A falta de transparência no uso de emendas parlamentares encobrem situações grotescas e intrigantes no parlamento. No dia 19 de dezembro do ano passado, deputados e senadores da bancada do Distrito Federal (DF) destinaram duas emendas, que somam R$ 26,6 milhões, para uma ONG com sede no centro de Maceió, em Alagoas. A ONG contemplada com a verba é o Instituto Econacional de Desenvolvimento e funciona num órgãos da Prefeitura de Maceió.

Segundo o jornalista Paulo Cappelli do Metrópoles, a fachada do edifício tem a logomarca do Centro de Atendimento e Cuidados ao Servidor Público de Maceió (CACs). A inauguração do espaço, em setembro de 2023, contou com a presença do prefeito João Henrique Caldas (PL), o JHC. 

“Estou aqui no novo centro de atenção e cuidado do servidor. Um equipamento público de qualidade”, anunciou o prefeito na ocasião. Os serviços oferecidos no local são pilates, fisioterapia motora, psicologia, serviço social, nutrição, educação física e reeducação financeira.

Apesar de ser agraciada com o volume de recursos de R$ 26,6 milhões liberados por parlamentares do Distrito Federal, funcionários da ONG não sabem dizer se ela desenvolve projetos na unidade federativa.

Segundo Paulo Cappelli, no endereço da ONG visitado por equipe do Metrópoles nesta quinta-feira, 23, um dos funcionários do programa da prefeitura e que também é diretor-administrativo da Econacional, Éverson Pontes, disse que a ONG foi contratada pelo Município para gerir o Centro de Atendimento e Cuidados (CACs) ao Servidor Público de Maceió, mas não soube detalhar o projeto que a ONG vai realizar no Distrito Federal, que justificaria o repasse de volume milionário de recursos dos parlamentares.

Também não soube informar se a ONG, da qual faz parte como diretor-administrativo, tem funcionários e espaço físico em Brasília. A Econacional recebeu os recursos para viabilizar ações de “empoderamento da mulher no mercado de trabalho e no mundo do empreendedorismo”. O presidente da instituição Ramalho Souza Alves, não deu retorno ao ser procurado para esclarecer o projeto no DF.

Em um relatório publicado em janeiro deste ano, a Controladoria-Geral da União destacou que o site da Econacional “não possui informações a respeito da transparência da execução de recursos públicos recebidos”. Nas redes sociais da ONG, a postagem mais antiga é de agosto de 2023 e faz referência ao CACs de Maceió, assim como todas as publicações da página. Tanto no site oficial da ONG quanto nas redes sociais não há menção a nenhum outro projeto, muito menos em Brasília, além do desenvolvido na capital alagoana.

“Histórico de serviços”

O jornalista do Metrópoles contactou o deputado federal Rafael Prudente (MDB), líder da bancada do Distrito Federal e ele afirmou que a escolha da ONG para receber as emendas ocorreu “visto seu histórico de serviços prestados ao DF”. Porém, questionado sobre quais seriam esses serviços, o parlamentar não respondeu.

O objetivo do empenho de R$ 15 milhões é “capacitar mulheres do Distrito Federal com vistas a implementar e desenvolver o empreendedorismo”. Já o empenho de R$ 11,6 milhões tem como “implementar capacitações que fomentam a autonomia econômica da Mulheres no Distrito Federal”.

Por WhatsApp, o parlamentar detalhou: “A primeira proposta visa a promoção e desenvolvimento e empoderamento da mulher no mercado de trabalho oferecendo capacitações, com o objetivo de atender 6.000 mulheres com idade a partir de 18 anos, em Brasília/Distrito Federal. O programa busca aumentar o acesso ao mercado de trabalho e a ampliação da autonomia econômica das mulheres, o projeto vem de encontro com esses objetivos ao tempo que busca por meio da capacitação ampliar as oportunidades para as mulheres no mundo do trabalho.”

“Já a segunda proposta visa a promoção e desenvolvimento e empoderamento da mulher no mundo do empreendedorismo, prioritariamente as mulheres que já possuem o próprio negócio. 12.000 mulheres com idade a partir de 18 anos, em Brasília/Distrito Federal. O Projeto pretende diminuir a quantidade de empreendimentos fechados por falência por meio da capacitação, aumentar a empregabilidade e a renda das mulheres. Inclusão digital de 12.000 mulheres em 20 Regiões Administrativas do DF. Contribuir para redução da desigualdade social e digital. Criação de novos negócios e aumento da empregabilidade nas regiões atendidas. Fortalecimento da economia criativa local. Promoção da autonomia econômica.”

Outro lado

Em nota, a Secretaria Municipal de Gestão (Semge) informou que o endereço onde funciona o Centro de Acolhimento e Cuidados ao Servidor (CAC) não pertence à Prefeitura, e que toda administração do espaço é de completa responsabilidade do Instituto Econacional.

"O Instituto Econacional foi contratado em agosto de 2023 pela Prefeitura para promover assistência gratuita, reabilitação e segurança laboral aos servidores ativos e aposentados de Maceió e, desde então, realizou mais de 30 mil atendimentos. Dentre os serviços disponíveis estão: saúde preventiva, cuidados físicos e mentais, incluindo pilates, fisioterapia, fonoaudiologia, nutrição, psiquiatria e psicologia, além de contar com serviço social, educadores físicos e financeiros", informou.