colunista

Elias Fragoso

Economista, foi prof. da UFAL, Católica/BSB, Cesmac, Araguaia/GYN e Secret. de Finanças, Planej. Urbano/MCZ e Planej. do M. da. Agricultura/DF e, organizador do livro Rasgando a Cortina de Silêncios.

Conteúdo Opinativo

O recado da pesquisa do Data Senado

19/05/2024 - 08:21
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Existe uma frase popularesca que afirma “de onde nada se espera, é daí que não sai nada mesmo”. A CPI – literalmente cooptada – da Braskem mais um “me engana que eu gosto” aplicado nos alagoanos e em Alagoas está nessa categoria. Terminou por surpreender. Não pelas sugestões do relator, mas pelo relatório técnico bem produzido pelos consultores do Senado Federal e pela pesquisa de opinião realizada pelo DataSenado em Alagoas.
As “conclusões” do relator já eram esperadas, seriam um arrumadinho de obviedades – todas já tentadas e bloqueadas por maus alagoanos que estranhamente defendem os indefensáveis interesses da Braskem em detrimento dos de Alagoas, dos 3, 1 milhões de alagoanos, do quase 1 milhão de maceioenses e dos 140 mil afetados (segundo levantamento em poder do Governo de Alagoas e não 55 mil como cavilosamente a Braskem espalha aos quatro ventos).

O relator também se arvorou de sugerir mudanças nos órgãos de fiscalização federal, estaduais e municipais. Um amontoado de obviedades sonháticas que nunca passarão pelo Congresso graças ao poderoso lobby das mineradoras. E uma redundância do muito que já se tentou – e não se conseguiu - naquela casa de fazer leis.
Ao longo das próximas semanas vamos dissecar o tal “relatório” com o olhar crítico com que buscamos nos posicionar em relação ao Caso Braskem. Para hoje vamos dissecar a pesquisa que o DataSenado realizou em Alagoas recentemente para aferir a opinião dos alagoanos em relação ao Caso Braskem.

E, alvíssaras! Passou incólume da vigilância dos amigos da Braskem na CPI e foi inserido no relatório final daquela comissão.

Os resultados são chocantes: na visão de 84% dos entrevistados, houve pouca ou nenhuma participação da população diretamente afetada nos acordos realizados com a Braskem por intermédio dos poderes públicos (leia-se MPF em Alagoas, Justiça Federal em Alagoas, MPE-AL, Defensoria Pública da União e Defensoria Pública de Alagoas). Foi uma enorme luz vermelha e uma estridente sirene de alerta dos alagoanos entrevistados contra o que vem ocorrendo nessa seara.

E para que não fique dúvida quanto a isso, 82% dos entrevistados declararam-se insatisfeitos ou muito insatisfeitos com a resposta dos poderes públicos ao desastre. Notem: oito em cada dez entrevistas condenam a atuação dessa gente e a anomia dos demais poderes em defesa dos interesses do Estado de Alagoas e dos afetados.

Arrasadores 90% dos entrevistados apontam que algumas áreas afetadas pela catástrofe não foram contempladas no Programa de Compensação Financeira da Braskem! Alguma dúvida sobre quem está com a razão e quem são os responsáveis por não viabilizarem o que é basicamente uma unanimidade na população? Um número quase igual (86%) qualifica como injusto o fato de a Braskem tornar-se proprietária ou possuidora de toda a área pública ou privada da região que ela própria destruiu...

E a turma da defesa da empresa ainda sai com a lorota que “se daqui a muitos anos, a área vier a se estabilizar, será o plano diretor de Maceió quem irá definir se a Braskem pode ou não usar a área”. Muita sacanagem achar que os outros são otários a esse ponto!!!

Quanto aos valores recebidos pela venda irregular (e não a compensação pelos prejuízos ) dos seus imóveis, 85% dos afetados consideram injusto o valor das importâncias recebidas a título de indenização. Muito próximo à unanimidade!!! Mas a empresa continua “candidamente” veiculando na mídia que já resolveu 99,9% dos casos! Uma piada pronta e de péssimo gosto. Até porque o total de indenizados a que ela se refere (55 mil pessoas) representa tão somente 39% do total de afetados (140 mil pessoas). Além disso, ainda há o passivo que a Braskem tem com oito prefeituras da região metropolitana e com o governo de Alagoas.

Nessa trilha, 70% dos entrevistados declararam que o valor indenizatório recebido não permitiu a compra de imóvel equivalente ao que eles possuíam anteriormente. Isso para não falar das ameaças e pressões que sofreram para transferir seus bens à toque de caixa para a Braskem.

Os moradores que resistiram durante quase seis anos foram expulsos recentemente – numa ação coordenada Braskem/Defesa Civil Municipal de suas benfeitorias – sob o argumento covarde e mentiroso – de que a mina 18 era uma ameaça a eles, mesmo ela estando até 2 km de distância dos imóveis que foram, afinal, tomados pela Braskem.

E isso tudo com o beneplácito das autoridades que trouxeram o caso Braskem para si!

Já no quesito mobilidade urbana, os afetados pesquisados informaram (77%) ter havido aumento no tempo do seu deslocamento no trânsito, 76% declararam aumento da distância da nova moradia para o centro da cidade e 24% deles relataram a necessidade de se deslocarem até mesmo de outro município (onde foram residir após serem expulsos de suas casas) para Maceió. E, 57% dos empreendedores afirmaram peremptoriamente que os seus negócios pioraram após a catástrofe.

Agora vejam: temos ai uma pesquisa oficial realizada pelo DataSenado indicando que a quase totalidade dos entrevistados condenam, repudiam, reagem contrariamente aos rumos que o Caso Braskem tem tomado em Alagoas.

A pesquisa de um lado aponta do ponto de vista da população afetada onde estão os pontos de estrangulamento e deixa claro – sem dizer – quais são os órgãos e, portanto, as pessoas responsáveis diretamente por impedir que medidas justas e legais contrárias aos interesses da Braskem prosperem. E de outro deve servir de alerta a políticos e demais autoridades de todos os naipes e partidos que há seis anos fazem cara de paisagem como se nada tivessem a ver com o caso.

Todos estão em falta com Alagoas, com os alagoanos e com os quase 400 mil afetados (140 mil apenas em Maceió e outras 260 mil pessoas nas oito cidades da região metropolitana impactadas pela migração forçada dos exilados da Braskem para suas urbes).

Nunca é demais lembrar que acordos políticos, conchavos de bastidores, compra de votos e outras ações ainda menos republicanas, só funcionam quando não batem de frente com um eleitor que se sente motivadamente prejudicado. É o caso... E essa turma como a pesquisa mostrou não está para brincadeira. É muito voto para se deixar de considerar um trabalho mais incisivo em prol dos afetados e de Alagoas.

Um parêntesis: tal qual uma agulha no palheiro, a Defensoria Pública Estadual na pessoa do Defensor Público Dr. Ricardo Melro não tem medido esforços para “furar” o muro de concreto erigido em Alagoas em defesa dos interesses da Braskem. E na seara política, o Senador Renan Calheiros cujas iniciativas nacionalizaram o Caso Braskem e levaram à criação da CPI que paus mandados da Braskem tomaram de assalto para impedir que ainda mais podres viessem a tona, é voz solitária num deserto de vontades de dar ao Caso Braskem a importância que Alagoas demanda.

Fica claro também que, em sua imensa maioria, profissionais qualificados do serviço público que trabalham de forma legal e se sentem tolhidos por conta das ações e/ou omissões daqueles poucos “colegas” que tem as responsabilidades sobre o caso e não cumprem com o seu dever, estão fora dessa análise.
Chega de passividade! Até quando esse despautério vai continuar?

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do EXTRA


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