MARECHAL DEODORO
Moradores reivindicam criação de Unidade de Conservação na Praia do Francês
Residentes e visitantes enfrentam especulação imobiliária e degradação ambientalFamosa por sua beleza natural, a Praia do Francês, em Marechal Deodoro, Região Metropolitana de Maceió, está cada vez mais ameaçada pela especulação imobiliária. Moradores e visitantes da região se uniram em um movimento pela preservação da restinga, um ecossistema vital para a região, que corre o risco de ser destruído pelo avanço de construções civis.
Para ajudar a natureza local, os mobilizadores cobram a criação de uma Unidade de Conservação da Natureza (UCN) na Praia do Francês. A UCN é uma área protegida, estabelecida com o objetivo de preservar ecossistemas, biodiversidade e promover o uso sustentável dos recursos naturais.
Em entrevista ao EXTRA, Antônio Rocha, um dos responsáveis pela Reserva Nacional de Surf localizada na Praia do Francês, há cerca de 30 anos, há movimentos de preservação da natureza na região. A preocupação se intensificou nos últimos anos com o aumento de visitantes e, principalmente, com especulação imobiliária e a construção de estradas junto ao mar. “A população abraçou o movimento de lutar contra essa especulação imobiliária”, conta Antônio.
Na semana passada, placas indicando propriedade privada foram instaladas em área de restinga na Praia do Francês. Segundo Antônio, a sinalização foi colocada pelos responsáveis por um empreendimento. A ação aconteceu um dia antes de uma mobilização ambiental que envolveu várias instituições ambientalistas, movimentos da sociedade civil organizada e moradores da região.
“As placas informavam que aquela era uma área particular, impedindo as pessoas de frequentarem as áreas verdes. Nós temos entre oito e 10 trilhas. Em todas essas trilhas, foram instaladas as placas. Eles pretendem cercar uma região para a instalação de um grande condomínio. Segundo especialistas, o projeto de construção tem uma série de problemáticas, já que é uma área de proteção permanente”, afirma Antônio.
“A população utiliza essas trilhas para chegar à praia. Se impedir o acesso, não só a comunidade como muita gente que frequenta a região vai ter dificuldade para chegar à praia”, explica.
O EXTRA questionou ao Instituto do Meio Ambiente (IMA) e sobre a instalação das placas e sobre a possibilidade de criação de uma Unidade de Conservação da Natureza na região da Praia do Francês, mas não obteve resposta.
Situação na Praia do Francês e a PEC das Praias
A instalação de placas de propriedade privada em áreas de restinga na Praia do Francês está relacionada com a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) das Praias. O projeto de proposto pela PEC permite que os municípios determinem o acesso às praias, o que levanta uma preocupação sobre a liberdade de acesso às praias, já que, com a privatização de terrenos, pode-se restringir o acesso a locais públicos, como praias e restingas, para quem não tem autorização de acesso.
A PEC das Praias busca resolver um vazio jurídico sobre a propriedade dos terrenos de marinha, mas essa solução pode acabar facilitando a especulação imobiliária, que já é um problema na região, com projetos de empreendimentos que ameaçam a natureza local. De maneira semelhante, a instalação de placas de propriedade privada na Praia do Francês revela a falta de clareza sobre o uso das terras públicas e como isso pode ser explorado comercialmente.
As táticas de apropriação privada de áreas públicas, seja pela instalação de placas ou pela venda de terrenos de marinha, podem prejudicar os direitos da população, já que há uma tendência de priorizar interesses privados em detrimento da coletividade. “A PEC vem com a possibilidade de edificação de toda a faixa litorânea, o que impede a preservação e a conservação de áreas protegidas como a restinga”, afirma Antônio.
Antônio explica que a Reserva de Surf na região é um exemplo de como os moradores e visitantes tentam conciliar turismo sustentável e preservação ambiental. A PEC das Praias poderia alterar esse equilíbrio, ao permitir a venda de áreas que atualmente são usadas coletivamente, afetando diretamente a preservação de espaços como esse.
“O turismo [na região] é muito eficiente na parte esportiva, principalmente na temporada de onda, quando a Praia do Francês é frequentada por surfistas de todo o Brasil e do mundo. Isso movimenta o comércio e o turismo em uma época após o verão. A gente quer fomentar cada vez mais a comunidade de surf, a cultura pesqueira e preservar todos os ecossistemas que temos: o brejo, a restinga, o coqueiral, a barreira de corais”.
Andamento da PEC das Praias
Após um pedido de vista — mais tempo para análise — na quarta-feira, 4, a análise da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) das Praias foi paralisada na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado. A PEC estabelece mecanismos para a venda de áreas à beira-mar de marinha, que pertencem à União. A PEC das Praias prevê a autorização para a venda dos terrenos de marinha para empresas ou pessoas que já estejam ocupando essas áreas.
Na prática, esse projeto abre uma brecha para privatizar o acesso à praia, e não a praia em si, já que a área frequentada pelos banhistas, turistas e demais pessoas continuaria sendo do governo. Para o relator do caso na CCJ, senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), os terrenos de marinha são fonte de insegurança jurídica quanto à propriedade de edificações, especialmente porque muitos terrenos foram adquiridos por pessoas que não sabiam que os imóveis pertenciam à União, que cobra taxas sobre os locais
O senador Rogério Carvalho diz que o texto é piorado pelo dispositivo citado pelo relator em relação ao acesso às praias. Na opinião de Carvalho, isso deixaria sob responsabilidade dos municípios a elaboração dos planos diretores, que dariam o acesso ou não à praia.
O tempo para devolução do pedido de vista é de cinco dias corridos. Entretanto, o projeto não retornará automaticamente à pauta de votação da CCJ. A decisão fica a cargo do presidente da comissão, senador Davi Alcolumbre (União-AP). Ainda não há uma nova data definida. A PEC irá para o plenário do Senado apenas se for aprovada pela CCJ.