Com Powell, Ibovespa modera perdas e cede 0,18%, aos 127,3 mil pontos

Por Agência Estado 03/04/2024 - 18:21

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A boa recepção inicial às palavras desta quarta-feira do presidente do Federal Reserve, Jerome Powell, retiraram o Ibovespa de perdas em torno de 0,8% no começo da tarde para fechamento ainda negativo, embora mais acomodado - em dia no qual o índice não conseguiu acompanhar o sinal de Nova York desde cedo. Ao fim, a referência da B3 mostrava baixa de 0,18%, a 127.318,39 pontos, enquanto o desempenho de NY também perdeu força em direção ao fechamento, entre -0,11% (Dow Jones) e +0,23% (Nasdaq). O dólar, por sua vez, cedeu hoje 0,35%, a R$ 5,0405.

Ontem, o Ibovespa havia avançado na contramão de Nova York com o impulso proporcionado pelas gigantes das commodities, Vale e Petrobras, que hoje fecharam em baixa: a ação da mineradora (ON) caiu 1,44% e as da petrolífera recuaram 0,78% (ON) e 0,52% (PN). Em Qingdao (China), o minério de ferro fechou a quarta-feira abaixo de US$ 100 por tonelada, no menor nível desde maio de 2023.

O petróleo, por sua vez, voltou a subir hoje, ainda que moderadamente, em Londres e Nova York, mas as ações da estatal não conseguiram acompanhar o movimento, em meio à retomada de ruídos em torno da permanência, ou não, de Jean Paul Prates à frente da empresa. De acordo com relato do jornal Folha de S. Paulo, voltaram a circular nos bastidores novos nomes para possível substituição de Prates na presidência da Petrobras, entre os quais Bruno Moretti e Magda Chambriard.

O ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, afirmou nesta quarta-feira à Folha que existe uma divergência com o presidente da Petrobras, mas que tal diferença é salutar. Segundo Silveira, o conflito ocorre pelas características dos papéis de ambos, em suas respectivas funções.

Apesar do sinal negativo de Vale e Petrobras na sessão, setores como o siderúrgico e o de utilities deram contribuição favorável nesta quarta-feira, assim como alguns grandes bancos, como Bradesco (ON +2,30%, PN +1,97%) e Banco do Brasil (+0,39%). No setor metálico, destaque para Gerdau (PN +0,89%, na máxima do dia no fechamento) e entre as utilities, para Eletrobras ON (+0,32%).

Na ponta ganhadora do Ibovespa na sessão, destaque para a recuperação de PetroReconcavo após o tombo de 9% no dia anterior, em meio à aproximação entre 3R Petroleum e Enauta para uma junção de negócios. Hoje, PetroReconcavo subiu 4,60%, à frente da própria 3R Petroleum (+3,78%) e de Natura (+3,54%). No lado oposto, Soma (-6,85%), Arezzo (-6,18%) e Cogna (-5,53%). O giro na B3 ficou em torno de R$ 22 bilhões no fechamento. Na semana, o Ibovespa cai 0,61% e, no ano, cede 5,12%.

Desde o exterior, em meio à recente pressão sobre os rendimentos dos Treasuries, as atenções se voltaram ainda no começo da tarde a novas declarações de Jerome Powell. Ele reconheceu mais uma vez que a inflação caiu significativamente nos Estados Unidos, mas permanece acima da meta, e que o trabalho de fazer com que retorne à referência de 2% ao ano ainda não terminou.

Powell disse também que a política monetária pesa sobre a demanda, sobretudo nos serviços, mas que dados recentes sobre emprego e inflação vieram acima do esperado. "Reduzir juros cedo demais pode reverter progressos contra inflação", observou também o presidente do BC americano. Por outro lado, ele apontou que um "corte tardio de juros poderia enfraquecer a economia e o emprego". "Tomaremos decisões reunião a reunião", reiterou.

"A cautela deu o tom hoje, desde cedo, com a expectativa para as falas do Roberto Campos Neto, presidente do BC, e do Powell, lá fora. Havia uma luz de aversão a risco acesa, mas superada a expectativa para as duas falas chegou a haver melhora, que não se sustentou em direção ao fechamento", observa Rodrigo Moliterno, head de renda variável da Veedha Investimentos. "Mercado muito ligado ainda ao movimento das Treasuries, com implicação para a curva doméstica, em abertura."

A princípio, o mercado viu bem o sinal de Powell de que ainda é apropriado cortar juros nos Estados Unidos este ano mesmo com a economia aquecida, aponta Leandro Petrokas, diretor de Research e sócio da Quantzed, o que contribuiu para a virada do real, que passou a se apreciar frente ao dólar na sessão, enquanto os rendimentos das T-notes de 10 anos também se afastavam das máximas do dia.

Contudo, "o momento ainda é de inclinação nas curvas de juros, nos Estados Unidos e também no Brasil, e o dólar mantém a tendência de apreciação frente ao real", diz Lucas Serra, analista da Toro Investimentos, destacando o escrutínio que o mercado tem exercido sobre as falas de autoridades do Federal Reserve, como Powell, enquanto emergem dúvidas quanto ao início do processo de redução dos custos de crédito nos EUA - que vinha sendo precificado ultimamente para junho, após a frustração da expectativa que prevalecia no fim de 2023 para março.

"Pela manhã, os dados sobre geração de emprego no setor privado dos Estados Unidos, da ADP, vieram bem acima do esperado para março, contribuindo para essa cautela dos investidores observada desde cedo, mesmo com a revisão dos dados de fevereiro para baixo", diz Larissa Quaresma, analista da Empiricus Research.

No quadro mais amplo, a combinação de real depreciado com curva de juros em alta, aqui e no exterior, é deletéria para o apetite por risco em ações listadas na B3, que já haviam sofrido o impacto, ao longo do primeiro trimestre, dos saques líquidos que se acumularam entre os investidores estrangeiros. Ainda assim, caso o crescimento doméstico se sustente e venha a se acelerar, há espaço para que os investidores voltem a escolher ações cíclicas nos próximos meses, argumenta Mateus Haag, analista da Guide Investimentos, em nota.

"A queda dos juros Selic é um fator que pode acelerar o crescimento nos próximos meses: historicamente, a atividade econômica reage ao corte de juros com 6 a 12 meses de 'atraso'. Ou seja, com o início do corte de juros no 3T23, o crescimento deveria acelerar, principalmente, na segunda metade de 2024 - ou seja, em breve", aponta o analista, destacando alguns nomes associados ao ciclo doméstico, e com "bons fundamentos", cujas ações podem ser beneficiadas pela aceleração do crescimento econômico, como BTG Pactual, Itaú, Lojas Renner e Assai.

Dólar

O dólar à vista perdeu fôlego ao longo da tarde em meio a declarações do presidente do Federal Reserve, Jerome Powell, e encerrou a sessão desta quarta-feira, 3, em baixa de 0,35%, cotado a R$ 5,0405, com mínima a R$ 5,0368. Pela manhã, a divisa operou descolada do sinal predominante de baixa da moeda americana no exterior e se aproximou R$ 5,10 na máxima (R$ 5,0918), com relatos de saídas de recursos do mercado doméstico.

Powell desfez parte do mau humor que reinou pela manhã com a divulgação dados fortes do mercado de trabalho americano. Relatório ADP mostrou criação de 184 mil vagas no setor privado americano em março, bem acima do esperado (150 mil) - o que levou as taxas dos Treasuries aos maiores níveis desde novembro de 2023, com a T-note de 10 anos tocando 4,42% na máxima.

As taxas longas dos Treasuries desaceleraram com a fala de Powell e o retorno da T-note de 2 anos - mais ligada às expectativas para o rumo da taxa de juros no curto prazo - passou a cair. Já em baixa pela manhã, o índice DXY - que mede o desempenho do dólar em relação a uma cesta de seis divisas fortes - acelerou a queda e tocou mínima aos 104,231 pontos.

O real - que ontem amargou o pior desempenho entre pares - hoje se recuperou, apresentando o segundo maior ganho em relação ao dólar entre as divisas latino-americanas. A liderança ficou com o peso chileno, que exibiu alta superior a 2%, graças à escalada da cotação do cobre para o maior nível em um ano e à decisão do BC chileno ontem de reduzir o ritmo de cortes de juros.

"A fala de Powell não trouxe nada de muito novo, mas o mercado estava estressado com a pesquisa ADP. O mercado de trabalho americano continua aquecido e a expectativa é que o payroll venha forte na sexta-feira, voltando a pressionar o dólar", afirma o economista André Galhardo, consultor econômico da Remessa Online, para quem a taxa de câmbio deve permanecer acima do nível de R$ 5,00. "Não vejo uma desvalorização grande do real, mas o quadro é de cautela com o exterior. A alta do petróleo pode pressionar a inflação americana em abril."

Em discurso na Universidade de Stanford, o presidente do Fed reiterou que a taxa de juros já atingiu seu pico e que a maioria dos integrantes do Comitê Federal de Mercado Aberto (Fomc, na sigla em inglês) espera que os juros comecem a cair em algum momento neste ano. Mais uma vez, Powell afirmou que o Fed está no modo "data dependente" e que necessita de "mais confiança" no processo de desinflação para começar a cortar a taxa básica.

Por aqui, as atenções se voltam à dinâmica no mercado futuro, diante da expectativa de que o Banco Central possa voltar a intervir. Investidores absorveram ontem a oferta total de US$ 1 bilhão em swaps cambiais, que equivale à venda de dólar futuro. O objetivo da operação, segundo o BC, era manter o "funcionamento regular do mercado de câmbio" em meio a resgates de NTN-A3 em 15 de abril.
Quando esses títulos vencem, os detentores podem ir ao mercado para recompor sua posição, o que aumenta a demanda por compra no segmento futuro.

Em evento na cidade de São Paulo, o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, disse hoje que a oferta adiciona de swaps não foi provocada pelo movimento da taxa de câmbio. "Estávamos vendo que poderia ter uma disfunção e foi feita uma intervenção, colocamos no texto da intervenção isso", disse Campos Neto, acrescentando que o BC voltará a atuar se houver "disfuncionalidade" no mercado.

Para o consultor da Remessa Online, ao promover a oferta extra de swaps, o BC passou ao mercado o "recado" de que está atento à dinâmica do câmbio e não vai deixar o real se descolar de seus pares. "Há a explicação mais técnica do vencimento da NTN-A3, mas o fato é que o dólar saiu do corredor entre R$ 4,80 e R$ 5,00 e se estabeleceu firmemente acima de R$ 5,00", afirma.

Juros

Os juros futuros desaceleraram o ritmo de avanço e fecharam a sessão desta quarta-feira (3) perto da estabilidade, mas preservando um viés de alta. O discurso do presidente do Federal Reserve, Jerome Powell, trouxe um respiro aos mercados. No Brasil, a questão fiscal segue trazendo desconforto, com a possibilidade crescente de revisão das metas, simultaneamente à percepção de atritos entre a Fazenda e o Senado.

No fechamento, a taxa do contrato de Depósito Interfinanceiro (DI) para janeiro de 2025 estava em 9,960%, de 9,947% ontem no ajuste, e a do DI para janeiro de 2026 passava de 9,96% para 9,98%. O DI para janeiro de 2027 tinha taxa de 10,28% (de 10,26% ontem) e o DI para janeiro de 2029, taxa de 10,84% (de 10,81%).

Pela manhã, as taxas chegaram novamente a abrir mais de dez pontos-base nos vencimentos de longo prazo, que vêm sendo os mais penalizados. O avanço seguiu atrelado à escalada dos Treasuries, com o retorno da T-Note de dez anos hoje atingindo 4,42% nas máximas.

Quando os juros caminhavam para a sexta sessão seguida de alta no caso dos vencimentos médios e longos, veio Powell para aliviar a pressão nos ativos. "Na margem, o discurso foi de neutro para ligeiramente dove, mas sem mudar o cenário. Ele deixou claro que ainda não há informação suficiente para decidir sobre os cortes e tudo segue na dependência dos dados", afirmou Leonardo Monoli, sócio e diretor de gestão da Azimut Brasil Wealth Management.

Entre outros pontos, Powell reforçou que a taxa básica atingiu o pico no ciclo atual e lembrou que a maioria dos integrantes do Comitê Federal de Mercado Aberto (Fomc, na sigla em inglês) espera que os juros comecem a cair em algum momento neste ano. Por outro lado, alertou que um corte de juros prematuro poderia reverter os progressos no combate à inflação e exigir uma política mais apertada à frente, mas também que um relaxamento tardio potencialmente enfraqueceria a atividade econômica e o emprego.

Depois das declarações, o rendimento da T-Note de dez anos voltou para 4,36%, trazendo as taxas locais para perto dos ajustes anteriores. Contudo, o mercado evitou partir para uma realização firme de lucros antes de conhecer o relatório de emprego dos EUA na sexta-feira. "O payroll precisa dar um alívio, caso contrário a assimetria de riscos pode piorar ainda mais", prevê Monoli.

Além da espera pelo payroll, o contexto doméstico também não autoriza uma correção do forte movimento recente. O sócio e economista-sênior da Tendências, Silvio Campos Neto, menciona que há crescente percepção de dificuldades para o alcance das metas, citando declarações da ministra do Planejamento e Orçamento, Simone Tebet, que, segundo ele, preparam terreno para mudança das metas em 2024 e, principalmente, 2025. "São situações que têm ajudado a pressionar câmbio e juros, em especial", disse, em nota publicada no serviço on line da consultoria.

Ontem, a ministra reconheceu que as alternativas para aumentar as receitas já estão se "exaurindo" e a equipe técnica ainda não tem em mãos os dados fechados de projeção para afirmar se o governo poderá manter a meta de superávit de 0,5% do PIB em 2025. Hoje, o secretário-executivo do ministério do Planejamento e Orçamento, Gustavo Guimarães, reforçou o compromisso de entregar a meta de déficit zero em 2024. Ele também assegurou que não há discussões neste momento para mudar o arcabouço fiscal, incluindo o limite de despesas fixado pela regra.


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