A poeira da morte
Em 1968 Alagoas registrou a maior produção no país de amianto: 276.300 toneladas, 80% do Brasil naquele momento. Mas isso representou 43% do valor da produção nacional por ser o amianto local do tipo fibra curta, menos valioso que o fibra longa. Ainda assim, o amianto – usado para produzir telhas e revestimentos – foi descoberto em Alagoas no meio de uma onda salvacionista porque essa variedade de fibras minerais já era tratada como potencial de riqueza pelos estados.
Em 1959, o Departamento Estadual de Estatística já o incluía como um dos mais importantes produtos extrativistas em Alagoas, ao lado do peixe, da lenha e do mármore. E o departamento projetava para os anos 60 uma produção em escala ainda maior. Os anos 60 foram estratégicos principalmente para a Petrobras. Novas descobertas de jazidas de petróleo uma década antes e também em Alagoas atrelavam o fim dos tempos de miséria à extração do mineral, um discurso que também interessava aos militares no pós-golpe de 1964.
Como o que vinha da terra era riqueza, surgiu o amianto para “coroar” o desejo desenvolvimentista dos militares, enquanto o primeiro ditador do regime, Castello Branco, preparava, aos poucos, o fim das eleições diretas. Em 1970, o Ministério do Interior apontava que Campestre, no município de Batalha, e Algodões, na cidade de Girau do Ponciano, tinham duas frentes de trabalho com objetivo de explorar depósitos de amianto, cuja retirada era a céu aberto, desmontado da rocha pela explosão de dinamite e transferido por caminhões até o engenho beneficiador.
Só que os militares ignoravam as consequências daquela “poeira milagrosa”. O primeiro caso de câncer associado à exploração do amianto foi registrado em 1953, mas desde os anos 30 havia estudos sobre o assunto. Enquanto isso, Alagoas, Piauí, Minas Gerais e São Paulo figuravam, em 1995, como produtores mas em pequena escala de amianto. O topo da lista era ocupado pela Bahia. Após a exaustão da mina baiana, foi a vez de Goiás assumir a liderança.
Neste mesmo ano, a Organização Mundial de Saúde (OMS) reconheceu o amianto como agente cancerígeno. No Brasil estima-se que mais de três mil pessoas morreram por doenças relacionadas e 76,4% causadas por mesotelioma maligno, tipo de câncer relacionado ao amianto, entre os anos de 1996 e 2017. Em 2012, a Lei 7.322, de Alagoas, proibiu o uso de amianto nas obras públicas; em 2017, o STF proibiu a extração, industrialização, comercialização e distribuição do produto.
O milagre virou a poeira da morte.
** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do EXTRA