do Programa de Compensação Financeira (PCF) “com quitação plena de direitos relacionados à desocupação dos imóveis”. E a tentativa de rediscutir acordos, mesmo incluindo o relatório final da CPI, “compromete a segurança jurídica e fragiliza o sistema de solução consensual de conflitos, gerando risco de judicialização massiva”.
O relatório final da comissão no Senado que investigou o crime ambiental admitido publicamente por diretores da mineradora foi apresentado em 15 de maio do ano passado, pelo relator e senador Rogério Carvalho (PT/SE). Aprovado no dia 21/5/2024, pediu indiciamento de 20 pessoas, incluindo diretores da Braskem, além de Gustavo Lopes (presidente do Instituto do Meio Ambiente, o IMA), por conceder licenças em desacordo com as normas ambientais, mesmo crime de Leonardo Lopes, vice-presidente do instituto; de Jean Paulo Pereira Melo, geólogo do IMA, por fazer afirmações falsas em licenciamento e conceder licenças em desacordo com normas ambientais, além de Pollyana Christiana Gomes dos Santos, ex-gerente do instituto, também por fazer afirmações falsas em licenciamento.
Além disso, o relatório defendeu revisão dos acordos, indenização de R\$ 40 mil por danos morais paga por imóvel e a realocação de quem ainda mora nas áreas monitoradas – chamadas de borda –, hoje ameaçadas de desabamento mas fora do alcance de indenização.
Em julho do ano passado, a Justiça holandesa condenou a Braskem a indenizar nove moradores, determinando que as partes entrassem em acordo sobre o valor da indenização.