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Odilon Rios

Jornalista, editor do portal Repórter Nordeste e escritor. Autor de 4 livros, mais recente é Bode Pendurado no Sino & Outras Crônicas (2023)

Conteúdo Opinativo

SNI investigou ‘subversivos’ até a era Collor

22/03/2025 - 06:00
Atualização: 21/03/2025 - 19:45
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Mesmo com a redemocratização, o Serviço Nacional de Informações (SNI) monitorou até o início do Governo Fernando Collor, em 1990, as atividades de alagoanos tratados na ditadura como subversivos ou comunistas infiltrados e seguia os passos da maioria deles. É o que mostram documentos com carimbos de confidencial e tornados públicos pelo governo federal.

Um dos nomes que mais aparece é o do engenheiro Ronaldo Lessa, hoje vice-governador. Mas, não é o único. O jornalista Ênio Lins, por exemplo, despertou a atenção dos militares em 1979. Era tratado como um dos líderes de movimento grevista na Universidade Federal de Alagoas (Ufal). “Após a leitura do documento, o presidente do DCE/UFAL, ENIO LINS declarou que a Reitoria tem o prazo até o final deste semestre para cumprir todas as reivindicações, caso contrário, nova greve será decretada”, destaca o relatório do SNI de 30/3/1979, circulado na caneta.

Em 26/5/1989, Ênio Lins, novamente, estava registrado nos arquivos do SNI, na relação de candidatos a vereador eleitos pelo PC do B. Era o relatório trimestral das atividades do partido, assinado pelo chefe do Centro de Inteligência do Exército, o general Sérgio Augusto de Avellar Coutinho, um dos pensadores do Exército brasileiro e, até a morte em 2011, estudioso do comunista Gramsci e sua influência nas revoluções do Ocidente.

Um dos documentos mais antigos do SNI a respeito de Ronaldo Lessa é de 23/5/1969. O então estudante de engenharia tem anotadas a filiação, o endereço, naturalidade em uma ficha encabeçada com o título “atividades subversivas”: “Outrossim, informa que o referido cidadão foi posto em liberdade por ordem da Auditoria da 7ª RM, no começo do corrente mês”.

Em 23/7/1990, os passos de Lessa continuam sendo monitorados. Repare que Fernando Collor havia assumido a Presidência da República meses antes (15/3), portanto em plena era da redemocratização.

Em 24/7, anota o SNI, cerca de 150 manifestantes vindos das fazendas Lameirão e Pedrão, de Delmiro Gouveia, estavam ocupando o Incra quando “invadiram o supermercado Pague Menos, onde saquearam diversas mercadorias, principalmente alimentos e bebidas”. Também levaram dinheiro e armas. Lessa e Ênio Lins são listados como duas das lideranças do movimento. E também o hoje deputado federal Paulão, Pedro Verdino de Lima, Antonio Cerveiro de Moura, José Evaldo Lino Moreira, Genivaldo Vieira da Silva (na época líder do MST, anota o SNI) e José Nivaldo Cardoso Mota.

Os relatórios do SNI sempre são detalhados. Trazem informações estratégicas, familiares, residência, nome do pai e da mãe e a posição de cada um na política, como destacamos entre parênteses no parágrafo anterior.

É assim em 10/9/1982, quando o informe 126/82/10 da Divisão de Segurança e Informações (DSI), do Ministério da Educação – documento que está nos arquivos do SNI – traz como assunto o II Encontro das Classes Trabalhadoras de Alagoas, o Enclat. “Todos os oradores abordaram temas dentro de uma mesma tônica: ‘OPRESSÃO CONTRA TRABALHADORES’ - tecendo críticas ao governo Federal”, registra, em destaque, o DSI.

“O Jornalista FREITAS NETO [outro nome bastante monitorado pelo SNI], apresentou a proposta de aclamação do nome de TOBIAS GRANJA; advogado e jornalista recentemente assassinado, como patrono do encontro, que foi aprovada. No dia 28, além dos trabalhos desenvolvidos em diversas comissões sobre temas como: Reforma Agrária, Saúde, Educação, Salário, Movimento Sindical, Pacote e a Previdência, Dívida Externa, Transporte e Depredação Ambiental, foram exaustivamente debatidos”, escreve o relatório sobre o encontro realizado entre 27 a 29 de agosto, no auditório da Ufal.

Para quem acredita que o SNI, de braços com a ditadura, deixou de atuar após 1985, os documentos, agora públicos, do governo federal, atestam o contrário.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do EXTRA


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