Qual a primeira coisa que um médico deve saber?
Texto de Álvaro J. Madeiro Leite -Médico e Titular de Pediatria da UFCE.
Esta é uma das perguntas dirigidas aos milhares de jovens que, todos os anos, tentam ultrapassar os estudos pré-universitários em direção à medicina: qual é a primeira coisa que um médico deve saber? As possíveis respostas podem vir de muitos lugares, inclusive daqueles que, em algum momento de suas vidas, poderão precisar do auxílio desses médicos.
A oportunidade para responder a essa pergunta pode estar contida no livro O Menino do Dedo Verde, de Maurice Druon, um clássico da literatura para crianças e jovens em todo o mundo.
Era uma vez Tistu, um menino diferente, pequeno, de olhos azuis e cabelos loiros, portador de uma mensagem de esperança. As proezas de seu dedo verde eram originais e um segredo entre ele e o velho jardineiro Bigode: era capaz de tornar tudo o que tocava mais verde e alegre. Na jardinagem, “dedo verde” diz respeito àquelas pessoas com dom para cuidar das plantas. Tistu era um cuidador, com o excepcional poder de semear o bem por onde passava.
Em qualquer uma das inúmeras faculdades de medicina do país, alunos de graduação se sentem surpresos, espantados com o mundo gigantesco que escolheram palmilhar. Aos poucos, muitos deles são tragados por um senso de pertencimento que lhes confere o encantamento necessário e vital para enfrentar as contradições desse campo profissional tão exigente.
Na fábula, Tistu foi visitar o hospital de Mirapólvora e, lá, conheceu uma menina doente. Era um belo hospital, muito grande, muito limpo e provido de tudo que fosse preciso para cuidar de qualquer paciente. Tistu não achou que o hospital fosse feio; pelo contrário. No entanto, ele sentiu... como explicá-lo?... ele sentiu que alguma coisa muito triste ali estava escondida.
“Ser médico era travar uma batalha ininterrupta. De um lado, a doença, sempre a entrar no corpo das pessoas; do outro, a saúde, sempre querendo ir embora. E, depois, havia mil espécies de doença e uma única saúde. A doença usava todo tipo de máscara para que não a pudessem reconhecer: um verdadeiro carnaval. Era preciso desmascará-la, desanimá-la, pô-la para fora e, ao mesmo tempo, atrair a saúde, segurá-la, impedi-la de fugir.”
Tistu indagara: “Onde estará escondida a tristeza que estou sentindo?...”
Na visita, Dr. Milmales fez o menino entrar no quarto de uma menininha doente.
— Vou deixar você aqui, Tistu. Venha depois até meu escritório.
O Dr. Milmales esperava Tistu atrás de sua mesa, repleta de livros.
— Então, Tistu — perguntou ele —, que foi que você aprendeu? Que sabe de medicina?
— Aprendi — respondeu Tistu — que a medicina não pode quase nada contra um coração muito triste. Aprendi que, para a gente sarar, é preciso ter vontade de viver. Doutor, será que não existem pílulas de esperança?
O Dr. Milmales ficou espantado com tanta sabedoria num garoto tão pequeno.
— Você aprendeu sozinho a primeira coisa que um médico deve saber.
** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do EXTRA