É professor adjunto da Universidade Federal de Alagoas (Ufal) e cirurgião especializado em cirurgia digestiva. Graduou-se em medicina pela Ufal (1980) e é mestre em gastroenterologia cirúrgica pela Escola Paulista de Medicina/Unifesp. Atua como docente e cirurgião na área de cirurgia digestiva da Ufal.

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Abuso infantil e distúrbios psiquiátricos: uma relação perversa

23/05/2025 - 06:00
Atualização: 23/05/2025 - 12:26
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Texto de Alexandre A. J. Vasconcelos – Médico psiquiatra. Mestre em Neurociências e Ciências do Comportamento pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP)

Adultos que sofreram diversos tipos de maus-tratos durante a infância têm uma chance aumentada de apresentar problemas de saúde, especialmente psiquiátricos — embora não restritos a esses. Os dados se acumulam desde o final do século passado e, neste momento, já são bastante significativos.

Um estudo pioneiro de 1998 relacionou sete categorias de experiências adversas na infância: abuso psicológico, físico ou sexual; violência contra a mãe; convivência com membros da família que eram usuários de drogas ilícitas, pacientes psiquiátricos ou que já tinham sido presos. Essas situações disparam um risco aumentado para o desenvolvimento de alcoolismo, abuso de drogas, depressão, tentativa de suicídio, tabagismo, autoavaliação de saúde ruim, doenças sexualmente transmissíveis, inatividade física, obesidade, doenças cardíacas, câncer, doença pulmonar crônica, fraturas e doença hepática.

Dados mais recentes indicam também aumento de risco para que essas pessoas apresentem distúrbios psiquiátricos mais amenos, como transtorno de estresse pós-traumático, transtornos ansiosos, depressão, oscilações de humor, dependência química e alcoolismo. Quando comparados dois grupos de pacientes com o mesmo diagnóstico — com e sem histórico de abuso infantil — observou-se que aqueles que sofreram abusos apresentavam maior propensão ao desenvolvimento de quadros crônicos e refratários. Muito provavelmente, os traumas sofridos durante os primeiros anos de vida são responsáveis, anos mais tarde, pelos resultados encontrados nos estudos.

Infelizmente, as taxas de abuso físico, sexual e emocional na infância são notavelmente altas. Níveis elevados de violência intrafamiliar são mais prevalentes em lares de baixa renda, o que adiciona um componente ainda mais grave aos já altíssimos índices de desigualdade social do país e contribui significativamente para a perpetuação dessa realidade — inclusive com a mediação de quadros psiquiátricos associados a afastamentos laborais e baixa produtividade. Por óbvio, julgo desnecessário tecer comentários sobre a grave violação dos direitos humanos mais básicos que representam as diversas formas de violência contra crianças.

Apesar de o Brasil possuir um amplo arcabouço legal para combater a violência contra crianças, seus efeitos práticos são ineficientes. A solução para isso passa por ações preventivas, como a conscientização dos pais sobre os efeitos deletérios do abuso infantil no desenvolvimento da criança, para que, com a orientação adequada, possam tomar melhores decisões sobre a educação dos filhos. Outra frente diz respeito à capacitação de profissionais da educação e da saúde para a identificação de casos de abuso infantil. Por fim, em casos extremos, é necessário responsabilizar e punir os agressores na forma da lei, de modo que suas ações sejam inibidas e não voltem a ocorrer.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do EXTRA


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