colunista

Elias Fragoso

Economista, foi prof. da UFAL, Católica/BSB, Cesmac, Araguaia/GYN e Secret. de Finanças, Planej. Urbano/MCZ e Planej. do M. da. Agricultura/DF e, organizador do livro Rasgando a Cortina de Silêncios.

Conteúdo Opinativo

Elias Fragoso: Rasgando a cortina de silêncios e impunidades do Caso Braskem

31/12/2023 - 08:12

ACESSIBILIDADE

Itawi Albuquerque/Secom Maceió
Mina 18 da Braskem
Mina 18 da Braskem

Desde março de 2018, data em que se consolidou o megadesastre que a Braskem provocou em Maceió (não custa sempre lembrar: o maior do mundo em área urbana), que a empresa além de insistir em negar a sua autoria tenta de todas as formas minimizar as suas responsabilidades. E para isso, de maneira acintosa, o que se viu foi a cooptação de autoridades estratégicas para se assegurar da impunidade do seu crime. Todos em Maceió sabem disso, embora a força do poder fale mais alto e nada revelem. Crimes que agora começam a aflorar para o grande público.

Passados quase seis anos do mega acidente que ela provocou, a Braskem continua “nadar de braçada” em Alagoas. A ponto de certos estamentos da justiça que agora se arvoram de justiceiros de última hora (mais antes tarde que nunca) haver concedido a ela via acordo, a “outorga” para gerenciar a destruição que ela provocou na cidade (o mesmo que entregar ao macaco o bananeiral para ele tomar conta...) através de um acordo inconstitucional que se apropria de competências de órgãos de Estado em favor da empresa destruidora.

Isso, SEM LICITAÇÃO. Pelo acordo cabe à Braskem “planejar” ações reparadoras na área que ela destruiu (sic!) pagando uma fábula de recursos que se aproxima de meio bilhão de reais para consultorias amigas e suspeitas de favorecimento pela empresa realizarem trabalhos rasos já rejeitados até, pasmem! Pela cooptada prefeitura de Maceió! Como o foram também em audiências públicas pela população e técnicos locais (atenção MPE siga o dinheiro, aí tem!).

O que chama a atenção nesse caso é que nenhum órgão de representação de classe como a OAB, os conselhos de engenharia, arquitetura, química e a academia em Alagoas, mais ligados ao problema, não deram um pio. Como calados ou tergiversantes sempre estiveram o IMA, o IBAMA, a defesa civil do município e a mídia local com raras e honrosas exceções como o EXTRA e o site 082 que sempre abriram as portas para o contraditório.

Lembremos que durante esse longo tempo pós megadesastre, TODAS as iniciativas judiciais relevantes contra a empresa impetradas pela defensoria pública estadual ou pela representação dos afetados foram sumariamente rejeitadas no âmbito da justiça federal. Que agora se apressa em “justiçar” a empresa, por conta da visibilidade midiática nacional que a emersão de uma das minas desaparecidas (faltam 4) na Lagoa Mundaú trouxe para o caso. Antes assim, que a barreira de sempre às pretensões de quem foi violentado em seus direitos pela empresa. Que sigam por esta rota. E como sugestão, revejam o absurdo e inconstitucional acordo feito com a Braskem, antes que tenham o desprazer de ver outras instâncias superiores - que já começam a se movimentar nesse sentido – fazer isso.

E a prefeitura nesse imbróglio? O leniente prefeito JHC, agora arvorado de defensor (sic!) da cidade muda radicalmente da sua posição de vassalagem à empresa e “joga pedra na Geni” da hora, a Braskem, como se as pessoas fossem idiotas, paspalhos, meros figurantes para um script degenerado que o levou a entregar Maceió à Braskem pelas 30 moedas modernas do Judas (1,7 bilhão de reais – menos de ¼ do valor do passivo da empresa para com a cidade - dos quais a Braskem de antemão se apropriou de 700 milhões de reais sem que ele desse um pio, sob o argumento que foram recursos que ela já havia gasto em Maceió.

Como se a cidade fosse obrigada a pagá-la por destruí-la!. Alô ministério público estadual: sigam a rota do dinheiro. Aí tem! No acordo-traição à Maceió e sua gente o prefeito quitou a dívida da Braskem com a capital. E fez mais: de forma surreal “doou” ruas, avenidas, praças e outros equipamentos públicos à empresa. E para que o “pacote” covarde da traição a Maceió ficasse completo, fez o município aderir ao – deixemos assim para não irmos mais longe - acordo chinfrim celebrado (no último dia do ano de 2020 e dado entrada nos últimos minutos daquele ano na justiça federal, e que nas primeiras horas do primeiro dia útil de 2021 foi sancionado via juiz de plantão). A corregedoria nacional dos MPF nunca se manifestou sobre nada disso, é preciso que se diga.

Acham pouco? Com a “merreca” restante que recebeu da Braskem, a prefeitura utilizou parte para comprar um hospital esvaziado por 266 milhões (para cotejar: o estado investiu 200 milhões na construção e equipamentos de 7 hospitais de grande porte inaugurados há pouco mais de um ano). Fui secretário de finanças dessa cidade e assevero que o município não tem a menor condição para tocar um hospital de grande porte. Vai ser mais um elefante branco.

O episódio atual da emersão de uma das minas (eram 35 das quais 5 ninguém sabe o que vai acontecer), a primeira a chegar à superfície foi a de número 18. Isso faz parte do contexto geral de incompetência técnica da empresa até para prever uma situação anômala desse quilate (ou será que sabia e guardou a informação até a undécima hora?), despreparo técnico e falta de fiscalização de suas atividades pelo órgãos responsáveis (mesmo após o megadesastre a Braskem continua a fazer as coisas do jeito e da forma que lhe aprouver) e a estranha anomia local, muita prevaricação e corrupção quase generalizada que prevalece.

A rigor, o eventual desastre que se anuncia para as próximas horas serviu para que a mídia nacional afinal parasse de minimizar o megadesastre de Maceió, muito mais grave que os de Minas Gerais (sem querer fazer comparações). E, por “quebrar” o monopólio de informações deturpadas e bem orquestradas com que a empresa manteve “abastecido” o mercado, seus acionistas, a mídia em geral, as autoridades e o povo de Alagoas e do Brasil.

Para quem não acompanha o assunto de perto basta ler as atuais comunicações da Braskem à mídia para entender o modelo anódino, insipido, de tom monocórdico, repetitivo, chato em geral para verbalizar informações inócuas e juridicamente neutras. Ler seus comunicados nos leva a parecer que estamos vivendo num mundo paralelo ao megadesastre que ela provocou, continua provocando em Maceió.

A insensibilidade da empresa e sua prepotência não tem limites. Enquanto Alagoas passa por mais situação limite provocada pela Braskem, em pleno dia 18.11 no auge da crise, a empresa realizou o “Braskem Day”, evento em que ela mostra os números e demonstrativos edulcorados para a mídia especializada e investidores. Um deboche para com Alagoas! Adivinhem o que aconteceu sobre mais um desastre iminente em Maceió?! Nem uma palavra. A empresa continua vendendo o seu peixe como se Alagoas não existisse. Mas deve cerca de 30 bilhões aos alagoanos. E tem que pagar o mais breve possível.

Aliás, talvez a maior parte das pessoas nem saibam, mas nesse exato instante enquanto uma parte de Maceió está apreensiva e a outra parte em polvorosa, a Braskem está participando da COP-28, a conferência mundial onde se discute as alterações climáticas que já ocorrem no mundo e se estabelecem metas para o controle do fenômeno. Certamente tem como objetivo vender a sua imagem de empresa ESG, aquelas que se preocupam com o meio ambiente (E) com as pessoas (S) e com a correta governança das suas operações (G). Até parece!

Resta saber agora como ficam Petrobrás e o fundo ADNOC que até este momento se fazem de sonsas em relação ao passivo de Alagoas. Acham que vão levar a Braskem na “maciota” e “depois”, sabe-se lá quando, se ajusta uma esmola para Alagoas por conta da destruição de parte significativa de sua capital pela empresa que elas querem ser as donas. O governo federal tem a obrigação de intervir nessa tentativa de lesa-estado que essas duas empresas ao que tudo indica estão se preparando para aplicar contra Alagoas. Já não chegam os prejuízos, as dores e o sofrimento de tantos, renovadas sistemática e recorrentemente por novos fatos que somente aprofundam a crise?

Chega!

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do EXTRA


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