colunista

Elias Fragoso

Economista, foi prof. da UFAL, Católica/BSB, Cesmac, Araguaia/GYN e Secret. de Finanças, Planej. Urbano/MCZ e Planej. do M. da. Agricultura/DF e, organizador do livro Rasgando a Cortina de Silêncios.

Conteúdo Opinativo

A Braskem e a terra de ninguém

12/10/2025 - 08:13
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Enquanto os bancos credores — os futuros proprietários da Braskem — negociam com o BNDES e a Petrobras a estrutura ideal para o negócio e a forma mais estratégica de lidar com a Novonor, a fim de evitar que o caso se arraste na Justiça (o que tornaria tudo ainda mais complexo e imprevisível), em Alagoas reina uma atmosfera de alienação institucional. Como se nada estivesse acontecendo, como se a manobra que se desenha nos bastidores não fosse uma ameaça concreta aos interesses locais, assistimos a um espetáculo de desinformação, passividade e, sobretudo, negligência.

a) A romaria do milagre

Centenas de pessoas se aglomeram na porta da Braskem, como devotos à espera de um milagre — o milagre de que uma empresa prestes a entrar em recuperação judicial vá, por iniciativa própria, “resolver” o passivo alagoano. É uma cena que beira o absurdo. A expectativa de que a Braskem, sem qualquer obrigação legal adicional e com todos os incentivos para minimizar seus prejuízos, vá espontaneamente reparar os danos que causou, é não apenas ingênua — é perigosa. Alimenta uma falsa esperança e desmobiliza a sociedade civil, que deveria estar pressionando por soluções reais, não por gestos simbólicos.

b) O encerramento silencioso e ilegal

A empresa encerrou, sem alarde e sem qualquer comunicação oficial aos seus defensores na Justiça local — e menos ainda ao governo de Alagoas — as atividades da última casa de células, responsável pelo beneficiamento do sal-gema. Eram três. Agora, nenhuma. E o mais grave: sem licença ambiental, sem autorização legal, e com uma desfaçatez que desafia qualquer senso de responsabilidade, a Braskem pretende transformar o espaço em depósito de produtos químicos para abastecer suas indústrias em Marechal Deodoro.

É o retrato da impunidade. A empresa age como se estivesse acima da lei, como se Alagoas fosse uma terra sem dono, sem regras, sem fiscalização. E, infelizmente, tem sido tratada assim. Até quando as autoridades locais vão continuar ignorando essa afronta? Até quando vão fingir que não veem?

Já passou da hora de interditar o funcionamento desse mostrengo industrial que, além de atrasar o desenvolvimento urbano de Maceió, representa um risco ambiental e social permanente. Fora, Braskem!

c) O acordo que só beneficiou a Braskem

Nesta mesma semana, os maceioenses foram presenteados com mais um espetáculo de cinismo: uma tentativa de reembalar, com nova roupagem midiática, o acordo celebrado com a Braskem há cinco anos. Um acordo que seus signatários insistem em elogiar como se fosse benéfico aos 120 mil afetados. Mas a verdade é outra: O acordo foi moldado para atender aos interesses da empresa, não da população.

A tentativa de ressuscitar esse acordo pode ser uma estratégia para abafar o impacto da notícia do fechamento da casa de células. Ou, talvez, como em tantos outros episódios, os envolvidos sequer sabiam do ocorrido. A “protegida” parece ter deixado seus protetores na mão — mais uma vez. E a população, como sempre, paga a conta.

d) A entrevista que desinforma

Como se não bastasse, tivemos o desprazer de ler uma entrevista de um conhecido economista local, que afirmou absurdos como a suposta importância da Braskem para a economia alagoana. Será que ele ignora que a empresa representa menos de 0,5% da formação do PIB estadual? Disse ainda que a Braskem seria uma importante fonte de receita para o estado, quando na verdade ela representava menos de 3% da receita própria — isso quando pagava. Segundo fontes confiáveis, hoje acumula mais de 2 bilhões de reais em impostos atrasados.

Esse tipo de declaração não é apenas equivocada — é irresponsável. Em vez de esclarecer, confunde. Em vez de informar, desinforma. E contribui para a perpetuação de uma narrativa que favorece a empresa e enfraquece a luta por justiça e reparação.

Alagoas precisa parar de se comportar como avestruz. Enterrar a cabeça diante de um problema dessa magnitude é suicídio institucional. É hora de encarar a realidade de frente, exigir transparência, responsabilização e respeito. Antes que sejamos, mais uma vez, enganados — e que o futuro da nossa terra seja negociado à revelia de quem realmente vive aqui.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do EXTRA


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